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Notícias e Opinião do Concelho de Almeirim de Portugal e do Mundo
 

OBRIGADOS À DESIGUALDADE
Advogados, Solicitadores e Agentes de Execução Únicos Desprotegidos na Pandemia do Covid-19

27-03-2020 - Francisco Garcia dos Santos

Sim, é verdade!

De todos os trabalhadores Portugueses ou estrangeiros a trabalhar em Portugal, pensionistas e reformados, subsídio-dependentes crónicos, imigrantes e migrantes ilegais pseudo-refugiados sustentados pela Segurança Social, os únicos cidadãos nacionais absolutamente desprotegidos neste momento dramático que todos por igual vivem face à pandemia do Corona Virus/Covid-19, são os advogados, solicitadores e agentes de execução.

Efectivamente, esses profissionais, que por força de lei têm de estar inscritos na Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS) -único pseudo-sistema de segurança social privado ainda existente em Portugal-, e impedidos de se inscreverem no regime geral da Segurança Social, encontram-se abandonados à sua sorte por aquele organismo, pelo Governo e por quase todos os partidos políticos e deputada não inscrita com assento na Assembleia da República.

A CPAS, que enquanto único e obrigatório suposto sistema de segurança social daqueles profissionais trabalhadores independentes, mais não é, tal como sempre foi, um mero cofre de previdência para atribuição de reformas, de subsídios de casamento, de nascimento, de funeral e pouco mais, e istodesde que não sejam considerados “devedores”.

Então qual o conceito de “devedor” para a CPAS? É todo aquele que, independentemente do motivo, efectivamente deva qualquer quantia, bem como quem esteja a pagar simultaneamente contribuições presentes e atrasadas mediante planos e acordos de pagamento celebrados com a CPAS. Esta é uma das muitas aberrações deste suposto sistema de segurança social, pois se existem casos desprezíveis e marginais de não pagamento por mero capricho, na sua esmagadora maioria os devedores são profissionais que por doença, por diminuição de capacidade de trabalho ou até de falta dele, não têm qualquer possibilidade de pagar, mas também os que estão a cumprir escrupulosa e esforçadamente com tais acordos e planos, o que é um absurdo. É que perante o Fisco, a Segurança Social, a banca, etc., quem deve alguma quantia mas tem um acordo com o credor para pagamento da dívida em prestações e está a pagar pontual e regularmente as mesmas não é considerado jurídico-formalmente“devedor”.Ea quem for considerado “devedor” nos termos supra referidos, énegado o legítimo direito de participar, e muito mais o de votar, em reuniões da Assembleia Geral, sendo que o número de “devedores” é muito considerável, e até temido por uma oligarquia que deste há muito vem “des” governando a CPAS, pois se pudessem participar e votar, muito provavelmente essa gente já tinha “ido com dono”, ou até a CPAS extinta, e seus património e contribuintes integrados sem perda de direitos adquiridos na Segurança Social.

E não se pense que o valor mínimo obrigatório de contribuição mensal é pequeno!

Tal valor, indexado a dois salários mínimos nacionais ilíquidos, i. e., 1.270,00 € (quer o profissional receba ou não tal quantia), é em 2020 de 251,38 €. Mas vamos supor que o profissional recebe efectivamente 1.270,00 € ilíquidos: como ultrapassa o valor máximo de remuneração de quatorze salários mínimos nacionais, que é de 8.890,00 €, e por conseguinte isenta de tributação em sede de IRS, já que o valor de 1.270,00 € multiplicado por doze é de 15.240,00 € fica automaticamente sujeito à retenção na fonte de 25% de 1.270,00 € por conta do IRS, ou seja, 317,50 € (e se o cliente não estiver obrigado a tal retenção, o profissional terá de provisionar o mesmo para pagamento de tal imposto no ano civil e fiscal seguinte); ora, recebendo 1.270,00 € ilíquidos terá de subtrair a essa quantia 317,50 €, o que dá 952,50 €, sendo que deste valor tem de retirar o de 251,38 € para entregar à CPAS, o que significa que o profissional apenas fica com 701,12 €. Mas no caso dos advogados, os que tenham 6 ou mais anos de inscrição na respectiva Ordem (portanto desde início da carreira), para além de mensalmente terem de subtrair ao valor de 1.270,00 € os valores acima referidos relativos a IRS e à contribuição para a CPAS, ainda tem de subtrair 35,00 € de quota mensal para a Ordem dos Advogados (O. A.). Assim, no caso dos profissionais com 6 ou mais anos de inscrição naquela Ordem, dos 1.270,00 € apenas fica com um rendimento disponível de apenas 666,12 €. Deste modo, estando o salário mínimo sujeito ao desconto de 11% para a Segurança Social, tal significa que quem o aufere fica com um rendimento disponível de 565,15 €, apenas menos 101,00 € do que quem esteja inscrito na CPAS e ganhe em termos ilíquidos o dobro, 1.270,00 €!

Mas para melhor se perceber a iniquidade da tributação fiscal e para fiscal dos inscritos na CPAS, façamos a comparação entre um que ganhe ilíquidos 1.270,00 € e um trabalhador por conta de outrem que ganhe os mesmos 1.270,00 €, ambos sem dependentes. Contribuinte da CPAS, face aos descontos supra referidos, aufere um rendimento disponível de 666.12 €; trabalhador por conta de outrem está sujeito a retenção na fonte de 15,60€ em sede de IRS e 11% para a Segurança Social, o que somado dá 26,60% -deste modo, subtraindo a 1.270,00 o valor de € 337,82 € (26.60%) o trabalhador por conta de outrem fica com um rendimento disponível de 932,18 €. Para que não subsistam dúvidas, repito:

Advogado trabalhador independente inscrito na CPAS: 1.270,00 € líquido 662,12 €

Trabalhador dependente inscrito na Segurança Social: 1.270,00 € líquido 932,18 €

Trabalhador dependente fica com maisdo que o advogado : liquido 270,06 € +

Algum advogado, solicitador ou agente de execução, que para além de ter de prover às suas despesas correntes de habitação (e demais a ela inerentes, como água, electricidade, gás, eventuais prestações ao banco de crédito à habitação à compra de casa, ou então de renda da mesma), de alimentação, vestuário e calçado, ainda de eventual crédito automóvel, pois este é imprescindível para deslocações a vários serviços públicos e tribunais espalhados pelo País, combustível, portagens e seguros, internet, telecomunicações, equipamentos e consumíveis de escritório (mesmo que trabalhe a partir de casa, pois caso o não faça, no mínimo terá de compartilhar com colegas despesas duma sala de escritório), poderá trabalhar e sobreviver com 666,12 €?

Ainda é de notar que a maioria dos advogados, solicitadores e agentes de execução se concentrammaioritariamente nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. No caso dos advogados, mais de 1/3 (cerca de 13.000/14.000 num total nacional que já ultrapassa os 32.000) encontra-se na “grande Lisboa”, portanto, tendo de fazer face a um custo de vida mais elevado do que quem resida e trabalhem localidades pequenas, sobretudo no interior do País.

Perguntar-se-á: mas os advogados, solicitadores e agentes de execução só ganham 1.270,00 €, e passam recibos?

A tal pergunta poderá responder-se com outra: e vários profissionais que são trabalhadores por conta de outrem e fora das horas de trabalho fazem “ganchos” como canalizadores, electricistas, mecânicos, etc. só ganham o ordenado mínimo e estão colectados e emitem recibos desses trabalhos extras?

O exemplificado acima, não é pura ficção, antes, infelizmente corresponde à realidade de muitos dos profissionais inscritos na CPAS, e mesmo que ganhem o dobro, o que de longe não corresponde à maioria destes profissionais, o exemplo poderá ser sempre replicado aritmedicamente, pelo que a esmagadora maioria dos advogados não ganha, em média,2.540,00 € ilíquidos mensais, antes pelo contrário.

Devido ao aumento exponencial do número de advogados nos últimos dez ou quinze anos, devido à irresponsável proliferação de Faculdades de Direito públicas e privadas, cuja culpa é de vários governos PSD e PS (no início dos anos 80 do século passado apenas existiam duas Faculdades de Direito públicas, a de Lisboa e a de Coimbra, a de Direito da Universidade Católica de Lisboa (pública mas de Direito Internacional), e da extinta Universidade Livre, de Lisboa, mas também com uma Delegação no Porto; hoje só públicas, para além daquelas duas, existem as da Universidade Nova de Lisboa, da Universidade Porto, da Universidade do Minho (Braga), da Universidade da Beira Interior (Covilhã), Universidade Católica-Porto, depois as privadas da Universidade Lusíada, da Universidade Autónoma de Lisboa e da Universidade Lusófona, estas em Lisboa, Universidade Portucalense, Porto, e não vou mencionar mais),o surgimento de grandes sociedades de advogados, aliás muito bem apelidadas de “sociedades comerciais de venda de serviços jurídicos”, pelo M. D. Advogado Dr. Nuno Godinho de Matos, ex-Vice-Presidente do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, as quais, como que “buracos negros”, rarefizeram o mercado mediante “exércitos” de centenas de advogados que para elas trabalham por “tuta e meia”, e também fruto de diminuição de clientes particulares e de empresas devido à transferência de muitos actos jurídicos exclusivos dos advogados, como é o caso dos Balcões “disto e daquilo”, nomeadamente “Casa Pronta”, divórcios por mútuo consentimento nas Conservatórias do Registo Civil, “Empresa na Hora” nas Conservatórias do Registo Comercial, “Balcão Nacional do Arrendamento”, etc., e por fim o terminus das avenças de pequenas e médias empresas com vista à redução de custos, que passaram a contratar o advogado à “peça”, isto é, apenas ocasionalmente para um determinado processo,os advogados passaram há muito a ser excedentários (chegando a existirem 14 ou 15 advogados em concelhos do interior do País com populações de 14.000 ou 15.000 habitantes) e por efeito da concorrência entre si, os honorários também baixaram consideravelmente em termos nominais.

Assim, se os proventos de advogados e solicitadores desde há pelo menos quinze anos tinham vindo a decrescer, agora, com pandemia do Corona Virus/Covid-19, encerramento quase total dos tribunais por tempo indeterminado e já anunciada grave e duradoura crise económico-financeira mundial, a qual, devido à sua proverbial débil economia, o nosso País muito sofrerá, a perspectiva, principalmente para advogados e solicitadores, mas também (ainda que talvez menos) para agentes de execução, afigura-se catastrófica no presente e a longo prazo. É que, com famílias depauperadas e todo o dinheiro que possa haver alocado àreconstrução económica e a combater o desemprego de trabalhadores por conta de outrem, sobrarão muito poucas “migalhas” para gastar com serviços de advocacia.

Ora o Governo já aprovou, e se não está já a executar, medidas de apoio social e financeiro aos trabalhadores por conta de outrem inscritos na Caixa Geral de Aposentações (funcionários públicos) e no regime geral da Segurança Social, bem como a todos os trabalhadores independentes inscritos neste regime, para advogados, solicitadores e agentes de execução, sob o pretexto de terem a CPAS, não foram previstas quaisquer medidas, embora a as Ministras da Justiça e do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social bem saibam que a mesma nunca deu nem dá qualquer apoio de relevo devido a tal nunca ter estado previsto no seu Regulamento -e mesmo que estivesse não o poderia dar porque está praticamente falida, devido à sua forma de financiamentoser deficitária e a redução de valor de reformas (seria suposto que quem pagasse ao longo da vida sempre pelo mesmo escalão, a reforma fosse de valor correspondente ao mesmo, ou seja, por exemplo, contribuindo num escalão indexado a 5 ordenados mínimos nacionais recebesse esse valor, mas não, apenas recebe 3 ou 3,5 devido ao “factor de sustentação”) afastar dos escalões contributivos mais altos aqueles que têm dinheiro para neles estarem, pois preferem, e bem, pagar pelo mínimo possível e aplicar o remanescente em PPR, noutros produtos financeiros ou até mesmo em depósitos a prazo, os quais hoje rendem juros quase nulos, mas em breve começarão a, pelo menos, acompanhar a inflação, tendo assim a garantia de que se não ganharem dinheiro, também não o perdem, e quem já antes não tinha dinheiro para pagar o mínimo, não será hoje e no futuro que o terá, bem como quem ia conseguindo pagar, sem poder receber dinheiro dos clientes por os tribunais estarem fechados e as pendências aumentarem, e também porque quando reabrirem a clientela para novos processos será muito reduzida, deixarão também de poder pagar. Porém, a CPAS continua e continuará a cobrar as contribuições, e que não pagar sujeita-se a que a dívida seja cobrada mediante processo de execução fiscal, com penhoras de contas bancárias que ainda tenham alguns “trocos”, carros, casas, etc., ou seja, de forma autofágica, por inércia, inépcia, dependência ou subserviência pessoal face ao poder político por parte dos seus sucessivos dirigentes, “matar” a mesma com a “cura”.

Por fim, apenas mais duas considerações de carácter político.

A primeira é a de o Regulamento da CPAS ser aprovado ou revogado por simples portaria (a forma de lei mais baixa da hierarquia dos diplomas legais) conjunta dos titulares das “pastas” da Justiça e do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social; portanto, se houvesse vontade política das atuais Ministras, podiam perfeitamente suspender ou até revogar normas do mesmo iníquas e até inconstitucionais do mesmo, e introduzir outras, ou aprovar legislação avulsa extraordinária que estendessem aos contribuintes da CPAS e seu agregado familiar os mesmos apoios sociais e financeiros previstas para os trabalhadores independentes inscritos na Segurança Social, mas não obstante, pelo menos a Ministra da Justiça já ter sido alertada formalmente pelo Bastonário da Ordem dos Advogados sobre a incapacidade da CPAS dar qualquer apoio e sobre a premente necessidade de tais apoios sociais e financeiros ser estendidos aos advogados, solicitadores e agentes de execução, muitos deles até casados entre si, persiste em fazer “orelhas moucas”, talvez por ela própria não saber o que é viver com dificuldades,pois é Procuradora-Geral Ajunta junto do Supremo Tribunal de Justiça e casada com um juiz que, no mínimo será desembargador, muito provavelmente auferindo entre ambos, e em termos líquidos, 7.000,00 € ou 8.000,00 € -aliás os copiosos aumentos salariais e de subsídios recente concedidos pelo Governo a procuradores e juízes, foram-no quando a senhora já era Ministra; para além de, também ao tempo de o já ser, o juiz seu marido, para não fugir à regra socialista (aliás muito solidária para com os seus), ter sido nomeado politicamente para director ou presidente dum organismo público qualquer, certamente não menos bem pago do que na sua função jurisdicional.

A segunda consideração é sobre o facto de com honrosa excepção de primeiro o Chega, através do seu Presidente e deputado único André Ventura, secundado pelo grupo parlamentar do PAN de André Silva, terem sido os únicos partidos com assento parlamentar a solidarizarem-se com advogados, solicitadores e agentes de execução, apresentando na Mesa da Assembleia da República,antes do último plenário de debate quinzenal e interpelação ao Governo, Projectos de Resolução com vista a que aquele órgão de soberania recomende ao último a concessão de apoios sociais e financeiros aos contribuintes da CPAS. Facto que contrastou com o hipócrita silêncio de desprezo por parte do PCP do camarada Jerónimo, sua secção Os Verdes da também camarada Luísa Apolónia, e BE da “dondoca esquerdo-caviar” Catarina Martins, “donos” das causas sociais e da igualdade, “únicos e legítimos” arautose paladinos dos direitos dostrabalhadores.

Por tudo quanto acima se deixou escrito, a realidade de cerca de 42.000,00 ou 43.000 profissionais inscritos na CPAS e absolutamente desprotegidos por esta e pelo Governo,

Justifica bem o título de serem obrigados à desigualdade, contrariamente a um dos princípios e direitos fundamentais consignado no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa.

Francisco Garcia dos Santos

 

 

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