Edição online quinzenal
 
Quarta-feira 24 de Abril de 2024  
Notícias e Opinião do Concelho de Almeirim de Portugal e do Mundo
 

INTERNATO DE S. JOÃO
AS FÉRIAS BALNEARES DAS EDUCANDAS EM 1879

07-02-2020 - Pedro Pereira

(...) puro, suave e rico Tejo
com as côncavas barcas, que nadando
vão pondo em doce efeito o seu desejo:
umas com brando vento navegando
outras com leves remos brandamente
as cristalinas águas afastando (...)

Luís de Camões

Em 1862, nasceu em Lisboa o Asilo de S. João -mais tarde denominado Internato de S. João, mantido pela Associação Protectora do Asilo - sob os auspícios da Confederação Maçónica Portuguesa, cujo Grão-Mestre, José Estevão Coelho de Magalhães, havia tomado posse do cargo em 9 de abrildesse ano, vindo a falecer em 3 de novembro seguinte.

Saliente-se que José Estevão em conjunto com um grupo de maçons foram os promotores e fundadores do Asilo.

Esta instituição nasceu com o fim de receber crianças desvalidas do sexo feminino, tendo aberto as suas portas com 20 crianças que se encontravam internadas no Asilo dos Cardais de Jesus, na dependência das Irmãs de S. Vicente de Paulo (Irmãs da Caridade), as quais, após a sua expulsão, haviam deixado as crianças ao abandono. Assim, a 8 de junho de 1862, acolhia as primeiras crianças na sua primeira sede, situada na rua dos Navegantes, nº62 (Palácio de Sarmento), em Lisboa 1.

A estas meninas, todas elas órfãs, era-lhes proporcionada até à idade de 18 anos, alimentação, vestuário, ensino profissional e educação laica.

Ao longo da sua existência, esta instituição teve como presidentes da Assembleia Geral, homens como José Mendes Leal Júnior, José Elias Garcia, Conde de Paraty, Visconde de Ouguela, Jesuíno Ezequiel Martins, Bernardino Machado, Sebastião de Magalhães Lima, Norton de Matos, Luís Gonçalves Rebordão e outras personalidades ligadas ao Asilo, como Adelaide Cabete, Frederico Leão Cabreira, José de Castro, Ricardo Covões, José Dias Ferreira, Manuel Borges Grainha, João Evangelista Pinto de Magalhães, Alfredo Mântua, Rui Teles Palhinha, António Pinheiro, Barros Queiroz, Heliodoro Salgado e José Maria do Espírito Santo Silva, entre tantos mais.

Porém, desde que o asilo foi criado, uma das preocupações das várias direções que o geriram, foi o das férias balneares das educandas. O «ir a banhos» no verão.

As estâncias balneares que o Asilo procurava para as suas alunas e onde estas passavam férias, eram Pedrouços, Belém e na margem sul do Tejo, a Cova da Piedade e o Barreiro. Não só pela proximidade, mas também por serem estâncias balneares muito procuradas e concorridas na época, dada a qualidade das suas areias e as águas limpas, despoluídas.

O período escolhido para banhos começava em fins de agosto e estendia-se até outubro. É desta forma que em ata de reunião da direção do Asilo, datada de 23 de agosto de 1879, é referido que o tesoureiro Santos: (...)participou ter arrendado uma casa no Barreiro (onde com sua família vai tomar banhos), por 30$000 que julga boa pelas suas disposições e capacidade, como pela sua situação na terra e pelas facilidades que o senhorio presta para melhor acomodação e estada das creanças(...).

Pena é, que o secretário que redigiu a acta não nos dê mais informes, como a morada das instalações, por exemplo, que não conseguimos apurar.

Entretanto, naacta de 28 de Agosto, cerca de uma semana depois, refere-se que: (...)o thesoureiro Santos participou já ter feito a sua mudança para o Barreiro. Partia o asylo para ali, amanhã, 29, para o que tinha tomado as convenientes disposições, ficou o director Amorim de assistir à saída das creanças; foi chamada a regente e participou-se-lhe que enquanto o asylo permanecesse no Barreiro ficava o thesoureiro Santos representando a direcção e com todas as atribuições d’ella sobre a administração, fiscalização e direcção do asylo. Recomendando-lhe à mesma regente que se empenhasse em que às creanças aproveitando o mais possível da estada ali, nem por isso perdessem os hábitos da regularidade da vida interna do asylo, e que havendo algumas asyladas já bastante crescidas empregasse a sua vigilância para evitar qualquer acontecimento que pudesse resultar desconsideração ou descrédito para o asylo. Decidiu-se que enquanto o asylo estivesse no Barreiro, as reuniões tivessem lugar na rua Nova do Carmo na Casa do Oriente 2 e que se participasse aos inspectores a ida do asylo para o Barreiro (...).

O secretário refere ainda que o transporte de Lisboa para o Barreiro se faria no vapor Aurora.

De salientar, que a menção ao facto de «estar o Asilo no Barreiro», não tem significado institucional, dado que as suas instalações se situavam onde ainda hoje se encontram: na Travessa do Loureiro em Lisboa. Deve antes, entender-se como um estado de espírito, de corpo, de sentir a instituição no sentido em que a mesma só tinha razão de ser, com as crianças, finalidade a que foi destinada, pelo que, o Asilo estaria onde as mesmas estivessem.

Ouçamos, entretanto, o secretário quando nos diz a dada altura, na actade 6 de setembro:(...) o thesoureiro Santos participou terem as creanças chegado bem, estavam saudavelmente alojadas tendo já começado os banhos, não tendo havido novidade alguma (...).

Naacta de 28 de Setembro ficamos a saber que: (...) o presidente da direcção 3 informou ter ido no passado Domingo ao Barreiro em companhia da mulher, tendo encontrado as creanças em boa disposição (...).

Quanto ao tempo de duração destas férias: (…) No Barreiroestagiaram as asiladas na estação balnear do ano findo (1879), permaneceram durante dois meses (…) 4.

No ano seguinte, em 1880, na acta da sessão de direção de 4 de Setembro érelatado que: (...) o thesoureiro Santos informou não ter encontrado casas para banhos, nem no Barreiro, nem em Almada, nem em Belém, embora nesta ultima encontrasse de aluguer elevado e sem as devidas condições para o efeito (...). No entanto, a solução viria a ser encontrada segundo o que nos é dado ler na ata de 11 desse mês, em ficamos a saber que: (...) as creanças foram a banhos para Pedrouços (...).

A verdade, é que tal como outras praias das margens do Tejo, nessa época as praias do Barreiro eram escolhidas para férias estivais como locais de eleição.

As areias eram limpas e as águas recomendáveis para «banhos», situação que virá a alterar-se nos alvores do século XX, por via da progressiva instalação e desenvolvimento do complexo fabril da Companhia União Fabril (CUF), que paulatinamente transformou as praias do Barreiro num gigantescos parque industrial, que virá a constituir motivo de atracção de dezenas de milhar pessoas, de mão-de-obra e de suas famílias, provenientes de todo o país. Quanto às praias do Barreiro, as melhores foram ocupadas pelas fábricas e as que delas sobraram, até aos dias de hoje, são uma pálida imagem do passado, a aferir pelo que nos é relatado em escritos anteriores à industrialização. Quanto às suas águas, as do rio Tejo que banham o Barreiro, só após o desmantelamento do complexo fabril a partir dos anos 80 do século XX, é que tem vindo a ser progressivamente despoluídas.

1. A segunda sede desta instituição abriu portas em 1865, na Rua da Barroca, em

Lisboa e a terceira sede e atuais instalações, foram inauguradas em 1871, na

Travessa do Loureiro, nº10, em Lisboa.Estas só passaram a ser propriedade do

Asilo de S. João, em 1922, mediante aquisição no montante de 68.000$00.

2. Alusão à localização da sede do Grande Oriente Lusitano Unido.

3. Jaime Larcher.

4. In Relatório de Actividades do Asilo de S. João (1879-1880).

BIBLIOGRAFIA

. Azevedo, Manuel Roque de, História do Internato de S. João de Lisboa, (ex-Asilo

de S. João) 1862-1897,125 Anos de Solidariedade

Social, 5 de Outubro de 1992, Ed. Fotocopiada.

FONTES

. Livro de Actas da Direcção do Asilo de S. João

. Relatório de Actividades do Asilo de S. João (1879-1880)

. Relatório e Contas do Asilo de S. João

Pedro Pereira

 

 

 Voltar

Subscreva a nossa News Letter
CONTACTOS
COLABORADORES
 
Eduardo Milheiro
Coordenador
Marta Milheiro
   
© O Notícias de Almeirim : All rights reserved - Site optimizado para 1024x768 e Internet Explorer 5.0 ou superior e Google Chrome