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Doutor Afonso de Albuquerque
Pai do Stress de Guerra e da APOIAR

23-08-2019 - Mário Vitorino Gaspar

“Doutor Afonso de Albuquerque,

Doutor Afonso de Albuquerque, Presidente e fundador da Associação Portuguesa de Terapia do Comportamento e da Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica, Ex Director do Serviço de Psicoterapia Comportamental do Hospital Júlio de Matos, Presidente, Fundador, Presidente em vários mandatos Presidente da Mesa da Assembleia Geral da APOIAR – Associação de Apoio aos Ex-Combatentes Vítimas do Stress de Guerra, Sócio Honorário.

Entre outros cargos, é membro do “RoyalCollegeofPsychiatry” - (England), autor de variadas publicações e artigos na área do PTSD e da Sexologia, pesquisador do trauma dos Ex-Combatentes, nesse sentido o Serviço que presidia, colaborou com a ADFA – Associação dos Deficientes das Forças Armadas, no Palácio da Independência, no apoio aos Ex-Combatentes da Guerra Colonial, em Janeiro de 1987. Em Setembro de 1989 os Serviços saem da ADFA.

Como sócio-fundador-dirigente-doente e conhecedor de um pouco do trabalho desenvolvido pelo mesmo, habilito-me a prestar-lhe a minha homenagem. Após o registo da APOIAR, fiz de parte de diversas listas, o Doutor presidiu sempre a Mesa da Assembleia Geral, desde Dezembro de 1994 até Dezembro de 2004.

A APOIAR iniciou o percurso, sempre acompanhada pelo Doutor, investigador da doença, que apresentara o resultado de uma pesquisa científica, em conjunto com a Psicóloga Clínica Doutora Fani Lopes. Neste pode-se ler: – “… o conceito actual de Perturbação Pós Traumática do Stress (PTSD) – posttraumatic stress disorder, no DSM – III em 1980, também já incluído no ICD – 10, da Organização Mundial de Saúde, em 1992”. Diz ainda: – “Não havendo estudos epidemiológicos sobre a distribuição da desordem de stress pós traumático entre a população portuguesa, apontaram para a «existência em Portugal de 140.000 ex-combatentes vítimas de PTSD, por extrapolação das estatísticas americanas». (…) Este trabalho foi feito tendo por base números propostos por estudos epidemiológicos realizados junto da população americana. Tais estudos teriam sido promovidos pelos “ centres for diseasecontrol”.

A APOIAR dava os primeiros passos na Sede, num vão de escadas, gentilmente por ele cedido nos Serviços de Psicoterapia Comportamental, existido uma mesa, duas ou três cadeiras, um armário e uma máquina de escrever. O Dr. Afonso de Albuquerque permitia que a APOIAR se servisse do seu gabinete no 1.º andar para receber principalmente a comunicação social, ou qualquer individualidade.

Em Outubro de 1995, o Doutor foi o principal impulsionador do “1.º Encontro sobre o Stress Traumático” na Fundação Calouste Gulbenkian.

Em parceria com a Biblioteca Museu República e Resistência, a APOIAR, colaborou neste evento também com uma Exposição com o título «Guerra Colonial», e um Ciclo de Conferências: “Guerra Colonial. Um Diferente Olhar”, de 8 a 18 de Abril de 1996. Num painel intitulado “Mesa Redonda com Ex-Combatentes”, Dr. Afonso de Albuquerque dirigiu um longo debate.

No dia 4 de Abril de 96 a APOIAR foi convidada a participar num Colóquio, organizado pela ADFA, com o tema «A Realidade do DPTS – Suas Causas e Consequências». Presidiu ao debate o General Ramalho Eanes, e entre outros, o Dr. Afonso de Albuquerque referiu: “A guerra, principalmente a de guerrilha, é a situação mais traumática”. APOIAR denunciou, e inclusive no seu Jornal: –“(…) Nas situações de juntas para a reforma, ou de revisão de baixas começou-se a ouvir: “É a doença nova”; “É a doença do Dr. Afonso de Albuquerque” ou: “Desconhecemos essa nova doença”.

A APOIAR participou no Colóquio da ADFA no Porto, no dia 29 de Novembro de 96, com o tema “A Realidade do PTSD – Suas causas e Consequências”. Dr. Afonso de Albuquerque afirmou: “O PTSD é a única doença de Psiquiatria que pode surgir muito à posteriori”. Continuando: – “…uma das causas que provocam o PTSD é a exposição ao combate, e existe muito de comum entre a Guerra Colonial e a do Vietname, o serem ambas guerras de guerrilha, e as diferenças, favoráveis às das tropas americanas: melhor armamento, melhores serviços e campanhas inferiores a 12 meses, 3 deles fora das zonas de combate. Gozavam licença enquanto o soldado português não. Os americanos não possuem a tradição de confraternizar, ser a sua idade média inferior à do português, alguns casados, noivos ou com namoradas”.

No dia 28 de Fevereiro de 1998 a APOIAR organizou em Cuba, com a colaboração da Comissão de Ex-Combatentes e Residentes de Cuba um Colóquio, com uma Exposição Fotográfica com o tema «Guerra Colonial – Memória Silenciada». O Doutor Afonso de Albuquerque afirmou: – “… o trabalho de acompanhamento aos ex-combatentes é um trabalho pesado, o mais pesado da minha vida como médico”. “A juventude que era de alegria foi marcada pela tristeza”. (…) “… 30% de combatentes, incluindo oficiais e sargentos – principalmente os milicianos – devido à responsabilidade de comando, sofrem de PTSD. Metade, portanto 15%, estão em estado crónico”. “…Quer dizer, dos 140.000 – número calculado por extrapolação dos dados americanos – 50.000 podem estar incapacitados totalmente para o trabalho”. “… a doença é perversa, retardada e rebenta mais tarde”. “Existem doenças associadas ao PTSD: – o alcoolismo surge com frequência, sendo o suicídio maior nos ex-combatentes e menor a longevidade – morre-se mais cedo”. “… Interessa antes de tudo que o ex-combatente seja acompanhado por psicólogos e psiquiatras, e que o mesmo acompanhamento seja extensivo à família. Sucede existir pouca sensibilidade de certos médicos, que dizem ignorar a PTSD, embora esta seja aceite pela Organização Mundial de Saúde. É bom que a APOIAR e a ADFA colaborem ambas de molde a permitir que a doença seja reconhecida, a doença existe, foi causada pela guerra. Nos Estados Unidos motivado pela Guerra do Vietname, a partir de 1980 surgiram diversos movimentos: Médicos no Congresso e o Movimento dos Combatentes entre outros, conseguindo que fosse publicada legislação.

Em 14 de Julho de 1998 foi apresentado pelo Deputado Carlos Encarnação do PSD um Projecto para o reconhecimento em Portugal do Stress de Guerra e Criada uma Rede Nacional de Apoio às Vítimas de PTSD.

No dia 19 de Setembro de 1998 a APOIAR reuniu com o Dr. Álvaro de Carvalho, Director dos Serviços de Psiquiatria e Saúde Mental, que solicitou à APOIAR um parecer técnico para ser enviado por ele mesmo, como responsável máximo da Psiquiatria e Saúde Mental, a todos os Hospitais, Centros de Saúde Mental e Escolas de Enfermagem para que os técnicos conheçam mais pormenores sobre a doença. A APOIAR considerou ser o Doutor Afonso de Albuquerque a pessoa mais indicada para fazer o “parecer técnico”, parecer esse que deu origem à legislação, e o reconhecimento do trabalho da APOIAR. Esse parecer elaborado pelo Doutor Afonso de Albuquerque foi-lhe entregue posteriormente.

No dia 25 de Setembro de 1998 houve um ciclo com o tema “Amor em Tempo de Guerra”, conjuntamente com uma Exposição denominada “O Erotismo na Arte”. Doutor Afonso de Albuquerque, que cumpriu a Comissão em Moçambique, como médico, disse: “A sexualidade em tempo de guerra tem a ver com a experiência havida em tempo de paz”. “Chegados os soldados à zona de guerra as prostitutas surgiram logo, existindo uma mulher europeia, por cada dez europeus. O perigo das relações sexuais com as nativas eram as doenças venéreas. Não havia preservativo, mas bisnagas de sulfamida. Os soldados afirmavam que aquilo tirava a potência, sucedendo existirem experiências sexuais com animais?

A APOIAR convocou uma Conferência de Imprensa no dia 19 de Maio de 1999. Na Mesa: Doutor Afonso de Albuquerque; Mário Vitorino Gaspar, Presidente e Carmo Vicente, Vice-presidente da Direcção Nacional. Foi entregue à Comunicação Social um documento, que foi lido. Muitas questões levantadas pelos bastantes jornalistas. A SIC fez uma entrevista em directo para o Telejornal das 13H00, entre outras questões, e prometendo-nos que nos acompanhava ao Parlamento: – “Qual a posição que a APOIAR tomará caso seja chumbado o Projecto de Lei? Após consulta rápida decidiu a DN. Foi dito pelo Presidente Mário Vitorino Gaspar: - “… caso o projecto de lei chumbe não votaremos nas próximas eleições, que se aproximam, e iremos recomendar a mesma medida aos ex-combatentes e ao país”. Dr. Afonso de Albuquerque afirmou: – “… É extremamente importante a publicação e regulamentação da Lei e a formação de técnicos, temendo que a mesma seja feita de modo a não apoiar devidamente os ex combatentes e família”.

O Stress de Guerra já tem lei, aprovado o Projecto de Lei, por unanimidade na Assembleia da República e fez nascer a Lei de Apoio às Vítimas de Stress Pós Traumático de Guerra e passou a existir uma Rede Nacional de Apoio. A Lei foi promulgada em 27 de Maio. No dia 15 de Dezembro de 2000 a APOIAR organizou um Colóquio, com o tema “A Rede Nacional de Apoio aos Ex Combatentes Vítimas do Stress de Guerra no Secretariado Nacional de Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência. Além do Secretariado, presente o Presidente da ADFA, Patuleia Mendes, Mário Vitorino Gaspar, Presidente da APOIAR e Doutor Afonso de Albuquerque.

Patuleia Mendes (ADFA); Dra. Trindade Colarejo (SNRIPD)

Doutor Afonso de Albuquerque e Mário Vitorino Gaspar (APOIAR)

Este, após resumidamente focar a história da doença referiu: – “A terapia de grupo é o melhor dos tratamentos para a doença”, continuando: – “Quanto à criação de Centros da Rede Nacional de Apoio, têm de ser diferentes de um posto dos serviços de saúde, embora necessitando sempre uma ligação com o SNS”. Mário Vitorino Gaspar, afirmou: – “O apoio só deve ser prestado depois de um ambiente de confiança mútua”.

No dia 4 de Fevereiro de 2002 a APOIAR na pessoa do seu Presidente da Direcção Nacional, Mário Vitorino Gaspar, assinou o Protocolo, no Salão Nobre do Ministério da Defesa Nacional .

A APOIAR, a convite de Sua Excelência o Ministro da Saúde, participou em Lisboa num Workshop, com o tema “Perturbações de Pós Stress Traumático em Ex. Combatentes” no dia 4 de Novembro de 2002. Está agendado outro Workshop no dia 5 de Novembro de 2002 em Coimbra, em 12 de Novembro, no Porto. A APOIAR e a ADFA foram convidados para a Mesa nos três Workshops.

Na sessão de abertura não estiveram presentes os Ministros da Saúde, Estado e da Defesa Nacional, Segurança Social e do Trabalho e Suas Excelências o Secretário de Estado da Saúde, e o do Estado da Defesa Nacional e dos Antigos Combatentes, tal como estava agendado.

Referiu o Doutor Afonso de Albuquerque: – “… o conceito PTSD é recente, mas as reacções do ser humano são de sempre. Todos aprendemos a lidar com o perigo e já Shakespeare descreve na sua obra as reacções horrores agudas, mas foi principalmente a guerra que permitiu que estas reacções fossem estudadas. Na Guerra Civil Americana a expressão «IrritableHeartSyndrome». Foram estudados casos, após a II Guerra Mundial, sucedendo a Guerra da Coreia, só existindo 6% de evacuações de origem psiquiátrica. Os portugueses quando regressaram da guerra encontraram um clima anti guerra, tinham partido como heróis e regressado como assassinos. PTSD de Guerra está considerada como «uma doença ansiosa». Findou: - “… em 1992 entre 15 a 50% dos militares desenvolvem PTSD com origem na Guerra Colonial. No estudo da população em geral e em Portugal foram encontrados 7,8%”.

No dia 27 de Novembro de 2002 a APOIAR, esteve representada pelo Presidente e Vice-presidente, respectivamente Mário Vitorino Gaspar e António Pinheiro e Técnicos, a convite dos Laboratórios Pfizer, Lda., Doutor Afonso de Albuquerque e da Professora Doutora Catarina Soares, esteve presente na “Apresentação dos Resultados do 1º. Estudo de Prevalência de Perturbação do Stress Pós Traumático, em Portugal”, estando presentes igualmente outras Associações e Técnicos de Saúde.

Doutor Afonso de Albuquerque fez uma breve resenha histórica, e referindo o impacto na Psiquiatria das Guerras Mundiais e das Guerras da Coreia e do Vietname, e por tal a publicação em 1980 do DSM-II, em Portugal, o impacto da Guerra Colonial Portuguesa e posterior luta em defesa dos ex combatentes que deu origem à publicação da Lei nº. 46/99”. Frisou ainda: – “Neste trabalho, quanto aos acontecimentos traumáticos que causaram PTSD, o combate com 10,9%; abuso sexual antes dos 18 anos com 21,7%; violação com 23,1%; catástrofe natural com 1,4%; morte violenta de familiar ou amigo com 12,3%; testemunha de acidente grave ou morte com 3,8%; acidente grave de viação com 5,6%; incêndio com 0,5%; ameaça com arma com 5,5%; ataque físico com 9,3% e roubado ou assaltado com 2,4%”. “… PTSD na população exposta ao combate foi de 0,8% da amostra total é de 10,9%, relativamente aos indivíduos expostos. Considerando a totalidade de acontecimentos traumáticos que foram causa de PTSD, verifica-se que a situação que mais contribuiu para o total de casos foi «morte violenta de familiar ou amigo». “… No conjunto, os resultados deste estudo assemelham-se aos encontrados em estudos epidemiológicos realizados noutros países”. “… as limitações do estudo, em 1º. Lugar a existência de potencial «enviesamento» da amostra; entrevistas realizadas por pessoas sem formação clínica e necessidade de confirmação destes resultados com mais estudos (população geral e/ou populações específicas).

Em 14 de Dezembro de 2002, na 16ª Assembleia Geral da APOIAR, no Salão Nobre do Hospital Júlio de Matos, em Lisboa, por proposta da Direcção Nacional foi atribuída a qualidade de Socio Honorário ao Doutor Afonso Abrantes Cardoso de Albuquerque.

Atrevo-me a afirmar: Doutor Afonso de Albuquerque, Pai do Stress de Guerra e da APOIAR.

Texto escrito Por Mário Vitorino Gaspar

 

 

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