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Notícias e Opinião do Concelho de Almeirim de Portugal e do Mundo
 

CAPITÃO PÁRA-QUEDISTA GEP DR. LUÍS FERNANDES
in memoria

25-01-2019 - Francisco Garcia do Santos

As palavras que se seguem foram escritas sob grande emoção e comoção, já que tenho o orgulho e tive o privilégio de, ao longo de quase 40 anos, ter construído, consolidado e mantido uma enorme camaradagem e profunda amizade pessoal com o Luís Fernandes.

Aliás, devo ao Luís grande parte da minha formação filosófico-política, mediante livros que me ofereceu, outros cuja leitura me aconselhou (todos lidos “sofregamente”), inúmeras conversas sobre os valores do patriotismo e do nacionalismo, bem como formas de os pôr em prática em termos sócio-políticos, e ainda relativamente ao intrínseco e necessário inter-relacionamento entre “pensamento e acção”.

Por outro lado, o que não é (ou foi) de somenos importância, devo-lhe ter-me introduzido e integrado no restricto grupo/tertúlia de grandes intelectuais da “direita nacional” (ante e post 25/Abr/1974), do qual sobressaíram: o meu saudoso amigo, camarada e mestre de Filosofia do Direito e do Estado, Prof. Doutor António José de Brito (um dos mais insignes filósofos políticos portugueses do Séc. XX); o destemido jornalista Manuel Maria Múrias (pai), director do primeiro jornal assumida e manifestamente de direita post 25/Abr/1974, “A RUA”; o grande poeta Goulart Nogueira (sem menosprezo de outros).

Portanto, peço ao leitor releve eventuais excessos de adjectivação, bem como possíveis, mas involuntárias, imprecisões históricas, sendo que, caso ocorram, não serão susceptíveis de adulterar o texto e de distorcer a respectiva “mensagem”.

"Cap. Pq. GEP Luís Fernandes"

Corria o ano-lectivo de 1981-82 quando frequentava o 12º ano de escolaridade na Escola Secundária da Cidade Universitária, em Lisboa. Por ocasião de eleições para a respectiva associação de estudantes, durante a campanha eleitoral, uma lista nacionalista (a Lista N) concorrente às mesmas, convidou o Cap. Pq. Dr. Luís Fernandes para efectuar uma conferência, aliás muito concorrida, bem como de grande interesse, sobre o nacionalismo, à qual assisti. No final da mesma troquei algumas interessantes e simpáticas palavras com o orador, tendo-se logo revelado uma empatia espontânea e natural entre ambos -até porque o Luís Fernandes tinha uma personalidade carismática e cativante. A partir de então começámos a construir e consolidar uma amizade e camaradagem para a “Vida”, as quais só se suspenderam, i. e., ficaram entre “parêntesis”, com a sua “partida” da Terra para o Céu -amizade e camaradagem essas que peço ao Senhor, que quando decidir “chamar-me” à Sua presença, me permita reatar em espírito com o Luís.

O Capitão Pára-quedista miliciano (graduado) GEP (Grupos Especiais Pára-quedistas de Moçambique) Luís Fernandes, de seu nome completo Luís Manuel Farinha Fernandes Caraço, nasceu em Lisboa a 13/Jan/1947 e, por coincidência, faleceu na mesma cidade a 13/Jan/2019, precisamente no dia em que fez 72 anos.

O Luís foi membro “graduado” da Mocidade Portuguesa e “oficial” da Legião Portuguesa, ambas à data, e respectivamente, instituições que, embora integradas na estrutura administrativo-política do Estado Novo e estrutural/hierarquicamente “pseudo”-militarizadas, na prática eram “apolíticas”. A primeira era mais uma instituição promotora de actividades desportivas, de acampamentos e marchas ecológicas e histórico-culturai; a segunda desempenhava essencialmente as funções hoje atribuídas à Autoridade Nacional de Protecção Civil. Contudo, as mesmas transmitiam aos seus membros valores patrióticos, de solidariedade nacional e social, bem como de camaradagem pessoal, pelo que em ambas o Luís, em parte, formou a sua personalidade e, mediante aturado estudo, adoptou a ideologia política nacional-revolucionária, espírito de serviço à Pátria, à Nação e ao Povo Português. Mas não se julgue que tal formação resultou de “lavagem ao cérebro”, típica dos sistemas totalitários (mormente stalinistas) pois, embora talvez a maioria dos portugueses de hoje ignorem, essas organizações salazaristas eram, por própria vontade do Ditador, “despolitizadas”. Portanto, o Luís auto-doutrinou-se pela leitura de grandes autores estrangeiros e nacionais “reaccionários” e “nacional-revolucionários”, e convívio com grandes intelectuais e artistas da “direita nacional” -até mais à direita do que o próprio Salazar- como o movimento Integralista Lusitano, no qual pontificaram os monárquicos nacionalistas e tradicionalistas António Sardinha e Pequito Rebelo, entre outros.

Em Outubro de 1971, com 24 anos de idade, frequentando o 5º ano da licenciatura em Ciências Sociais e Política Ultramarina no ex-ISCSPU (Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina), hoje ISCS (Instituto Superior de Ciências Sociais), decidiu suspender os estudos e oferecer-se como voluntário para o serviço militar obrigatório, e mais do que provável mobilização para uma das 3 frentes de guerra então travadas nas ex-Províncias Ultramarinas de Angola, Guiné e Moçambique, o que ocorreu em Julho de 1972.

Se não se tivesse voluntariado para a “guerra”, mediante “adiamentos”, muito provavelmente, ainda que tendo de cumprir o serviço militar obrigatório, talvez nunca tivesse sido mobilizado para o Ultramar, pois quando chegasse a sua vez, por certo, já se estaria em vésperas do “25/Abr/1974”, ou até ocorrido o mesmo.

Assim, contrariamente a muitos (vivos ou mortos) hoje considerados “lídimos defensores da Democracia e da Liberdade”, e que cobardemente se furtaram ao serviço militar e eventual mobilização para uma das 3 frentes de guerra (Angola, Guiné e Moçambique) como refractários, desertores e traidores, e que post 25/Abr/1974, mercê de filiações partidárias ou oportunisticamente “encostados” ao “poder”, retiraram do Estado grandes proventos económico-financeiros, o Luís combateu de “armas na mão” pelos seus ideais de Pátria, de Nação e de Povo Português multi-cultural e multi-racial, nos quais convictamente acreditava -“Portugal do Minho a Timor”. Daí, não obstante ter sido um herói de guerra, foi traído pelos militares do MFA (Movimento das Forças Armadas) e votado ao ostracismo pelo próprio Estado democrático (?) português até à morte.

Uma vez incorporado nas fileiras do Exército em Outubro de 1971, fez o Curso de Oficiais Milicianos na então Escola Prática de Infantaria em Mafra; depois frequentou o Curso de Acção Psicológica na então Escola Prática de Administração Militar em Lisboa; em Abril de 1972 foi promovido a aspirante-a-oficial miliciano, tendo sido destacado para o Estado-Maior do Exército para frequentar o Curso de Especialidade em “acção psicológica”; em Julho desse mesmo ano, como acima se referiu, foi mobilizado para servir em Moçambique, tendo-se voluntariado para frequentar o Curso de Instrução de Grupos Especiais no Dondo (CIGE-Dondo), ingressando a seguir nos Grupos Especiais Pára-quedistas (GEPs).

Em Setembro de 1972 assumiu o comando do GEP Nº 5, e em Julho de 1973, já como capitão graduado, comandou o Destacamento dos GEPs em Mangui; em Agosto do mesmo ano foi para Guro, na qualidade de coordenador das actividades especiais dos GEPs.

O Luís, verdadeiro Soldado (com “S” grande), sempre preferiu o “mato” ao “ar condicionado”, a sua AK-47 Kalashnicov à “caneta”, o confronto directo com o inimigo às messes de oficiais (e suas “damas”) nas cidades onde não havia qualquer perigo, comandando no terreno diversas operações de assalto e de contra-guerrilha de forma vitoriosa.

Definindo-se a si próprio como “soldado político”, i. e., alguém que não combate contrariado ou a mando de terceiros, mas fazendo-o voluntariamente e imbuído de um ideal em que filosófico-politicamente acreditava, auto-confiante e pleno de entusiasmo guerreiro que “contagiava” os seu “homens”, o Luís tornou-se um verdadeiro “Cabo de Guerra”, querido pelos seus soldados e temido pelos seus inimigos.

Em Fevereiro de 1974 foi mandado regressar ao CIGE-Dondo, pelo seu novo oficial superior afecto ao MFA, e em Março regressar à Metrópole para gozar uma licença disciplinar.

Porém, na noite de 25/Abr/1974, regressou a Lourenço Marques, Moçambique. No entanto, na Metrópole, i. e., Lisboa, já tinha sido emitido um mandado de captura em seu nome por ter pertencido à Legião Portuguesa, pelo que cumpriu 5 dias de prisão disciplinar em Nampula por não ter aderido ao MFA. De seguida, em Julho de 1974, foi dada por finda a sua comissão de serviço no Ultramar, e regressou a Lisboa para, no seguinte mês de Setembro, ser “passado” à disponibilidade.

Nesse mesmo mês de Setembro, em vôo comercial da TAP, e fazendo escala em diversas cidades de países africanos, regressou a Moçambique com vista a, uma vez chegado a Lourenço Marques (Maputo), contactar vários camaradas dos Grupos Especiais e oficiais “Comandos” para organizarem e efectuarem um assalto à Prisão da Machava, onde se encontravam vários presos políticos portugueses, libertá-los, e, de seguida, fugirem todos para a República da África do Sul.

Contudo, tal não chegou a acontecer, pois traiçoeiramente, em 18/Out/1974 o Luís foi preso pela Polícia Militar portuguesa e posteriormente entregue aos ”turras” da FRELIMO, seus inimigos “figadais”, sendo ainda Moçambique parte do território português e administrado civil e militarmente pelo Governo de Portugal, chefiado pelo então Ten-Cor. Vasco Gonçalves e sua “guarda pretoriana” revolucionária do MFA, o COPCON (Comando Operacional do Continente) comandado pelo então Maj. Otelo Saraiva de Carvalho. Moçambique só se tornou um Estado independente em 25/Jun/1975.

Traído pelos seus supostos camaradas, liderados em Moçambique pelo então Cap. Camilo do MFA, o Luís foi entregue ao inimigo “turra” da FRELIMO. Passou por vários “campos de reeducação” (leia-se de “concentração”), tendo assistido a inúmeros fuzilamentos de militares autóctones portugueses que tinham servido sob o seu comando, e apenas foi poupado a ser “passado pelas armas” devido, segundo me disse, a não ter sido reconhecido pelos seus ignorantes carcereiros.

Após a independência de Moçambique, a mundialmente conceituada revista francesa “L´Express” publicou um artigo sobre os “capitães esquecidos de Moçambique”. Após o contra-golpe militar de 25/Nov/1975 o Ministério dos Negócios Estrangeiros português enviou um alto funcionário a Moçambique para libertar os 7 presos políticos militares portugueses, entre os quais o Luís. No início de 1976 foi libertado com os outros 6 prisioneiros e repatriado para Lisboa. Estava finda a sua abnegada, brilhante e sofrida carreira militar.

Contudo, como “herança” desses tempos de cativeiro, trouxe a doença que “surdamente” e ao longo de décadas esteve na origem da sua morte.

Regressado à Metrópole, i. e., Lisboa e à “vida civil”, em termos cívicos, culturais e sócio-políticos integrou e colaborou até à morte com várias organizações patrióticas e nacionalistas, e profissionalmente foi solicitador, prof. universitário da “cadeira” de Ciências Sociais na Universidade Autónoma de Lisboa e, por fim, ainda que sendo um docente e intelectual muito válido e querido dos seus alunos, por mesquinhez e de novo traído pelos supostos “seus”, reformou-se mui digna mas pobremente como empregado/porteiro de uma empresa de segurança privada.

"Dr. Luís Fernandes com boina GEP e "asas" de pára-quedista"

Não resisto a relatar que nas exéquias fúnebres do Luís (religioso-políticas) participaram mais de 100 amigos e camaradas vindos do Minho ao Algarve, bem como das Regiões Autónomas dos Açores e Madeira, sendo inúmeras as “boinas” amarelas dos Grupos Especiais, castanhas dos Rangers/Operações Especiais, verdes dos Pára-quedistas, vermelhas dos Comandos e dos GEPs, e pretas dos Fuzileiros. A sua urna, coberta com a Bandeira Nacional, foi “carregada em ombros” por vários amigos e camaradas de “velha” e “nova” data até à tumba por si desejada, sita no Talhão da Liga dos Combatentes do Cemitério do Lumiar, em Lisboa.

O Luís, Capitão e herói de guerra, como previsto, não chegou a ser agraciado com uma “Cruz de Guerra” na tradicional cerimónia de 10 de Junho de 1974, a qual não ocorreu devido à “confusão” post 25/Abr. Depois, caso se tivesse reformado como militar, ainda que eventualmente como oficial mero “escriba”, teria tido direito a honras militares com salva de tiros por um pelotão. Mas como se reformou como civil, as “balas” foram economizadas para um escriturário qualquer. Mas também não fizeram falta, pois a presença no seu funeral das Forças Armadas portuguesas que o traíram constituiria uma hipocrisia e um insulto à sua memória de bravo combatente.

Os seu amigos e camaradas de sempre encarregaram-se de lhe prestar as honras que bem mereceu e que, embora na sua proverbial modéstia, gostaria de ter.

O lema de vida do Luís Fernandes foi:

“A minha honra é a minha fidelidade”!

Tal lema, que escrupulosa e inquestionavelmente honrou e sempre praticou de forma intensa e vivida até ao “último suspiro”, é um exemplo a guardar e a seguir por todos os seus amigos e camaradas: fiel a Deus, à Pátria, à Nação, ao Povo Português, aos seus ideais, aos seus camaradas e amigos.

Que todos quantos tiveram o privilégio de conhecer o Luís, com ele conviver, merecer a sua indefectível e sentida amizade e camaradagem, saibam honrar a respectiva memória, seguindo-lhe o exemplo.

Luís Fernandes: Presente!

Francisco Garcia dos Santos

 

 

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