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O MUNDO NÃO É ELÁSTICO – IV
AMBIENTE

02-11-2018 - Jorge Duarte

Na terra, tudo está ligado; por isso, há tantas surpresas. A sociedade está infeliz, a economia está infeliz, o ambiente está infeliz. Se Platão cá voltasse via que o cão, o burro e a perdiz eram iguais como os deixou, mas aos homens, era-lhe impossível compreendê-los.

Poluição, desflorestação, esgotamento de recursos e ganância, são já impossíveis de deter pois é sobre eles que assenta todo o nosso modelo económico. E as alterações globais processam-se mais depressa do que a nossa capacidade (ou vontade) para as deter. Não admitimos falar em limites. Limites de crescimento da economia é um discurso suicida para qualquer político. Deste ponto de vista, a economia deverá crescer indefinidamente; se estagnar é já uma tragédia e derruba qualquer governo. Para que isso não aconteça, é preciso “criar” riqueza. Mas criar riqueza significa utilizar mais recursos para que haja mais consumo, que gera mais desperdício e lixo. Por isso, está meio mundo afanosamente a extrair para produzir e o outro meio, aflitivamente a enterrar. Somos a civilização da quantidade e da aceleração. E da alienação.

Um dos grandes publicitários americanos do início do Séc. XX, Eduard Bernays, com engenhosas ideias publicitárias conseguiu pôr as mulheres americanas a fumar (quando antes não o faziam) e dobrar a venda de cigarros às tabaqueiras. O seu sócio, Paul Mazur, escancarou as portas ao consumo: «Temos de fazer com que a América deixe de ser uma cultura de necessidades para se tornar uma cultura de desejos. É preciso treinar as pessoas para desejarem, para quererem coisas novas, mesmo antes de as coisas que já têm terem sido inteiramente consumidas. Temos de formar uma nova mentalidade. Os desejos do homem têm de se sobrepor às suas necessidades.» Inventou-se a bola de cristal para o consumismo desenfreado. E um mundo (in) civilizado, domesticado, onde as pessoas perdem o contacto consigo mesmas, rendidas ao exterior, invadidas pelo quotidiano moderno que lhes consome a existência e lhes ofusca o brilho da vida, na luta constante pelos interesses vitais, é o substituto do antigo mundo mais equilibrado.

Inventamos o contentor que é o símbolo do consumo e da globalização. “Transportamos o mundo” de um lado para o outro através dessas 15 milhões de caixas ambulantes, existentes. Podemos até fazer as contas do que consumimos e destruímos, calculando o seu volume com a medida padrão de 6x2.40x2.60 metros.

Entre 60 e 70% do PIB dos países desenvolvidos baseia-se em consumo não necessário e, ao mesmo tempo que a ciência económica avançou como em nenhuma outra época, a fome e pobreza no mundo também aumentam como nunca.

Vivemos viciados em consumo e crescimento e, simultaneamente, em estado de negação, mesmo sentindo na pele as rupturas, as catástrofes, as inundações, os incêndios, as guerras, os refugiados a fome e a poluição. São já os sinais do limite, do colapso. A esperança na capacidade dos modelos da tecnologia e da ciência para resolver tudo, é um mito, na transcendência que se devia operar no homem para evitar o colapso, outro. Porque ninguém se transcende a si próprio nem o homem parece querer tal coisa.

Tal como na nossa economia particular quando se gasta mais do que se tem, há duas opções: ou falir ou viver a crédito. É o que se passa nesta “máquina” redonda que habitamos. Perdeu-se a sustentabilidade e estamos na falência. Acontece desde o dia um de Agosto em que se estima que terão sido utilizados todos os recursos relativos a árvores, solos férteis e peixes que a terra consegue gerar num ano à humanidade. As emissões de carbono ultrapassaram o que os oceanos e florestas têm capacidade de absorver. Vivemos quatro meses a crédito e a cada ano o crédito reduz 1-2 dias, num processo regressivo até chegar ao “dia zero”, como na cidade do Cabo, com o fecho das torneiras. Apenas há cinquenta anos estávamos ainda no limiar da sustentabilidade.

O crescimento exponencial viciante só é possível enquanto as duas forças, população e capital industrial (recursos) tiverem capacidade de autorreprodução e exponenciarem todo o sistema mundial em constante crescimento. Mas a maior parte dos recursos são finitos e só a população se autorreproduz. A herança das gerações seguintes é um mundo sem mundo.

Os primeiros sinais de aquecimento da terra têm um século; os cálculos eram manuais mas a tendência já perceptível. E foi só na década de 80 (séc. XX) que tocaram todos os alarmes. Uma fome bíblica na Etiópia (com um milhão de mortos), a maior seca que os EUA já conheceram, uma crise alimentar generalizada, a maior quebra das reservas de cereais de que há memória, a quase totalidade do Bangladesh submersa, chuvas torrenciais na Índia, Nigéria e Mali, e a pior tempestade do século, com o furacão Gilberto.

Aparecem os primeiros movimentos ecologistas e inicia-se a discussão oficial do aquecimento global. Ao mesmo tempo termina aqui aquela que terá sido a época mais feliz da humanidade: os anos 1960-70.

E é no fim desta última década que os responsáveis mundiais começam a tomar as primeiras e ainda tímidas atitudes práticas relativas ao ambiente. Dá-se início a uma série de conferências internacionais, designadamente e entre outras: a de Estocolmo, em 1972; a do Rio-Eco 92, em 1992; de Quioto, em 1997; de Haia, em 2000; de Bona, em 2001; de Copenhaga, em 2009; de Cancun, em 2010; do Rio+20, em 2012; de Paris, em 2015; de Bona, em 2017.

Os principais tópicos que se introduziram nestas conferências foram, desde logo, a substituição dos CFC (gases destruidores da camada de ozono), em 1972; princípios e metas para educação ambiental (1977); Tratado de Educação Ambiental, Carta da Terra, Convenção do Clima e Biodiversidade (1992); Desenvolvimento Sustentável, redução dos gases de efeito de estufa em 12%, até 2016 e em 1.3 biliões de toneladas até 2030 (2012); redução das emissões de dióxido de carbono e limitar a subida da temperatura até 2 graus Célcius, redução de CO2 em mais 30% até 2030, criação pela Comissão Europeia de uma directiva que promove os veículos não poluentes e que 30% dos novos carros vendidos em 2030, na Europa, não emitam quaisquer emissões de CO2, no Acordo de Paris (2015); redução das emissões de dióxido de carbono (CO2) na União Europeia de, pelo menos, 40% até 2030 (2017). O último Relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas enfatiza a necessidade de redução de 1,5 graus Célsius e não 2, entre 2030 e 2052, tendo por base o período pré-industrial; as energias renováveis deverão representar, em 2050, entre 70 e 85% da oferta energética e as emissões de dióxido de carbono nulas em meados do século.

Facto é que, passados trinta anos desde a primeira legislação sobre o ambiente, as emissões de carbono não diminuíram por acção dessa legislação. A única diminuição de emissões deveu-se à crise de 2008 e seguintes, pela quebra da economia mundial. Mas, tão-logo a economia animou, voltaram a crescer as emissões. E com elas, o consumo, os efeitos sobre a biodiversidade, a fauna e a flora.

Continua na próxima edição

Jorge Duarte

 

 

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