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A PRESSA MATA

15-06-2018 - Jorge Duarte

“A pressa mata”. É um antigo dito popular, ultrapassado; não por não ser verdadeiro mas por se não conciliar com a irracionalidade desta era apressada onde tudo o que é lento e reflectido é um obstáculo à emergência das múltiplas rupturas que a “nova” mentalidade verbalista quer para ontem.

Assistimos a um desenfreado jorro legislativo e impositivo sobre tudo o que é existência (ou o que resta dela) de comportamento e pensamento cultural intrinsecamente, lusos. Esta revolução cultural culmina agora na tentativa de legitimação da eutanásia.

De repente, deparamos com uma Assembleia da República em alvoroço como em último dia do fim do mundo para legalizar a eutanásia antes do iminente juízo final. Não foi à primeira que a maioria dos 230, se abalançou nessa apressada vergonha, mas será à segunda, garantem-nos os arautos do mundo novo, sem tabus, da actual doutrinação de massas por sugestão.

Qualquer discussão prévia sobre a matéria fora da Assembleia é evitada, não vá o assunto alertar para a necessidade, legítima, da séria e ponderada reflexão e obstaculizar aquilo que “à segunda passará”. Como se cada cidadão que sustenta esta gente não tivesse direito à opinião, ao esclarecimento e, até, à partilha de tantas dúvidas que este assunto - como tantos outros -, suscitam. A pressa impede que se pense, que se debata, que se reflicta, que se planeie e que se perspective o futuro. Factos aos quais parece haver a maior aversão mas que são um dos nossos flagelos.

Eu próprio não tenho ainda uma opinião definida sobre o assunto. Decidir como dispor da minha própria vida é, apesar de tudo, menos difícil; diferente é decidir sobre a vida de outro – e sabemos do quanto a condição humana é capaz. Daí, a necessidade dum amplo debate, num tempo tão prolongado quanto o necessário, até à maturação da decisão. Seria o bom-senso. Mas não é assim que uma maioria de deputados – que não são a extensão da minha voz – entende. Ou entende apenas para satisfação das suas relativas mas ruidosas franjas eleitorais onde qualquer bandeira que represente polémica, ruptura, fragmentação, desenraizamento cultural e votos, provoca o êxtase. E sabem-no. Mas rebaixar o padrão do pensamento, desconstruindo-o, racionalizar o que é supra-racional, implodir valores tradicionais, fomentar oportunismos ou divisões é pura barbárie.

Banida a réstia moral ou transmutada em exclusivamente ética e modernamente deontológica, fácil se torna observar a vida como existência meramente mecânica. E, neste capítulo, eutanasiar, não é mais do que um mero balanço de Deve e Haver. Doravante, excluído de misericórdia, pois que misericórdia é reino de compaixão, de comiseração ou piedade. Mas já se disse que aqui não entram tais conceitos nem asserções morais. Lembrando ainda o ancestral “golpe de misericórdia” infligido a um ferido ou moribundo numa qualquer guerra clássica medieval e como até num tal cataclismo terráqueo, na mais baixa miséria, esse apelo à misericórdia, enquanto tal, pode existir. Reconhecidamente, não existirá na nossa Assembleia da República. Apenas a ética relativista. A moral é ofensiva e valor perdido. Paradoxal é serem os mesmos tão sensíveis nas causas pessoais ao não banirem com a mesma destreza e fervor a lei que fizeram e lhes permite, de vez enquando, processar alguém por ofensas morais, quais viúvas ofendidas.

Claro que qualquer grão de areia introduzido nesta susceptível engrenagem/ engenharia social, encontra o óleo lubrificante ou solvente, adequado à remoção, seja na fórmula de “obscurantista”, ou “rato de sacristia”, podendo estender-se a “intolerante”, “racista” ou “xenófobo”, dependendo do tema predilecto e fracturante, em causa.

Não é assim com todos os exemplos anteriormente abordados? Não é assim quando se restringe a liberdade e se impõe a ditadura do “politicamente correcto? Quando não se reconhece maturidade a uma criança de 16 anos, para conduzir ou votar e se lhe permite mudar se sexo? Quando se destrói a família? Quando se pretende criar um museu dedicado à nossa História dos Descobrimentos e não se lhe pode atribuir este nome? Quando se faz revisionismo histórico?

E, de estupidez em estupidez, se vai dissolvendo o discernimento, recalcando a realidade e apagando as nossas raízes identitárias.

Fosse esta democracia verdadeira e com valores, e escusava de recorrer à sua melhor definição, dada pela superioridade moral de Pierre Mendès-France: «Democracia é muito mais do que a prática de eleições e o governo da maioria; é um tipo de costumes, de virtudes, de escrúpulos, de sentido cívico, de respeito pelos adversários; é um código moral».

E não fosse o tal dito popular antigo “a pressa mata” e poderia ser reescrito, hoje, como “a pressa de matar”.

Jorge Duarte

 

 

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