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TRAGÉDIAS DA NATUREZA

13-10-2017 - Pedro Pereira

Os homens que julgam dominar os ciclos da natureza, dominar os humores do mundo. Ao invés, porém, são governados por este, mais concretamente, pela meteorologia.

Para quem tenha dúvidas, basta lançar uma espreitadela à História dos séculos que nos precederam e observar as surpreendentes relações entre as condições climáticas e os acontecimentos sociais, políticos, culturais e económicos daí decorrentes.

Como exemplo: sempre que as temperaturas se tornaram mais amenas na Europa Ocidental no decorrer da Idade Média, assistiu-se às incursões, aos ataques e invasões de diversos povos provindos além dos Urais.

Recuando um pouco mais no tempo, verificamos que a Humanidade deu um verdadeiro salto em termos de vivência e organização social, há cerca de dez a doze mil anos, no término do último grande período glaciar ( também conhecido como Idade do Gelo, Glaciação Wisconsin, Glaciação de Würms, Würmiano ou Laurenciano. Esta é a designação dada ao último período glaciar da Terra registado durante a presente idade geológica. Teve lugar no final do Pleistoceno, entre aproximadamente 110 000 a 10 000 antes do presente) , tendo por causa primordial a feição amena que então tomou o clima, o que favoreceu a agricultura e a pastorícia. Em suma: quando o Homem começou a construir aldeias e se sedentarizou, portanto, naquela que se insere nos anais da História como a Revolução Neolítica. Foi a primeira grande revolução da Humanidade que permitiu alimentar regularmente um crescente número de indivíduos e criar a divisão social do trabalho. A partir de então, o desenvolvimento da vida dos homens foi explosivo. Nos cinco mil anos que se seguiram, o caminho percorrido foi imenso, enquanto, que nada de assinalável aconteceu em termos de organização social humana nos quinhentos mil anos anteriores, a aferir pela escassez de registos arqueológicos…

Mais « perto» da nossa era, por exemplo, entre 1460 e 1550 a Europa foi avassalada por uma pequena era glaciar, particularmente sentida para lá dos Pirenéus, que teve como consequência guerras, fomes e pestes que dizimaram centenas de milhar ou milhões de indivíduos.

Tomemos ainda como outro exemplo, a erupção do vulcão Kracatoa, na registada em 1883. Trata-se, sem dúvida, da mais poderosa erupção vulcânica registada nos anais da História, uma vez que libertou uma astronómica energia, semelhante à libertada por uma bomba nuclear de 1000 mega toneladas, ou seja, 60000 vezes mais potente que a quela que foi lançada sobre Hiroshima em 1945.

De 26 a 28 de Agosto de 1883, as explosões desse vulcão, situado nas ilhas indonésias de Sonda, entre Java e Samatra, tiveram como resultado, 36400 mortos resultantes de maremotos ( ou tsunamis) com 36 metros de altura, sendo que as vagas maiores desabaram no litoral das ilhas vizinhas, à velocidade de 140 quilómetros/ hora. Aldeias, comunidades inteiras ancestrais foram riscadas do mapa em pouco tempo.

O maior dos maremotos resultante da explosão do Kracatoa fez ruir paredes num raio de 150 quilómetros e foi sentido a dezenas de quilómetros de distância.

Se consultarmos um gráfico das devastações provocadas pela natureza, ao longo do século XX, verificamos uma evolução exponencial em termos de destruição e mortes, com particular agravamento nas duas últimas décadas do século, provocadas por terramotos, cheias, furacões, explosões vulcânicas e maremotos.

Nos dias de hoje, particularmente, são sentidas por todos as substanciais alterações climáticas que de há uns anos a esta parte se tem vindo a verificar em crescendo por todo o planeta, sobretudo o aquecimento global ou efeito de estufa, sobretudo nestes últimos três anos, com o correspondente degelo de milhares de quilómetros quadrados de glaciares. Porém, não nos enganemos, porque a História da Terra, segundo os cientistas, diz-nos que após um período inter-glaciar ( que é o estamos a atravessar) vem um período glaciar e a mudança climática de uma para a outra etapa, sucede bruscamente. Ou seja, depois de um período de transgressão marinha ( subida do nível dos mares) as águas recuam para os pólos ( regressão marinha com formação de glaciares). Cientistas há, que aventam (à porta fechada) que o período inter-glaciar está a terminar. Outros dizem que ainda faltam umas centenas de anos. Neste aspecto a opinião no seio da comunidade científica não é unânime.

Como seja, quer em breve, daqui a dezenas ou centenas de anos, as catástrofes da natureza estão por aí, quase todos os dias, um pouco por todo o planeta, invariavelmente com uma cada vez maior amplitude, quase sempre com um saldo progressivamente mais desastroso relativamente ao antecedente.

Por tudo isto, não se pense que as calamidades como temos vindo a assistir por todo o mundo, não possam vir a atingir Portugal e em particular a região do Algarve. Na verdade, a poucas milhas da costa portuguesa existem algumas falhas sísmicas que a todo o momento podem movimentar-se.

Muito embora já no século XX se tenham verificado alguns abalos de terra causadores de grandes destruições, como o de 1968, vários outros se registaram – e se vem registando - sem consequência de maior. Mas nem sempre foi assim na História de Portugal. Os acontecimentos verificados há poucos anos na Ásia, remetem-nos para o terramoto de 1 de Novembro de 1755, seguido do maremoto que arrasou a que é hoje chamada de Grande Lisboa, nela se incluindo a capital, é evidente, mas também todo o sul do país, com especial devastação e morte por toda a orla costeira do Algarve - e interior - mais por via do tsunami que propriamente pelo ruir das casas.

Povoações houve, que desapareceram totalmente debaixo das ondas, como Vila Velha de Cacela, de que sobraram as ruínas da fortaleza e algum casario em volta, porque se encontrava mais distante do mar e em zona bastante elevada.

Mas para termos uma ligeira noção dessa calamidade, comecemos por uma ponta: - Aljezur - por via do cataclismo, todas as casas da vila ficaram arrasadas bem como parte do castelo. As águas da ribeira da cerca foram tragadas, primeiro, por enormes fendas que se abriram no seu leito, depois, do mesmo leito começaram a irromper grandes cachões de água salgada que o fez transbordar.

Junto ao mar, no seu concelho, as ondas arremeteram por três vezes e em tão grande altura e de tal ordem que cobriram a fortaleza da Arrifana, acabando por a arruinar.

O mesmo aconteceu com Odeceixe, por onde o mar entrou, arrasando mais de cem habitações. Em Sagres e no Cabo de S. Vicente, as habitações, igrejas e fortalezas ficaram muito danificadas. O mar galgou pela terra dentro deixando grande quantidade de peixe na vila quando recuou. Quase toda a gente conhece a altura a que Sagres se encontra do mar e, portanto, pode calcular quantos metros a água subiu.

Da mesma calamidade sofreu Lagos, Portimão, Albufeira, Quarteira, Faro, Olhão, Tavira e Stº António de Arenilha, aldeia de pescadores que ficou debaixo de água e foi tragada pelas areias. Situava-se sensivelmente na zona de Monte Gordo.

Depois , por incumbência do rei D. José I e execução do Marquês de Pombal, nasceu Vila Real de Stº António, não muito longe do povoado desaparecido.

De resto, mesmo o interior da região ficou seriamente afectado. Povoações destruídas e casas inabitadas.

O cortejo de mortes foi imenso e as consequências da tragédia fazem-se sentir ainda nos dias de hoje, quer pela alteração geográfica dos povoados, quer pela perda de vasto património arquitectónico e cultural. Mas não só por este cataclismo, também por outros de maior amplitude de que as crónicas pouco referem, em especial os registados no século XVI, em que a terra tremeu pelos menos dez vezes. O sismo de 1513 atingiu particularmente a capital do reino deixando um imenso rasto de destruição. Mas também povoações inteiras desapareceram do mapa, tal a intensidade dos abalos de terra.

De acordo com o cronista Garcia de Resende, que relatou os dois grandes terramotos de 1513 a que assistiu, « Primeiro um raio e depois um trovão e logo a terra abalada e sacudida, parecendo que o mundo se destina para não haver mais mundo». Ainda de acordo com Resende, «em todos os abalos abriram-se crateras no chão de onde saíam jactos de água e areia acompanhados de forte cheiro a enxofre».

De novo, na madrugada do dia 26 de Janeiro de 1531, um grande abalo de terra destruiu parcialmente Lisboa. A terra tremeu fortemente por três vezes. Pensa-se que foi de intensidade semelhante ao de 1755.

No entanto não há registo de maremotos, ou grandes incêndios. Não obstante e de acordo com registos orais da época, teriam perecido cerca de 30000 pessoas só em Lisboa. Atendendo que a cidade registada na época cerca de 100000 moradores, a percentagem da mortandade foi elevada.

Desapareceram algumas ruas da capital, como a dos Fornos e a Rua Nova. Houve danos na Sé, no Convento do Carmo e na Igreja de São João da Praça.

Parte do palácio real, no Paço da Ribeira, ficou bastante danificada, bem assim como a Torre de Belém e o Mosteiro dos Jerónimos. No Rossio ruiu a Igreja de Nossa Senhora da Escada, uma parte do Paço dos Estaus (onde se acolhiam os altos dignitários estrangeiros) e parte das naves do Convento de São Domingos (onde está hoje se situa o Teatro de D. Maria II).

O rei D. João III que se encontrava no Paço de Benavente, teve deslocar-se para Alhos Vedros e de seguida para Azeitão, uma vez que os seus aposentos de Benavente ficaram destruídos.

De salientar que o Bairro Alto, um dos primeiros bairros europeus a ser construído com planta em quadrícula, foi construído para responder à destruição provocada pelo terramoto de 1531. 

Os exemplos que acima apontamos devem alertar-nos para os diversos tipos de catástrofes que em cada dia que passa surgem com mais frequência e mais destruidoras nas mais diversas latitudes do globo.

Especial atenção deve merecer-nos as drásticas alterações climáticas que vimos sofrendo.

O que virá a seguir?...

Em suma: a Natureza tem o seu ciclo de vida e humores muito próprio, que o Homem, impante do alto da sua «sabedoria», não consegue domesticar.

Pedro Pereira

 

 

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