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Seremos todos idiotas?

02-09-2016 - José Janeiro

“Os idiotas vão tomar conta do mundo, não pela capacidade, mas pela quantidade. Eles são muitos” (Nelson Rodrigues). Nunca uma frase assentou tão bem no que se está a passar nos dias de hoje.

Como prometi na semana passada, desta vez vamos tratar dos direitos e deveres como cidadãos da Republica Portuguesa e quão parece ser difícil interpretar a lei fundamental.

Só para lembrar:

A Constituição é a lei suprema do país. Consagra os direitos fundamentais dos cidadãos, os princípios essenciais por que se rege o Estado português e as grandes orientações políticas a que os seus órgãos devem obedecer, estabelecendo também as regras de organização do poder político.

Todas as outras leis têm que respeitar a Constituição - se não a respeitarem, são inconstitucionais e, por isso, inválidas.

Decidi voltar a ler a CRP e comparar o que ali está escrito com os mais diversos actos praticados e eis ALGUMAS surpresas:

- Segundo parece, Portugal é uma república soberana que se baseia na dignidade humana e na vontade popular tendo em vista construir uma sociedade livre, justa e solidaria.

Não dá para rir, mas logo este artigo 1º é permanentemente violado por todos os órgãos de soberania, querem exemplos? Basta andar pelas ruas e identificam centenas de casos de uma sociedade injusta, pouco solidaria e que trata os seus cidadãos com pouca dignidade, mesmo como lixo. Para já não falar na falta de soberania existente e bem patente nos tempos da troika e na vigilância feita pelos órgãos europeus. Quanto á vontade popular, se se levasse à letra o artigo em causa, TODAS as eleições desde há uns anos eram simplesmente anuladas ou a Assembleia da Republica teria inúmeras cadeiras vazias fruto da abstenção.

Afinal viver na rua, não ter dinheiro para comer, recuperar bancos e coisas afins não é anti-constitucional, mas pensava que sim!

- Segundo parece, Portugal é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular e mais umas coisas, como pluralismo e tal.

Ora acontece, que a composição da Assembleia da Republica permite um poder em coligação com 3 partidos e seus apêndices, essa foi a vontade popular, mas ainda hoje os democratas que, segundo parece dizem ter ganho as eleições, só porque foram o partido individual mais votado, não conseguem engolir essa vontade popular e tudo fizeram e fazem para denegrir uma coligação e o país, quer cá dentro, quer lá fora.

Afinal dizer e fazer crimes claros contra a constituição, não é anti-constitucional, parece ser liberdade de expressão!

- Segundo parece, todos os cidadãos gozam dos mesmos direitos e são iguais perante a lei, independentemente de coisas tão engraçadas como, ascendência (uau é verdade), sexo, raça, religião e convicções politicas.

Sinceramente dá vontade de dizer que uns são mais iguais que outros, penso que todos se lembram dos mais diversos atropelos e desigualdades de tratamento na justiça e não só. Vou partilhar um caso que se passou comigo: Aqui há uns 4 ou 5 anos numa operação stop e por estar a usar duas saídas de auricular e por me ter recusado a pagar a multa no imediato, vi a carta de condução apreendida. No mesmo dia em notícia de telejornal ficámos a saber que o Presidente do TC (julgo, já lá vão uns anos) foi interpelado em excesso de velocidade e nada aconteceu, foi apenas identificado. Questionei o órgão competente da razão da diferença de tratamento e ninguém me soube informar. Questionei o próprio e recebi uma página A4 carregada de artigos diversos e decretos-lei, para terminar dizendo “eis a razão pela qual estou impedido de lhe responder”. Desde esse dia, outros exemplos poderiam aqui ser abordados e bem conhecidos por todos, dizia, desde esse dia, que senti na pele a diferença anti-constitucional.

Afinal isto só é valido para alguns e parece ser constitucional a diferença.

- Segundo parece, todos têm acesso á justiça para sua defesa, direito á protecção do segredo de justiça e enfim, protecção contra ameaças aos seus direitos e coisa e tal.

Os custos da justiça são apenas proibitivos, ou seja quem quiser fazer valer a sua razão tem que desembolsar forte e feio, talvez porque o sistema estando entupido há que limitar um direito constitucional. Depois alguém que experimente pedir apoio judiciário tendo por exemplo uma casa em seu nome, mesmo que esteja a pagá-la ao banco, por ter esse “bem” não têm direito a qualquer apoio. Se tiverem uma empresa e houver dificuldades e queiram por exemplo, cobrar uma divida, existe uma alteração legislativa que impede as empresas de terem acesso ao apoio judiciário, seja qual for a situação.

Afinal ficámos esclarecidos com esta norma constitucional. Nada coíbe a Assembleia da Republica e os órgãos de soberania decidirem leis anti-constitucionais.

- Segundo parece, e este é o artigo mais hilariante, todos temos direito á resistência quando não seja possível recorrer á autoridade pública.

Experimentem argumentar numa qualquer situação, em que se sintam ameaçados e desprotegidos, este direito constitucional e depois da uma primeira surpresa em que olham para si como se você fosse um extraterrestre, vem a decisão final: “ah isso não é bem assim” e ficamos por aqui.

Afinal este artigo constitucional é apenas, o que o povo chama, um verbo-de-encher bem-intencionado.

- Segundo parece, a constituição prevê a responsabilização “do Estado e as demais entidades públicas”, bem como os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes por acções ou omissões no exercício das suas funções.

Tem havido por aí uns tais titulares de órgãos (não sei se órgãos de igreja ou outro órgão qualquer) realmente condenados, mas pasme-se, sempre com pena suspensa e sem se quer serem responsabilizados financeiramente pelos prejuízos causados, fora aqueles cujas sentenças se vão arrastando no tempo indefinidamente que ainda não sabemos como a coisa acaba. Mas até os posso entender, como não há terreno em Évora para alargar a cadeia, nem dinheiro para isso a coisa tem que ficar assim, a bem do orçamento do estado.

Afinal a responsabilização não é bem assim, é mais ao lado, tudo fica na santa paz de um deus qualquer á espera de novos momentos.

- Segundo parece, há uma figura engraçada que é o provedor de justiça, engraçada porque parece que ninguém na justiça lhe dá muita importância, contudo, existe segundo a constituição, para nos defender e segundo escrito na CRP, para “prevenir e reparar injustiças”.

Por experiencia própria recorrendo á figura prevista na CRP, e obtendo o tal parecer “reparador” de uma injustiça, que até era favorável, constatei que só serviu para emoldurar no teto para quando estou pensativo olho para aquele rectangulo e penso: “que coisa engraçada ali está”, porque efeito pratico népia!

Afinal nem me tinha apercebido que era inconstitucional pedir um parecer que depois não serve para nada.

- Segundo parece, todos temos o direito de participação na vida pública e todos temos igualmente acesso a cargos públicos.

Experimentem usar este argumento num Partido Politico ou concorram a cargos públicos sem o cartãozinho magico e depois contem-me. Não sei se será um destes artigos Constitucionais que se usam na nomeação de boys, já estou a imaginar o despacho: “Conforme o artigo 50º da CRP nomeio fulaninho de tal para acessor, do acessor, do acessor, como especialista”, fica bonito e dá um ar catita! Quanto ao direito de participação na vida pública, bom, segundo parece, existem qualquer coisa como quase 9.9 milhões de incompetentes no país porque as tais participações e propostas pelos partidos a sufrágio nas eleições rodam incansavelmente entre os mesmos iluminados, que depois de um estagio universitário nas universidades de verão, nos bombardeiam com a sua imbecilidade e incompetência numa “barilabia” que não diz nada.

Afinal a coisa fica apenas engraçada e demonstra a boa vontade do redactor constitucional.

- Segundo parece, temos que pagar impostos, bom até aí nada de novo, o que acontece é que talvez ninguém se tenha dado ao trabalho de ler o que a CRP diz e são ali tratados os impostos sobre o rendimento pessoal, que será único e progressivo para procurar eliminar desigualdades, os das empresas que deverá ser sobre o lucro real, a tributação sobre o património que dizem visa contribuir para a igualdade dos cidadãos e por fim a tributação do consumo que visa adaptar a estrutura do consumo às necessidades tributando produtos de luxo.

Gostei das boas intenções e como diz o povo o inferno está cheio delas. Vejamos: quanto ao rendimento pessoal todos sabemos que estudos apontam que poderíamos pagar menos 38% de impostos se não houvesse fuga ao fisco e que 10% da riqueza produzida fica por cobrar, portanto estamos esclarecidos. Quanto á tributação sobre o lucro real das empresas, duas realidades se perfilam: o roubo instituído do PEC – Pagamento Especial por Conta que é uma percentagem sobre as vendas, não sabia que as finanças eram comissionistas das empresas e a fuga via empolamento de custos e sob facturação que por certo todos bem conhecem ou ouviram falar. Se formos á tributação do património não entendo que igualdade a CRP se refere quando todos conhecemos as barbaridades, ao nível do IMI por exemplo, aonde houve penhoras de casas de famílias carenciadas por não terem dinheiro para pagar o IMI. Viva a igualdade! O imposto sobre o consumo é realmente uma anedota, entre muitos exemplos que poderíamos citar, temos o IVA sobre as fraldas dos miúdos e o IVA sobre os campos de golfe, 23% e 6% respectivamente, um puto a cagar é um luxo, umas tacadas num campo de golfe é arte, sei lá.

Afinal tanto roubo constitucionalmente aceite.

- Segundo a constituição, o orçamento do Estado seria um documento a ser elaborado com alguns procedimentos ali definidos, seria maçudo enumera-los.

Na realidade a boa vontade do legislador perde-se por aí mesmo, porque sabemos bem como o orçamento do Estado é feito: para manter o status quo e proteger interesses instalados. O primeiro governo que consiga fazer o primeiro orçamento do estado, com base zero será o meu herói, só que é pedir muito. E depois como fariam para sustentar a corja?

Afinal até temos boas intenções na constituição.

Como este zurzimento já vai longo e como não tenho pretensão em ir a todo o lado, muita coisa ficou por dizer, mas termino com alguns lembretes irónicos:

É Constitucional, as subvenções vitalícias, fantástico!
É Constitucional, as PPP’s, incrível!
É Constitucional, a subvenção de Fundações, Observatórios e outras coisas engraçadas, Uau!
É Constitucional, nomear boys com fartura, para redução do desemprego partidário!
É Constitucional, ninguém ser responsabilizado por actos que prejudiquem o país, pois entendi!

Já é inconstitucional a dignidade, a igualdade, a saúde, a educação, o bem-estar, a velhice e a seriedade mental! Isso que até está inscrito por lá teremos que fazer tabua rasa.

Pensem nisso!

Até para a semana.

José Janeiro

 

 

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