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Elegia a um amigo que partiu

12-02-2016 - Francisco Pereira

Eu tive um amigo, que me tratava bem, não éramos particularmente chegados, nem precisamos de o ser, mas cumprimentávamos sempre, passássemos um pelo outro, duas ou três vezes no mesmo dia.

Desde puto que me habituei a vê-lo, mais ao seu pequeno rádio a pilhas, nas suas deambulações pela vila, desde puto que lhe dizia bom dia ou boa tarde. Ao início assustava-me, o seu andar desconexo, as dificuldades de linguagem, e a fisionomia forte assustavam, foi com ele que comecei a perceber a existência da deficiência, a minha mãe, pessoa que na pequenez académica da sua terceira classe é mais inteligente e sabedora que muitos “doutores” que conheço, foi ela que me explicou que esse meu amigo tinha problemas, foi assim que comecei a perceber a deficiência e a aceitar que sendo todos diferentes alguns de nós são deficientes e é mesmo assim.

Durante décadas habituei-me à sua figura esquálida, percorrendo as ruas desta terra com um pequeno e gasto rádio a pilhas onde escutava as suas músicas preferidas, a pirisca acesa entre os dedos amarelecidos, e lá seguia ele, rua fora, com um andar característico, que meio trôpego lhe dava uma graça simpática, sempre correcto, sempre educado e atencioso.

Fazia pequenos recados, apanhava consultas no centro de saúde, entre outras pequenas coisas, actividades essas que iam rendendo uns míseros trocos com que animava a sua parca e magra existência, próximo do Natal, pelos cafés da terra, surgiam as suas latinhas, com uma mensagem simpática onde apelava ao espírito natalício dos clientes desses locais, para que nas latas depositassem umas moeditas que lhe engordassem os parcos proventos.

Lastimo o seu falecimento profundamente, um pouco de mim morreu com esse meu amigo, um pouco de mim morreu com o excelente ser humano que era, como pessoa era do melhor que esta terra tinha.

Quando eu findar os dias, gostaria de ter um funeral assim, como o do meu amigo, só com amigos, mesmo que sejam poucos, ali só estavam amigos, pessoas a quem de alguma maneira tocou com a sua humildade e decência, ninguém estava ali movido por interesses comezinhos, nem por obrigação, estavam ali porque gostavam genuinamente daquele homem simples e bom.

Esse meu amigo merece homenagens, estátuas, nomes de rua e merece tudo isso, ao contrário de muitos outros, por ser honesto, por ser educado e por ser uma excelente pessoa e deviam ser as pessoas boas as únicas a ter tais distinções! Chamava-se de seu nome João Manuel Flores Folgado, talvez o tenham conhecido como João Flor, partiu num dia frio e triste, partiu assim rodeado de amigos uma alma dócil e amável, como diziam os antigos “amicum perdere est damnorum maximum” e esta foi para todos os que dele gostávamos uma grande perda, adeus João, até sempre!

Francisco Pereira

 

 

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