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Memórias (22)

29-05-2015 - Henrique Pratas

O processo civil, levou anos a resolver como tudo neste País, na altura o atual Presidente da República era Primeiro-Ministro, o processo corria no Tribunal da Guarda, aí tive que socorrer de um advogado, para contrapor os 750.000,00 € que a Seguradora queria dar a título de indeminização pela perca da vida do meu pai, era esse o valor que valia a vida de uma pessoa indignei-me e geri o caso com pinças porque por um lado não podia submeter a minha mãe a muitas sessões de Tribunal, pois cada vez que o nome do meu pai era mencionado ela ficava enervadíssima.

Certo é que não pretendíamos enriquecer com a morte do meu pai, mas caramba a minha mãe tinha direito a ter o mesmo nível de vida que o meu pai lhe proporcionara, para mim não queria nada já tinha emprego, queria era terminar a Faculdade, mas o valor que estabelecia pela vida de uma pessoa, fosse o meu pai ou outra revoltava-me e como estava na fase em que queria mudar o Mundo, pretendia que o atual estado de coisas se alterassem não só para a minha mãe, mas para todas as outras pessoas que se encontrassem, ou pudessem vir a estar na mesma situação. Andámos cerca de três anos, numa guerra surda e sem despacho, os Tribunais na altura já funcionavam como hoje, senti que o Juiz não sabia que volta havia de dar ao processo, até que um belo dia somos convocados para ir ao Tribunal da Guarda, para uma tentativa de conciliação, quando dei a noticia à minha mãe, a sua primeira reação foi dizer-me que não ia entendia-a mas ela tinha que ir, não podia delegar as competências para desistir, aceitar da proposta que lhe seria apresentada, em mim ou no advogado, estávamos em 1982, tinham passados 2 anos e eu não queria que minha mãe sofresse mais com isto, por causa da minha teimosia, mais uma vez preparei-me em termos das normas de legais aplicáveis no caso vertente.

Quando lá chegámos, já tinha interiorizado que tinha que resolver a situação naquele dia, não queria protelar mais a situação, apanhámos um Delegado do Ministério Público espetacular, que percebeu o melindre da situação e apenas por umas palavras que lhe disse ele voltou-se para mim e disse-me, vamos resolver isto hoje e de uma vez por todas.

Inicialmente a Seguradora queria dar 850.000,00 € e disse que aquela era a sua última posição, não gostei da forma como colocaram as coisas falei com o referido Delegado do Ministério Público, dei-lhe a entender o que pensava devidamente suportado legalmente, ele ainda me perguntou se era licenciado em Direito, disse-lhe que não estava a acabar Económicas como acabei nesse ano, mas como entendeu que eu não estava a pautar o meu raciocínio por causas meramente economicistas e como a minha argumentação tinha sustentação, ele que andava com um colar usado pelos juízes ao pescoço, voltou-se para mim e disse-me vamos resolver isto hoje eu venho já.

Esperei com a minha mãe e o advogado. A minha mãe como sempre estava fora de tudo apesar de eu explicar tudo ela não queria saber não podia ver mais aquela gente, só me dizia que cada advogado cada malandro e que aquilo estava tudo combinado com a Seguradora e os Juízes, não a contrariei, ao meio-dia aparece-me o delegado do Ministério Público a perguntar se podia esperar para depois do almoço o processo de tomada de decisão, como não queria dar o flanco e ser mal-educado, apesar de já estar farto daquilo disse-lhe que sim, tentei levar a minha mãe para ir almoçar, mas ela perentoriamente disse-me que não lhe apetecia nada o que queria era ir-se embora dali, ficou com um “ódio” à Guarda indescritível. Bem lá aguentei a situação, mais um dia mal alimentado, pois não ia almoçar sem que a minha mãe fosse, comemos algo, fui-lhe buscar comida levei-a para um jardim e assim consegui que ela ingerisse qualquer coisa, como se estava a aproximar da hora de volta ao Tribunal, fomos andando e à hora marcada, 15 horas, lá estávamos. Aparece-me o Delegado do Ministério Público já com o despacho do processo onde atribuía à minha mãe e a mim a quantia de 1.750.000,00 €, não era o que pretendia mas como já vos escrevi não queríamos enriquecer à custa da vida do meu pai, fiquei inicialmente sem saber o que fazer, contei à minha mãe, resposta imediata eu não quero saber de nada, falei com o advogado e ele disse-me que a possibilidade de em sede de Julgamento de obtermos aquela quantia era muito pouco provável, mas que eu que decidisse, o peso da decisão assentou mais uma vez nos meus ombros, pesei os prós e os contras e decidi aceitar a proposta feita, punha términus a mais um rabo-de-palha que se andava a arrastar, iria terminar para a minha mãe e para mim o calvário de andar sempre a falar de processos relacionados com o acidente do meu pai. Os custos que iria ter com o advogado que era de Lisboa, em honorários, custas e deslocações ao Tribunal da Guarda iriam compensar a não litigância e poderíamos conseguir 2.000.000$00 e nada mais, tudo visto, analisado e ponderado decidi aceitar, a proposta feita, foi celebrado o acordo e devidamente assinado por ambas as partes com a Seguradora a torcer o nariz como é hábito, mas em termos de resultado prático tinha conseguido mais do que o dobro daquilo que pretendiam inicialmente dar.

Coloquei mais uma pedra sobre o assunto, ainda me recordo de perguntar à minha mãe se ela estava satisfeita, resposta não quero saber tu é que sabes. Como vos referi este tormento já se arrastava há dois anos não queria protelar mais aquela situação pelas razões que vos invoquei e também para poder ter um bocado de paz, pois a partir da morte do meu pai, fui eu que tive que assumir a responsabilidade de tudo, isto para quem não estava habituado foi uma “bela” experiência, a minha vida está repleta de experiências destas e doutras, aprendi tudo na prática, a realidade é muito diferente do que está escrito nos livros, é importante termos os conhecimentos teóricos para que na prática os possamos aplicar, mas às vezes é muito difícil, porque a realidade é muito diferente do que possa estar em qualquer compêndio, isto aprendi bem cedo e tive oportunidade de o confirmar, ao longo da minha vida, aliás eu apesar de já ter aprendido alguma coisa, ainda continuo a aprender todos os dias a minha disponibilidade é total para este processo de aprendizagem continuo nunca conseguimos saber tudo, os conhecimentos dos outros também são importantes e algumas das vezes abrem-nos os olhos para perspetivas diferentes de olhar para as coisas e de as analisar.

Resolvida que foi esta questão, tentei que as coisas estabilizassem mais para o lado da minha mãe, pois eu não tinha tempo para me coçar, queria acabar o meu curso, não gosto nada de deixar coisas a meio.

Como vos escrevi comecei a trabalhar em 01 de agosto de 1980, podia usufruir do estatuto de trabalhador-estudante, mas como sou muito profissional nunca saí às 16h30m hora em que me era permitido sair do meu local de trabalho, naquele tempo havia sempre coisas para fazer e eu trabalhava com “gente” muito “gira” conhecedora e tínhamos um projeto a por de pé, não os queria abandonar por um lado, queria fazer parte integrante do processo de constituição de uma organização, assim muitos dias só saía quando acabava as minhas tarefas, não gostava de deixar para amanhã o que podia fazer hoje, ainda hoje sou assim, acho que sempre fui, aprendi isto na instrução primária, foi aí que “deram” por mim era de confiança, diligente e profissional, por isso me confiaram tarefas que na altura só poderiam ser entregues a alguém que tivesse muita experiência em termos profissionais e que fosse de confiança, o “miúdo” viu reconhecidas as suas capacidades e foi-lhe confiados muitas tarefas “pesadas” ao tempo, estávamos num período de muita turbulência em termos do tecido empresarial, mas com a aprendizagem que fazia todos os dias com os meus “mestres” ia-me desenvasilhando do que me era colocado como desafio com alguma destreza, eficiência, bom senso, e eficácia.

Estava a viver momentos da minha vida inigualáveis, por um lado tinha ganho a confiança daqueles que comigo trabalhavam, as pessoas acreditavam em mim e na minha capacidade de trabalho não as podia desiludir, por outro lado queria acabar o meu curso, foram duros os dois anos que levei para acabar o meu curso superior de Economia, decisão que eu tinha tomado, quando tinha 10 anos recordam-se, não podia falhar comigo próprio.

Eu sou muito exigente com a sociedade e com aqueles que comigo trabalhavam, mas sou muito mais exigente comigo próprio, procuro sempre alcançar a excelência, a perfeição, valores estes que me foram incutidos pelos meus avós e pais, sei que a maior parte das vezes não é alcançável que é uma utopia, mas quando me meto em alguma coisa é sempre para fazer as coisas certinhas e direitinhas sem qualquer tipo de falha.

Para vosso conhecimento dou-vos conhecimento de uma situação que passei numa aula ànoite numa cadeira do 4.º ano de Economia, Economia Politica Industrial, o professor um dia à noite teve a destinta lata de responder a um companheiro meu de curso, estávamos a traçar as curvas da oferta e da procura, introduzindo as elasticidades de cada uma delas e o meu companheiro de curso não percebeu, levantou o braço e colocou a questão que o incomodava, resposta do professor, “quem não percebe isto não sei o que é que está aqui a fazer”. Aquilo não foi comigo, ele não disse nada e eu entendi que não devia dizer nada, mas peguei nos livros levantei-me e saí da sala de aulas, não gostei estive quase a explodir mas acho que não o devia fazer, se o visado não o fez, porque é que eu o devia fazer. Fui para frequências, nunca mais meti os pés nas aulas, estudei por mim, fiz as frequências na primeira tive 14 valores e na segunda tive 13 valores, fiquei com uma média final de 14 valores, coisa que os meus companheiros de curso não conseguiram. Mas o que vos quero contar é que no dia em que fui ver as pautas por acaso aparece o professor aproxima-se de mim e pergunta-me, porque é que eu tinha abandonado as aulas pois eu era tão bom aluno e oportuno nas intervenções que fazia, não entendia porque é que não tinha posto mais os pés nas suas aulas, pedi-lhe para esperar um pouco, certifiquei-me que as notas daquela cadeira já estavam lançadas e a resposta não se fez esperar, sabe uma coisa que lhe digo ao fim de um dia de trabalho não tenho paciência para aturar gente mal-educada como o senhor, ele olhou para mim com espanto afirmando que não se recordava o que tinha acontecido, avivei-lhe a memória e acrescentei-lhe não foi comigo mas se fosse tinha-o mandado àquela parte, a partir daí o “rapaz” que era simultaneamente professor e critico de cinema cada vez que passava por mim era só deferências e eu nem bons dias e boas tardes.

Henrique Pratas

 

 

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