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Sob a lei dos pulhas…

06-01-2023 - Francisco Pereira

O recente episódio da “retirada dos 500 mil”, ocorrido naquele sorvedouro de dinheiros públicos que é a TAP, nada traz de novo, não estou obviamente a desvalorizar a ocorrência, quero simplesmente dizer que isto não é sequer incomum, esta pulhice a coberto da lei, sempre escudada nessa Lei, pulha, que elaborada de propósito para proteger os pulhas, efectivamente está cheia de subterfúgios e alíneas para permitir e não sancionar as pulhices, sendo além disso, muitas vezes mais imoral que os crimes que pretende alegadamente castigar, numa reviravolta absolutamente kafkiana que transforma a Lei, esta lei que temos, numa lei pulha, biltre, medíocre feita essencialmente para proteger a súcia, o povo eleito, os escolhidos, que serpenteiam pelas entrelinhas dessa lei pulha, com a mesma destreza, de salmões na urgência da desova, que ensarilham rios acima.

E tanto assim é, que numa das primeiras, e das muitas que se vão seguramente seguir em torrentes, declarações, que o quase régio oráculo presidencial achou por bem ter, foi evocar a Lei, ele, bem o sabe, porque é da área, que evocar esse nome quase mítico “A Lei”, que traz à memória colectiva do poveco sacrista quase que a evocação das tábuas que Moisés andou a arrastar pelos desertos, e todos tremem, porque “dura Lex, sed Lex”, dizem eles, mencionar a Lei sossega a populaça.

Este episódio encerra em si vários comportamentos típicos e questões mal resolvidas desta nossa “Democracia”, e coloco-a entre parêntesis porque apesar de muito boa, quando comparada mesmo com sítios tidos por democratas, ainda assim cheira um nadita a mofo salazarento, ainda traz agarrada a ela bolores, eflúvios e tiques comportamentais que facilmente encarnam o espírito de antanho, nomeadamente nos comportamentos dos politiqueiros.

A Lei pulha, é outra das questões, recordo por exemplo, o episódio em que um grupo de 7 pobres funcionários de uma empresa municipal entretanto extinta, intentam uma acção contra o município para serem ressarcidos desse despedimento e integrados nos quadros dado que os seus postos de trabalho continuavam a existir, perderam. Um outro funcionário, que recebeu indicações para prosseguir fora do grupo, intentou a mesma acção e ganhou. Por cá a pulhice legaleira permite que sobre o mesmo tema e desde que o preponente da acção seja filho de um cacique politiqueiro, dois juízes emitam acórdãos diferentes, e assim vai a pulhice, a Lei dos pulhas, que apenas serve para os proteger, os 500 mil que deram de mão beijada à outra dariam para ressarcir os 7 funcionários umas 10 vezes, mas isso que interessa, eram apenas gente humilde e pobre que viviam de ordenados de miséria a trabalhar para um município, não eram pulhas, mas a Lei dos pulhas permite tudo e o seu oposto, dependendo de quem puxa os cordelinhos das marionetas.

Há depois uma arrogância quase natural, uma arrogância de classe, algo que bem se traduz com a famosa frase, não têm pão comam brioche” como disse a cabeça estouvada da Antonieta rainha, essa arrogância de classe, faz com que os politiqueiros e demais elites, se sintam completamente à vontade para fazerem tudo o que lhes aprouver, cientes de que estão quase sempre impunes, excepto quando se torna demasiado evidente o seu desvario e caem em desgraça, nesses casos a Política age como um corpo uno e qual Cronos pune esses elementos avariados, caídos em desgraça, arrastamdo-os pela lama, mas isso é coisa recente, ainda assim o mais que temos é a impunidade. Uma vergonhosa impunidade que desfigura o país, porque cria tribos de impunes, e uma maioria de servos da gleba que silenciosa sofre nas carnes as sevícias destas tribos minoritárias de sevandijas opressores, segue impávida e calada sem ninguém que a defenda.

A imoralidade disto tudo é absolutamente obscena, e bem podem as oposições ladrar, em particular os sociais que se dizem democratas, coniventes que estão de matéria e de facto com esta desprezível realidade, porque estou em crer que o que ora se passou com aquela senhora, ter-se-á passado mais vezes, com outras gentes de outras cores, nunca tendo ninguém achado que isto é uma pulhice imoral, calados são uns grandes poetas.

Ouvi alguém questionar a ética da senhora que embolsou tão descaradamente os 500 mil e que alegadamente até terá pedido mais, nada na sua conduta me espanta, quadra aliás com o comportamento típico das “elites” medíocres que temos, de novo puxo pela memória e recordo dois vereadores, ambos funcionários públicos, logo com tudo assegurado, ambos oriundos da mesma vermelha agremiação partidária, que quando foram apeados dos seus lugares politiqueiros solicitaram o subsídio de reintegração, creio que é assim que se chamava, porque claro está, estava na Lei, a mesma Lei que a dita senhora evocou para fundamentar o recebimento dos 500 mil, ora meus caros se isto não diz logo de caras que gentalha imoral é esta, não sei que mais o fará. Vivemos infelizmente numa das mais rematadas “Pulhocracias” do Mundo, e prevejo que assim vamos continuar, habituem-se!

Um bom novo ano

Francisco Pereira

 

 

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