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25 DE ABRIL DE 1974 – UMA DATA DE EQUÍVOCOS

11-06-2021 - Pedro Pereira

O dia 25 de Abril de 1974 foi um acto de ressurreição e simultaneamente de redenção. Ressurreição, porque representou o ressurgimento da Nação portuguesa, a passagem de um longo período de trevas – das mais negras da sua História – para a luz do dia. A passagem de um sistema político totalitário para um sistema aberto, de liberdades democráticas.

Redenção, porque foi a mesma estrutura que em 28 de Maio de 1926 instaurou uma ditadura militar que abriu caminho ao Estado Novo salazarista, que acabou com o regime do qual foram progenitores: as Forças Armadas.

A passagem de um regime autocrático, fechado, proteccionista, para um regime aberto em que o povo reconquistou a voz, haveria necessariamente de causar – como causou – sérias convulsões na sociedade portuguesa, tanto mais agravadas quanto alguns importantes sectores da sociedade se sentiram do estado de orfandade em que haviam caído.

O regime era pai, porque proteccionista, mas autoritário, porque os filhos só faziam aquilo que o pai deixava ou queria que fizessem. A falta de liberdade nos seus múltiplos aspectos: censura, cerceamento das liberdades cívicas, de criação, etc., com os seus limites bem definidos, transmitiam, contraditoriamente, um forte sentimento de segurança, no sentido em que tudo se aparentava imutável. Será com a morte do pai do regime – Salazar – que irão surgir elementos perturbadores na paz podre.

O seu sucessor, Marcelo Caetano, um intelectual de uma geração mais nova, com menos pulso que o seu antecessor, não foi capaz de aguentar a nau tormentosa em que Portugal se havia tornado, agravada por uma crise económica mundial iniciada em 1973, nem tão pouco compreender ou ter tido a coragem de empreender as reformas profundas que urgiam ser feitas.

O regime estava velho, caduco, tal como os seus chefes, mas quem dava o corpo por eles, pelo regime, eram os jovens nas três frentes de combate em África. Aqueles que eram apanhados em fuga ao serviço militar obrigatório, esperava-os, quando eram apanhados pelas autoridades policiais, os campos correccionais - ou de concentração - em Elvas ou Penamacor, hoje, propositadamente (?) esquecidos. Os que logravam saltar a salvo além dos Pirenéus, escapavam a um destino mais que incerto, nebuloso. Curioso é que vários desses indivíduos recebem hoje pensões do Estado por «serviços relevantes prestados à pátria».

E a solução não se vislumbrava. Era uma luta sem brilho nem glória, tão só: triste, amarga, envergonhada. Uns quantos milhares de homens, lá por África tombaram para sempre. Muitos mais regressarem estropiados do corpo e da mente. Quantas mães sem filhos, quantas noivas por casar, quantas viúvas sem marido e quantos filhos sem pai ficaram.

De forma estranha, porque havia entrado na Primavera, o velho regime caiu de maduro, como seria natural no Outono. A rendição simbólica do regime no Quartel da G.N.R. do Carmo, em Lisboa, assemelhou-se a um acto de opereta. Cercados por uns quantos militares mal municiados, sem recruta feita, montados em velhos carros de combate datados da 2ª Grande Guerra Mundial, armados de canhões e metralhadoras obsoletos, os dignitários do regime renderam-se sem muita dignidade – diga-se de passagem - com excepção do seu chefe.

O Estado Novo caíra de podre, de velhice caduca. A maior parte dos pides recolhiam à prisão, reclamando-se de vítimas, pois se afinal até eram todos escriturários e por isso, nunca tinham perseguido nenhum cidadão!

No Ultramar, as tropas recusavam-se a combater sem objectivos. As de cá, furtavam-se a rendê-las. Depois, foi a «descolonização exemplar» que se sabe: um desastre, quer para os descolonizados, quer para os descolonizadores.

Trinta e cinco anos se passaram. Muitos daqueles a quem Salazar ou Caetano não reconheceriam competência sequer para lhes apertarem os atacadores das botas, são hoje “dignitários” do regime.

Os capitães de Abril acabaram, na sua maior parte, triturados pela engrenagem da História. Vários pides famosos, com o tempo, viram reconhecidos pelos governos democráticos, a sua destacada actividade profissional no anterior regime, enquanto o mais lídimo e puro representante dos capitães e dos ideais de Abril (Salgueiro Maia), pouco antes do seu falecimento, após solicitação ao governo da Nação, viu ser-lhe negada essa justa distinção.

Porém, um facto é certo: nada voltará a ser como antes. O Portugal de hoje não é mais o de ontem, antes é, um país atascado numa crise profunda, social, económica, política e de valores.

O Portugal de hoje, é um país com assimetrias sociais mais profundas que em 1974, em que existe uma classe de novos-ricos muito mais numerosa, e uma classe de pobres igualmente muito maior, sendo que os que se encontram no meio – a classe média - caminham a passos largos para o lugar destes últimos.

A liberdade de expressão e de escrita encontra-se a caminho dos índices de repressão que vigorava em 1974. Enquanto até essa data existia a censura prévia oficial, hoje, existem outras formas de censura, encapotadas, mais sofisticadas… em nome da democracia. Que o digamos jornalistas sérios deste país.

O golpe de Estado militar de 25 de Abril de 1974, assemelha-se, de certo modo – mau grado as comparações - ao golpe militar de 28 de Maio de 1926, porque, tal como então, o golpe militar de Abril contou com o apoio das classes intermédias e até da classe operária; operários industriais e assalariados agrícolas.

Foi um movimento eivado de equívocos e é nesse sentido que se explica que a ele tenha aderido muita gente, de boa-fé, que lenta e gradualmente nos tempos que se seguiram se irá afastar ou ser afastada da tomada do poder pelos sucessivos governos.

Porém, a História se encarregará de enaltecer os seus heróis, enquanto os nomes de todos os políticos de pacotilha e quejandos que tem pululado desde então por aí, acabarão, irremediavelmente, diluídos pelo limbo dos tempos vindouros.

Pedro Pereira

 

 

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