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ESCOLA OFICINA Nº1 – PIONEIRA NO NOVO ENSINO EM PORTUGAL

21-05-2021 - Pedro Pereira

Preconizada desde finais do séc. XIX pelo maçom Bernardino Machado 1 – 8º Presidenta da República - a chamada Escola Livre (tipo Ferrer), começará a ganhar expressão prática, consubstanciada em instituições de ensino como a Escola Oficina N°1 e outras, que irão ser gradualmente fundadas por todo o País até à década de trinta do século XX pela Maçonaria.

Em 9 de Junho de 1876, por iniciativa das Lojas maçónicas José Estevão e Sementeira, do Grande Oriente Lusitano, é assinada a ata de fundação da Sociedade Promotora deCreches, que dará início ao seu funcionamento em sede no Largo do Outeirinho da Amendoeira, na Freguesia de S. Vicente de Fora, em Lisboa.

Presentes na sua inauguração, dezoito crianças, que, entretanto, haviam sido admitidas, bem assim como o rei D. Luís, a rainha D. Maria Pia, e o ministro do Reino, Rodrigues Sampaio entre outras individualidades.

Em 1877 inicia-se a construção do edifício do Largo da Graça, em terreno cedido pela Câmara Municipal de Lisboa, da qual era presidente, José Gregório da Rosa Araújo, um dos fundadores da Sociedade Promotorade Creches. O projeto foi elaborado e oferecido por Domingos Parente da Silva,igualmente membro fundador.

Concluída a sua construção em 1878 e transferidos os serviços da primeira creche, passou a denominar-se Creche de Stª Eulália, em homenagem à mãe de Rosa Araújo. Em 1903 teve de encerrar devido a dificuldades económicas, pelo que o imóvel foi alugado à Provedoria do Asilo Municipal.

Em 26 de Abril de 1904, em Assembleia-Geral são aprovados os novos estatutos, alterando a designação de Sociedade Promotora de Creches para Sociedade Promotora de Asilos, Creches e Escolas.

Assim, no dia 1 de Janeiro de 1905 foram inauguradas as instalações da Escola-Oficina Nº1, na rua de S. João da Praça, 83-2°, com quatro alunos, que juntamente com os fundadores subscrevem a ata de fundação.

Em 1906 a Escola Oficina transfere as suas instalações para o Largo da Graça n°58, onde se encontra atualmente.

A sua frequência era gratuita, e os custos eram suportados pelo G . O .L. , através das suas Lojas.

Nascida à sombra das relações entre o movimento operário português de expressão anarco-sindicalista e a educação, com base nas práticas educativas libertárias do princípio do século XX em Portugal, a partir do conhecimento de experiências pedagógicas inovadoras além-fronteiras, nomeadamente daquelas que decorriam na Europa e na América, a Escola-Oficina Nº1 irá dar corpo ao chamado modelo educativo libertário, tendo como pano de fundo a Educação Nova, que dava realce ao papel da liberdade da criança em situação educativa, ultrapassando o decadente modelo de ensino oficial saído do período da Industrialização.

Apoiando-se, segundo um projeto pedagógico aproximado ao ideal da escola consciencializada pelos anarco-sindicalistas e livres-pensadores da época, a Escola-Oficina Nº1 irá assumir-se em Portugal como pioneira de uma nova conceção de ensino, que procurava aliar o ensino manual ao ensino moral.

Dois traços fundamentais realçam deste projeto:

a ) O carácter integral da educação assente na negação da dualidade ensino profissional, ensino clássico, procurando, antes, a sua fusão.

b ) Liberdade e não constrangimento das crianças, única forma (segundo os pedagogos mais avançados da época) de conseguir a formação de homens livres e responsáveis.

De acordo com Manuel Roque de Azevedo: (...) a criança era deixada completamente à vontade. Não existia o terror do mestre, o decorar do livro, ou a estúpida emulação. Os alunos davam frequentes passeios fora da escola, para contacto com a natureza (…) 2.

Em 1910, o Governo Provisório da República reconhecia e louvava publicamente os «(...) valiosos serviços prestados ao progresso do ensino e da educação em Portugal (...)», desta instituição 3.

Para além do mais, sem dúvida que uma plêiade de bons professores contribuiu para o elevado nível alcançado pela Escola nos primeiros anos. De entre eles, será justo realçar Luís da Matta, Adolfo Lima, António Lima, e José Carlos de Sousa.

É neste sentido que, ligada à criação e existência da Escola Oficina, podemos encontrar muitos nomes ligados expressamente ao Livre-Pensamento e aos novos modelos de ensino de além-fronteiras, caso de César Porto e António Lima, membros, juntamente com Magalhães Lima, Delfim Guimarães e António Francisco dos Santos, da Liga da Educação Racional, que tinha como órgão de informação A Escola Nova.

Já os anarquistas, muito embora não tivessem ligação à Maçonaria, cooperavam com esta Obediência em ações pontuais e organizações para-maçónicas, como no caso da Escola Oficina, em que desempenharam um papel de relevo no que reporta ao corpo docente, o que, aliás, não será de estranhar, dada a sua ligação privilegiada ao corpo discente, uma vez que a maioria dos alunos provinha de famílias operárias. No entanto, a uma dada altura começou a verificar-se que a origem social das alunas provinha, quase na generalidade da classe média, de pais ligados ao comércio e serviços e, na sua maior parte, residentes fora dos bairros de Alfama e da Graça, porém, todas de Lisboa.

A prática de ensino inspirada no modelo Ferrer será o fundamento, a base «ideológica» do ensino ministrado na Escola Oficina. Tipo de educação integral e abrangente de todas as faculdades do homem, a processar-se de uma forma simultânea, propiciando a constituição de um homem livre, autónomo, independente e solidário.

Muito embora a Escola Oficina fosse «propriedade» da Maçonaria, a verdade, porém, é que parte importante do seu corpo docente encontrava-se ligado – como já referido - ao anarco-sindicalismo, por quem os dirigentes republicanos nunca morreram de amores, antes, combateram-nos sistematicamente. Não é de estranhar portanto, que a Escola fosse visitada periodicamente pelos inspetores escolares, conforme podemos ler nas suas atas, sem no entanto haver qualquer menção de registo especial.

A Educação Nova centrava-se na criança, ao contrário da educação tradicional em que a mesma tinha o professor como modelo.

De entre os alunos que passaram pela Escola Oficina e dos que mais se evidenciaram na sociedade, é de referir os nomes de Leopoldo de Almeida, escultor; Manuel Mendes, escritor; José Tagarro, pintor; Francisco Mendes, matemático; Gonçalves Simões e António Castro Rodrigues, professores de música e, Manuel de Oliveira, professor de Corografia do Conservatório Nacional.

A Escola Oficina N°1 conheceu um período brilhante desde a sua fundação até 1926, iniciando-se a partir daí a sua decadência. Depois do golpe de estado militar em 28 de Maio desse ano, esta Escola, que recebia um subsídio oficial por ter sido considerada de utilidade pública pelo Governo Provisório da República, viu cortada essa subvenção, ao mesmo tempo que começaram a escassear os auxílios. Acresce, que outras limitações lhe foram impostas, tal como a proibição da coeducação dos sexos, regime em que a Escola funcionava desde 1913. Por outro lado, a falta de perspetivas pedagógico-sociais, fenómeno aliás, extensivo nesse período aos países onde o modelo de Educação Nova se havia implantado, irá «transfigurar» a Escola, transformando-a, com o decorrer dos anos, numa pálida imagem do que havia sido e para o fim que tinha sido criada.

NOTAS

1. Bernardino Machado nasceu no Rio de Janeiro – Brasil, em 28/03/1851 e faleceu no Porto em 29/04/1944. Foi iniciado em 1874 na loja Perseverança, nº 74, de Coimbra, com o nome simbólico de Littré. Atingiu o Grau 7º do RF e 33º do REAA. Foi Presidente do Conselho da Ordem, Grão-Mestre do GOL e SGCSCG do Grau 33º. Pertenceu ainda, aos quadros das lojas: Razão Triunfante (Lisboa), Fernandes Tomás (Figueira da Foz) e Elias Garcia (Lisboa).

2. Azevedo, Manuel Roque, Breve História da Escola Oficina Nº1 e da Sociedade que a Mantém, Separata de Estudos de História de Portugal, vol. II, sécs. XVI/XX, Homenagem a A. H. de Oliveira Marques, Ed. Estampa, Lisboa, 1983.

3. «Pelo que manda o governo provisório da República Portuguesa, pelo Ministro do Interior, que aquela Sociedade seja publicamente louvada pelos seus valiosos serviços prestados ao progresso do ensino e da educação em Portugal». In Diário do Governo, de 31 de Dezembro de 1892.

Pedro Pereira

 

 

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