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Sem vacina à vista, assim vai a nossa Arqueologia…

15-01-2021 - Cândido Ferreira

- A presente pandemia, ao agravar a crise financeira e ao restringir o tráfego internacional, realçou uma evidência que há muito venho denunciando: o património arqueológico lusíada, em prejuízo da ciência histórica e da nossa identidade cultural, continua à mercê de oportunistas e pilha-galinhas…

Alguns dos segredos mais excitantes que a vida me revelou, resultaram de incursões pela “grande floresta da arqueologia”, um recanto de evasão. Nessas longas “caminhadas”, que me abriram a um conhecimento mais profundo sobre o desenvolvimento humano, tive a felicidade de apreciar, e em certos casos até de poder preservar, inúmeras raridades de quase todas as civilizações e épocas.

No rescaldo dessas “aquisições”, que agora procuro distribuir por museus, uma certeza assentei: dotado de um clima privilegiado e de um confinamento imposto pelo oceano, sem espécies concorrentes fortes e com uma orografia que permitiu bons abrigos, o território que habitamos facilitou suaves povoamentos que deixaram marcas geniais. Sem dúvida, Portugal é dos países mais ricos em achados arqueológicos.

Mas como pode um simples “curioso” sugerir tal opinião se, desde há décadas, não aparecem artefactos com interesse e se os nossos museus apenas se enchem de cacos? Há quantos anos não aparece ouro, por exemplo?

A resposta a esta magna questão vai sempre “bater no mesmo ceguinho”. Com uma Jurisprudência assente em leis que “protegem ferozmente o interesse público”, a nossa Justiça, quando funciona, quase sempre sacrifica o justo e protege o pecador. E é assim que até o património à guarda de importantes instituições se volatiliza, ainda de forma mais segura do que em Palmira ou Bagdad. Será preciso recordar exemplos?

A explicação para esta “anomalia” é muito simples. A nossa legislação foi plasmada da lei francesa, onde qualquer novo “tesouro arqueológico” é pertença do Estado. Um quadro legal que os franceses contornaram habilmente porque, desde aí, a Bélgica passou a ser sede oficial de quase todos os achados relevantes. Já no nosso país, com a obrigação de se suspenderem imediatamente demolições ou escavações, restam duas “safas” a quem tiver o “azar” de topar qualquer “coisinha”: ou cala o bico e arrasa tudo; ou, dentro do velho princípio de que o segredo é a alma do negócio, procura retirar algum provento nas redes de tráfico dirigidas sobretudo para a vizinha Espanha.

Mas há ainda mais e ainda pior. A par da “garimpagem privada” que, tal como a prostituição, só em teoria é combatida, o “negócio” depressa alastrou ao setor público onde se desenvolveu uma cultura de pilhagem a que raros investigadores escapam.

Passo a explicar, até por ser uma “praia” que frequento há dezenas de anos. As investigações arqueológicas, ancestralmente entregues a estudantes em férias sob a égide de académicos credíveis e interessados, passou, entretanto, a ser pasto de dezenas de “empresas privadas” a quem o Estado contratualiza os serviços de exploração. Sociedades controladas na maioria por agentes do Estado envolvidos no processo, não espanta a garantia de negócios lucrativos: se nada aparece de relevante, a “empreitada” é a “despachar”; se surgem “peças boas”, sacam-se pela calada da noite e ainda voam mais alto do que no Egipto, no século XIX; e se aparecem cacos tudo bem, pois assim se reforçam ajudas de custo e currículos e se alimenta a indústria de restauros que também tem direito à vida.

Há muito procurado para emitir pareceres técnicos sobre peças antigas, e vítima como os demais portugueses de confinamento físico, em 2020 fui surpreendido pela mostragem de peças que, na posse de privados, não conseguiram “passaporte” fácil para sair de Portugal. Desde sempre interessado em promover a defesa do nosso património e cultura, e com muito tempo livre, entre outras preciosidades que me foram presentes dei-me ao cuidado de, recentemente, destacar uma coleção que integra milhares de peças do Paleolítico e que será uma das mais importantes “jazidas” extraída numa só “estação”, em todo o mundo.

Resgatada, há décadas, por um amador, sob a ameaça constante da burocracia e da “ciência oficial”, que neste caso optaram por privilegiar uma abusiva extração de areias, nunca a “autópsia” ao local foi promovida. E, no entanto, pela morfologia e composição dos artefactos, tudo ali aponta para que o povoamento da Europa se tenha iniciado há centenas de milhares de anos e pelo Estreito de Gibraltar.

Há cerca de dois meses, quando anunciei este “achado” em crónica que mereceu várias publicações e milhares de visualizações, acrescentei ser essa também a tese adiantada por novos autores que, com base em estudos genéticos, sugeriam que os nossos primitivos seriam berberes e não caucasianos. Para minha surpresa, dias depois, também a revista “Super Interessante” avançava com a mesma tese, baseada num extenso artigo de um reputado autor espanhol fundamentado em provas arqueológicas bem menos consistentes do que as que Portugal dispõe.

Tendo, desde sempre, os legítimos proprietários deste “resgate” manifestado firme vontade em o disponibilizar aos “estudiosos” de carreira, quando divulguei a sua existência acreditei, ingenuamente, que em breve seria contatado por alguém. No entanto, apesar das explícitas fotos que acompanhavam o texto “Adão e Eva”, nunca tal veio a acontecer. Inconformado, resolvi então informar alguns investigadores nacionais, na berra, da existência desta coleção. No entanto, espantosamente ou talvez não, nenhum respondeu a uma comunicação que certamente fará as delícias de qualquer Instituto Europeu da especialidade.

Um verdadeiro sarilho se tal vier a acontecer, comprovando uma pandemia negada por todos os interesses dominantes, em Portugal. Como tudo indicia, refiro-me ao “vírus da corrupção” contra a qual parece não haver vacina disponível nos próximos anos.

CÂNDIDO FERREIRA – Cidadão

 

 

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