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A Ana era uma miúda cheia de vida…

17-07-2020 - Francisco Pereira

A Ana gostava de jogar basquetebol, gostava de andar de bicicleta, dizem que era uma excelente miúda com um futuro promissor como quase todos os miúdos têm aos 16 anos, infelizmente, enquanto cruzava uma passadeira para peões a Ana foi atropelada por outro miúdo apenas 3 anos mais velho do que ela, que não respeitou um semáforo vermelho, a Ana morreu.

Trago hoje este episódio recente, porque o mesmo resume uma grande tragédia deste país, a saber, a falência do Estado, a falência moral desta nossa sociedade que deixou de conseguir formar cidadãos. Casos como este avolumam-se, casos em que a morte surpreende as pessoas como consequência imediata da irresponsabilidade de gente miseravelmente egoísta, impressionantemente desprovida de valores e criminosamente impune.

Porque o caso da Ana, é paradigmático não só da falência moral de Portugal enquanto país, mas também da senda de impunidade que há décadas vimos trilhando, que por ora vai ocasionando apenas pontuais eventos terríveis mas que a mais lato trecho trará indubitavelmente a catástrofe.

Já o disse várias vezes, mas vou repetir, a impunidade está a fazer perigar a nossa sociedade, a tragédia que se abateu sobre a Ana e sobre o seu homicida que no fundo não passa de um miúdo pateta, produto desta mesma sociedade que ao invés de apenas culpa-lo sem mais aquela, sem prejuízo de o dever punir exemplarmente, deveria isso sim perceber o que nos está a acontecer, que fenómeno social é este que faz com que cada vez mais apareçam “miúdos” como este, gente egoísta, extremamente narcisista, intolerantes à frustração, incapazes de respeitar a Autoridade, socialmente inábeis e pior que isso, demonstrando uma tormentosa falta de empatia para com o sofrimento do outro que roçará a psicopatia pura.

E, não faltam, para nossa grande tristeza, episódios, na sua essência, semelhantes aos do atropelamento da Ana, em que por qualquer razão imbecil, miúdos matam ou cometem outro tipo de crimes mais ou menos hediondos, por futilidade, matam sem remorso, sem empatia, cientes da impunidade que os espera, dos regimes especiais, dos tribunais favoráveis, sempre ao criminoso e nunca preocupados com as vítimas, de toda uma sociedade eivada de impunidade que regida pelos exemplos dos poderosos da Nação vai intuindo que também eles a arraia miúda da sociedade pode ser tão impune como os senhores do poder, desde os bancos da escola que os miúdos assistem a isso, ao fulano que faz trinta por uma linha a quem nada acontece porque é daquela etnia ou da outra, ou porque é filho de alguém importante, desde os bancos da escola que os miúdos percebem essa impunidade que também querem para si, e vão por isso tentando, como sói dizer-se vão esticando a corda, depressa percebendo que sim que essa impunidade também os contempla, que está ali mesmo ao seu alcance bastando para isso esticarem a mão, para a adrenalina correr, são jovens e é isso que farão, o drama é que depressa serão adultos e vão continuar a acreditar que a impunidade é a regra, daí resultando que caminhamos seguramente para um desastre.

E é tal a impunidade que quase diariamente vemos notícias de gentalha que se dedica a questionar as polícias, que apedreja as polícias, que maltrata bombeiros, professores, médicos, enfermeiros e mais que se queira, gente que se sabe impune, gente criada na impunidade que jamais perceberá que para conseguirmos viver em sociedade temos primeiro de respeitar o outro, para que ele também nos respeite e temos todos em conjunto de zelar pela nossa sociedade, onde cabem todos, de todos os credos e cores e onde ninguém é mais que ninguém, é utópico, já vos oiço a clamar, és um sonhador, quase consigo ver o vosso sardónico sorriso céptico, mas a Ana morreu, atropelada numa passadeira por um miúdo que não respeitou um semáforo vermelho, um miúdo ao qual nós falhámos enquanto sociedade porque não soubemos incutir-lhe os saudáveis valores do respeito pela vida e pelas regras, um miúdo que fomos deixando crescer impune, a quem permitimos que ande armado, porque senhoras e senhores um automóvel é uma arma e tal facto deveria significar especial cuidado.

Infelizmente num país onde existe um culto dos veículos, onde a doença dos carros afecta tanta gente, era de esperar que a obtenção de uma habilitação para condução de veículos obedecesse a estritas regras, a avaliações psicológicas rigorosas, mas não, o vulgo “tirar a carta” é apenas uma farsa, mais uma, uma vulgar negociata camuflada de seriedade, como bem demonstram os muitos que circulam sem a tal “carta”, os muitos analfabetos e ou semi analfabetos a quem deram uma “carta de condução”, bem como os muitos outros que conduzem qual energúmenos, pergunto-me como é possível manter tal barbaridade, achando que tudo isto é normal.

Simples é porém a resposta, impunidade, uma imoral e obscena impunidade que castra a decência, que obvia a responsabilidade que reduz a cacos a empatia e o respeito pelos outros, mas a Ana morreu, aos 16 anos, quase uma menina, atropelada numa passadeira por um miúdo que a não respeitou nem ao semáforo vermelho e disso amanhã já ninguém se lembrará até à próxima, Ana, ou Maria, ou Manuel ou João que morram devido à impunidade de outro miúdo, impune, irresponsável e psicopata a quem nós permitimos que conduza máquinas, gente com comportamentos psicopáticos e homicidas que nunca foi ensinada a ter respeito, e é também disso que se trata, falta de respeito, miserável laxismo de uma sociedade que não sabe educar, mas a Ana morreu, aos 16 anos, quase uma menina por quê...

P.S. Sentidas condolências à família.

Francisco Pereira

 

 

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