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Notícias e Opinião do Concelho de Almeirim de Portugal e do Mundo
 

EPIDEMIAS E PANDEMIAS DO SÉCULO XX QUE ATACARAM PORTUGAL

03-04-2020 - Pedro Pereira

1ª parte
Desde os inícios do século XX, foram registadas tão só quatro pandemias, sendo que as lições do passado são um contributo extremamente importante para ajudar os cientistas a evitar que o coronavírus crie uma quinta vaga de mortes a nível mundial

A GRIPE PNEUMÓNICA OU GRIPE ESPANHOLA

Ainda hoje os historiadores não estão de acordo quanto aos motivos que terão levado a chamar-se de“espanhola” a esta gripe. Uma das razões pode ter a ver com o facto de não existir censura em Espanha nessa altura, país que se manteve neutraldurante a I Grande Guerra Mundial, o que permitiu à imprensa informar os seus leitores livremente desde o início da epidemia,nomeadamente quanto aos civis que nesse país adoeciam e morriam com a doença em números alarmantes. Talvez ainda porque o rei Afonso XIII foi uma das vítimas. A verdade é que “espanhola” nada nos diz quanto à proveniência geográfica do vírus que, em 1918, infectou principalmente jovens adultos. Foi uma pandemia do vírus influenza A de subtipo H1N1, que se espalhou rapidamente por quase todo o mundo.

No caso de Portugal, onde a epidemia chegou em Maio de 1918, só nos primeiros seis meses provocou 60.474 mortes. Passadas décadas, a teoria de que este H1N1 teve origem na China ganhou forma em 1993, com os estudos de Claude Hannoun, a maior autoridade mundial na gripe de 1918, do Instituto Pasteur, e depois complementados em 2014 com os artigos do historiador Mark Humphries, com base na mobilização de 96 mil chineses para a I Guerra, alguns deles portadores da doença, que foram depois contagiar outros militares de outros países.

A primeira observação desta doença foi verificada em Fort RileyKansasEstados Unidos, em 4 de Março de 1918,e em QueensNova Iorque em 11 de Março do mesmo ano.

Os primeiros casos de que há notícias da gripe na Europa, verificaram-se em Abril de 1918,  com tropas americanas,britânicas e francesas,  acantonadas nos portos de embarque de França durante a Primeira Guerra Mundial. Uma gripe cujo vírus foi 30 vezes mais letal do que qualquer outro até então.Em Maio, a gripe alcançou a GréciaPortugal e Espanha. Em Junho, a Dinamarca e a Noruega. Em Agosto, os Países Baixos e a Suécia. Todos os exércitos que se encontravam na Europa  foram gravemente afectados pela doença, calculando-se que cerca de 80% das mortes da armada dos Estados Unidos ficaram a dever-se à gripe.

Em Portugal, a maior parte das mortes ocorreram nos meses de Outubro e Novembro de 1918, na sequência da segunda vaga da gripe, queteve início em Agosto desse ano. A primeira vaga iniciada em Maio, havia sido relativamente benigna. Tal como havia de ser a terceira vaga, em Abril e Maio de 1919.

O vírus teria entrado por terra, portado por trabalhadores agrícolas regressados de Espanha onde se deslocavam todos os anos por essa altura para a ceifa nas vastas herdades da Andaluzia e Estremadura, onde a doença havia já sido declarada, em finais de Maio de 1918. Os primeiros casos foram diagnosticados em Vila Viçosa, sendo de crer que o contágio tenha partido de focos em Badajoz e Olivença.

Em 28 de Maio, o Director-Geral da Saúde, Ricardo Jorge, havia feito publicar nos jornais uma nota, onde recomendava:“lavar as vias respiratórias com água salgada ou água oxigenada diluída; manter a higiene interna e externa; tomar ar livre e ventilar habitações”.E quando alguém era atacado pela doença, recomendava como atitude a tomar pelo doente, cama, dieta, gargarejos mentolados ou salgados, tisanas e médico.

No decorrer do Verão a actuação das autoridades sanitárias foi quase nula. Só quando da segunda vagasurgiram as primeiras instruções oficiais, a criação de um sistema de informação, organização dos hospitais e o recurso a todos os médicos disponíveis, incluindo militares e aposentados.

Em 4 de Outubro saiu um decreto proibindo a saída do País, quer pelas fronteiras terrestresquer por via marítima de todas as “drogas medicamentosas”,na tentativa de colmatar a penúria de recursos e a rápida progressão da doença.

Em Lisboa foram reativadas unidades hospitalares que se encontravam fora de serviço, caso de Arroiose procedeu-se à transformação de modernos estabelecimentos públicos, caso do Liceu Camões, em grandes hospitais, ao mesmo tempo que afluíam ao Hospital Militar de Campolide soldados de províncias como Trás-os-Montes, focos de contágio, quando a hospitalização se destinava também ao isolamento.

Encontrava-se no poder Sidónio Pais, tendo o respectivo parlamento votado a 7 de Novembro o seu encerramento até ao dia 3 de Dezembro.

Entretanto, quanto a transportes públicos, os eléctricos continuaram a circular e as estações de caminhos-de-ferro só encerraram dada a enorme quantidadede funcionários que haviam adoecido.

Para a peste não havia vacina,nem tão pouco antivirais. As medidas recomendadas por Ricardo Jorge não conseguiam substituir os medicamentos inexistentes.

Aos pastores e videntesJacinta e Francisco de nada lhes valeu terem testemunhado as aparições da Nª Senhora na Cova da Iria, dado que a pneumónica não os poupou poucos meses após esse evento. Nem tão pouco uma série de portentosos artistas, sendo que alguns deles vierama ser famosos em todo o mundo, como o pintor Amadeo de Souza-Cardoso ou o pianista António Fragoso, ambos jovens mas com uma carreira bastante auspiciosa e já com obra feita, que se encontravam na idade "preferida" da também chamada gripe “espanhola”.

A pandemia correu com tal velocidade no país, resultando na falta de caixões suficientes para os funerais, tendo como resultado as famílias comprarem-nos por antecipação e guardarem-no debaixo das camas o que ocasionava que muitas famílias os comprassem por antecipação e guardassem debaixo das camas onde os seus membros se encontravam nos estertores da doença.

A 4 de outubro de 1918, sobre a pneumónica, o jornal “A Luta” publicava a seguinte local: "Pode dizer-se que já alastrou por todo o país, e em Lisboa grassa com intensidade. Mandou o governo que não prosseguissem os exames nos liceus e que todos os estabelecimentos de ensino não funcionem até nova ordem. É certo que os teatros e os animatógrafos continuam abertos, e aí a multidão, para efeitos de contágio, é mais perigosa do que nas escolas. Divergem as opiniões quanto à natureza da doença..."

De acordo com as estatísticas oficiais, em Portugal verificou-se uma elevadíssima taxa de mortalidade, com duas ondas epidémicas, que terão causado cerca de 120.000 óbitos.No entanto, é muito provável que esse número tenha alcançado o dobro.

Em todo o mundo matou à volta de 100 milhões de pessoas (cerca de 5% da população mundial), foi até hoje, a pandemia mais letal da história da humanidade, tendo morto mais pessoas nesses anos de guerra que decorrentes da mesma, que foram 8 milhões em quatro anos.

Pedro Pereira

1ª parte

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Continua na proxima edição

 

 

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