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Costas Lapavitsas. “A zona euro não opera de momento como um sistema baseado em regras”

29-05-2020 - Filipe Teles

Para combater a crise económica provocada pela pandemia, os países da periferia devem agir como se o euro não existisse. “Não têm alternativa”, defende Costas Lapavitsas, crítico do euro e do modelo de funcionamento da União Europeia, que chegou a ser eleito deputado pelo Syriza. Atualmente é professor de Economia na School of African and Oriental Studies da Universidade de Londres.

Com a crise pandémica, muitos académicos, jornalistas e outros têm argumentado que o Estado está de volta. Não esteve sempre cá?

Claro. O Estado nunca desapareceu. Foi sempre uma ficção pensar que vivíamos num período de declínio do Estado-nação, que o Estado-nação era irrelevante, insignificante, e o que importava era, presumivelmente, o mercado global, as empresas privadas, o capital internacional, as multinacionais. Tudo isso foi fortemente ideológico. Nunca teve muita validade: o Estado esteve sempre presente. O seu poder foi sempre o dinheiro primeiro – na nação que o cria e controla –, através da banca, da banca central em particular. O que vemos agora, todavia, com a pandemia, é um salto qualitativo. O poder do Estado-nação moderno é espantoso – acho que nunca foi tão poderoso em qualquer outra altura da História –: essencialmente, o Estado-nação encerrou a economia mundial nos últimos dois meses. Nunca houve um evento deste género na história do capitalismo ou anterior a este. O Estado-nação é tão fenomenalmente poderoso que não só parou a economia global como agora assume o poder de a retomar. Se o Estado-nação não intervir ativamente para reiniciar a economia, então vamos entrar num longo período de contração económica dramática. Para responder à sua pergunta, sim, o Estado sempre cá esteve. Mas a pandemia clarificou uma mudança qualitativa na sua importância. E vai ser assim nos próximos anos, penso.

Recentemente vimos Christine Lagarde ignorar a deliberação do Tribunal Constitucional alemão. O economista e sociólogo alemão Wolfgang Streeck diz que o BCE é o banco central mais independente do mundo. Concorda?

Acho que não. Normalmente, quando as pessoas falam da independência do BCE, o que querem dizer é que o BCE irá emergir como uma força e será um ator que irá agir independentemente dos Estados-nação. O que se está a passar é o contrário: os Estados-nação é que estão a gerir tudo desde que emergiu a crise pandémica. É notável a reafirmação dos Estados-nação. Sem qualquer sombra de dúvida, são os Estados-nação na Europa que estão a tentar lidar com a crise da melhor forma que podem. O BCE é simplesmente uma espécie de protetor orçamental, um fornecedor comum de liquidez para permitir aos Estados fazerem o que puderem e fingirem que a união monetária ainda é um sistema baseado em regras acordadas entre eles. Portanto, não é de todo o que as pessoas querem dizer quando falam sobre a independência do BCE. Na realidade, o que se está a passar é a asserção dos Estados, e o BCE, presentemente, é ainda menos importante do que antes – ou seja, na capacidade de impor a sua vontade sobre os Estados.

Acha que as eurobonds fazem parte da solução para a crise?

Bem, a primeira a coisa a reconhecer é que a união monetária é, na realidade, um problema para a Europa. Está a impedir a Europa de ter uma estratégia comum e está a criar um problema extra para os Estados-nação europeus: seja o que for que tenham de fazer para lidar com a pandemia, também têm de tomar ações para salvar o euro. Por outras palavras, em vez de estar a ajudá-los, o euro é uma preocupação extra. É como se a Europa tivesse criado para si uma bomba com reação em cadeia. Para responder à crise, primeiro de tudo, tem de haver uma intervenção no lado da procura. Temos o colapso da procura devido às medidas tomadas para lidar com a pandemia, o primeiro efeito. Mas, claro, o efeito secundário é o desemprego.

Crise no desemprego destrói rendimentos – o que já estava a acontecer –, e isso destrói a procura. Deve haver, assim, uma intervenção pública no lado da procura. E eu não vejo outra forma de lidar com isto eficazmente sem se introduzir alguma forma de rendimento básico. Acho que o tempo chegou. Não concordo necessariamente com sugestões anteriores, mas não acho que possa ser evitado: é necessária uma qualquer versão de rendimento básico para apoiar a procura.

Fonte: Jornal i

 

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