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Globalizar a revolução da IA nos cuidados de saúde

13-03-2020 - Dominik Ruettinger

Estamos a entrar num período de transformação na ciência médica, à medida que as técnicas tradicionais de investigação se juntam ao enorme poder computacional e a uma riqueza de novos dados. Recentemente, a Google anunciou que desenvolveu um sistema de inteligência artificial (IA) capaz de superar os radiologistas humanos na detecção de cancro de mama. E esse é apenas o exemplo mais recente de como a aprendizagem automática e os grandes volumes de dados estão a conduzir a novos diagnósticos, tratamentos e descobertas médicas. Contudo, para atingir o enorme potencial da IA, temos de desenvolver uma estratégia pragmática e globalmente aceite para governar a recolha e a utilização de “dados do mundo real”.

Os dados do mundo real incluem qualquer informação que possa ajudar a orientar novas investigações médicas. Alguma dessa informação já existe há bastante tempo. Por exemplo, os investigadores em oncologia há muito que utilizam registos anónimos de saúde para seleccionarem pacientes candidatos que têm maior probabilidade de reagir bem a tratamentos novos e experimentais. Mas outros tipos de dados foram apenas disponibilizados recentemente, juntamente com a tecnologia para analisá-los em escala.

Os novos recursos oferecidos pela IA e pelas respectivas tecnologias levantam questões complicadas, às vezes controversas, sobre privacidade e propriedade de dados. Mas podemos enfrentar esses desafios ao estabelecer-se regras abrangentes para proteger as informações pessoais. Os governantes em todo o mundo e dentro das instituições de governação global não se devem atrasar. Os grandes líderes da ciência médica já estão a avançar com iniciativas de dados do mundo real nos Estados Unidos, onde a ampla disponibilidade de dados anónimos dos pacientes está a alimentar uma nova onda de inovação.

O Instituto Nacional do Cancro, por exemplo, está a preparar-se para lançar a Childhood Cancer Data Initiative, um ambicioso projecto de dez anos que reunirá dados de todos os pacientes infantis e jovens adultos com cancro no país para encontrar novas metas e mecanismos de tratamento. Da mesma forma, a Fundação Susan G. Komen já lançou a sua iniciativa Big Data for Breast Cancer (BD4BC), que inclui um projecto que utiliza análise algorítmica para tentar obter informação sobre os processos biológicos em alguns dos cancros de mama mais difíceis de tratar.

No entanto, como essas iniciativas utilizam dados recolhidos estritamente de populações de pacientes nos EUA, a sua aplicabilidade é limitada, principalmente a nível global. A biologia humana varia consideravelmente dentro e entre populações, devido em parte a diferenças genéticas que são influenciadas por factores ambientais e outras tendências a longo prazo, tais como isolamento, migração, peso histórico de doenças e semelhantes. A anemia de células falciformes, as doenças genéticas na população judaica ashkenazi e a fibrose cística são apenas três exemplos de muitas doenças com correlações específicas entre as populações.

Estas variações na fisiologia individual significam que o que funciona para um subgrupo pode não funcionar tão bem para outro e que devemos lançar a rede para os dados do mundo real o mais extensamente possível. No entanto, a Europa ficou para trás, em relação aos EUA, em tornar os dados anónimos do mundo real disponíveis em larga escala.

Esta falha tem origem, em parte, nas preocupações compreensíveis sobre a privacidade do paciente e a propriedade dos dados. Para abordar estas preocupações, temos de tomar todas as precauções para nos proteger contra o uso indevido de dados, estabelecendo regras que sejam verdadeiramente globais em matéria de alcance. As autoridades de saúde precisam de padronizar as orientações sobre a recolha e a utilização de dados do mundo real, além de estabelecer padrões internacionais para a partilha de investigações genómicas. Para esse fim, as empresas farmacêuticas e outras partes interessadas importantes no sector de saúde estão a trabalhar com reguladores da UE, a agência reguladora dos EUA Food and Drug Administration e outras autoridades de saúde em todo o mundo para determinarem como é que os investigadores podem utilizar os dados com segurança e manter, ao mesmo tempo, os valores essenciais de privacidade do paciente e responsabilidade do prestador.

Avanços recentes na investigação médica apresentam uma sugestão tentadora do que é possível realizar, se conseguirmos acertar na combinação de políticas. Desde que adquiriram um banco de dados com dados anónimos para 2,2 milhões de pacientes com cancro, os investigadores da Roche desenvolveram um sistema de pontuação prognóstica para prever como é que os pacientes reagiriam a diferentes opções de tratamento do cancro, com base em vários factores. Outra iniciativa permite-nos prever prováveis reacções adversas aos tratamentos de imunoterapia entre pacientes com doenças auto-imunes. Esse é um desenvolvimento notável no terreno, dado que os pacientes que sofrem essas reacções representam uma pequena percentagem de indivíduos em ensaios clínicos de novos tratamentos.

Ao implementarmos novas tecnologias e ao acedermos aos maiores bancos de dados genómicos de cancro do mundo, podemos acelerar o desenvolvimento de tratamentos personalizados e satisfazer as necessidades individuais de pessoas com doenças com risco de vida. Mas, juntamente com a sua grande promessa, os dados do mundo real levantam questões complicadas sobre como partilhamos dados pessoais. Virar simplesmente as costas a essas questões não é realista nem responsável, pois isso significaria renunciar talvez os maiores avanços na história da medicina.

DOMINIK RUETTINGER

Dominik Ruettinger é Chefe Global de Oncologia de Desenvolvimento Clínico Precoce da Roche.

 

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