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Evitar que as crianças tenham crianças

25-01-2019 - Patricee Douglas

O meu país está sobrecarregado com gravidezes de adolescentes. Em 2013, o Fundo das Nações Unidas para a População estimou que a Guiana tinha a segunda taxa mais elevada de gravidez na adolescência na América do Sul e Caraíbas, com 97 em cada 1000 raparigas com idades entre os 15 e os 19 anos a dar à luz. Cinco anos depois, pouca coisa mudou.

Hoje, cerca de 42% dos jovens guianenses são sexualmente ativos, 29% não usam preservativo durante o ato sexual, apenas 15% dizem estar familiarizados com métodos contracetivos e 56% dos jovens sexualmente ativos contraíram uma infeção sexualmente transmissível. Além disso, 12% das raparigas guianenses têm relações sexuais antes dos 15 anos e 62% dizem ter uma necessidade de contracetivos que não é atendida.

Quando os adolescentes não podem adquirir preservativos e outras formas de controlo de natalidade, a taxa de gravidezes não planeadas aumenta, os resultados em matéria de saúde deterioram-se e os jovens não conseguem alcançar todas as suas potencialidades. Para evitar essas tendências e revertê-las onde elas existem, os países devem fortalecer os seus sistemas de saúde e garantir que todos os adolescentes têm acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva.

Um dos maiores obstáculos à redução da taxa de gravidezes não planeadas é a falta de educação sexual nas escolas. Na Guiana, o programa governamental Health and Family Life Education destinava-se a colmatar essa lacuna. Mas apenas uma mão-cheia de escolas secundárias apresentam o programa e as que apresentam, normalmente evitam tópicos que contradigam a política de abstinência do Ministério da Educação. Consequentemente, a maioria dos professores não consegue dar uma educação adequada sobre sexo seguro.

Outro desafio que existe na Guiana é a diferença que há em termos de serviços, entre as regiões do litoral e as do interior. O interior do país sofre de falta de instalações de saúde, o que limita mais o acesso dos adolescentes à informação sobre sexo seguro, contraceção e cuidados neonatais. Não surpreende que as percentagens de gravidezes na adolescência e de mortalidade maternal sejam mais elevadas no interior.

A escassez de clínicas rurais reflete, em parte, uma carência de trabalhadores qualificados em cuidados de saúde. Para manter os cuidados básicos para a população de um país, a Organização Mundial de Saúde recomenda um mínimo de 22,8 profissionais de saúde especializados para cada 10 mil pessoas; a cobertura universal necessita de pelo menos 34,5 trabalhadores para cada 10 mil pessoas. Na Guiana, no entanto, há apenas 11,4 profissionais de saúde para cada 10 mil pessoas, uma carência de recursos humanos que afeta todas as vertentes do sistema de saúde.

Por último, a Guiana é um país socialmente conservador e os preconceitos em relação à atividade sexual dos jovens impregnam os cuidados de saúde e a vida doméstica. Algumas enfermeiras preferem não fornecer contracetivos às raparigas, enquanto muitos pais acreditam que falar sobre sexo só irá encorajar o comportamento sexual. Isso, juntamente com a falta de educação sexual nas escolas, deixa os adolescentes guianenses com poucos lugares onde se dirigirem para pedirem aconselhamento, antes de se tornarem sexualmente ativos, ou para encontrarem ajuda quando engravidam.

Estes obstáculos podem ser ultrapassados e a Guiana pode diminuir a sua taxa de gravidezes na adolescência. Mas isso exigirá mudanças significativas no modo como os guianenses pensam e abordam a questão da atividade sexual dos adolescentes.

Para começar, a Guiana tem de implementar uma educação sexual abrangente e trabalhar para garantir que os professores tiveram formação nesse sentido, de forma a fornecerem informações e dados imparciais. Os adolescentes devem estar cientes dos serviços que estão disponíveis, e os pais e membros da comunidade devem ser incentivados a apoiar a disponibilização e o alargamento desses programas.

Além disso, as comunidades precisam de aumentar o acesso a contracetivos e outros serviços de saúde sexual; uma forma de o fazer seria recuperar ou estabelecer espaços e centros dirigidos aos jovens, onde as informações possam ser partilhadas. Esses espaços devem abrir depois de as aulas terminarem e nos fins de semana, dotados de adultos especializados e solidários. É imprescindível que seja dada especial atenção às regiões rurais e às pessoas com necessidades especiais, um segmento frequentemente negligenciado da população jovem.

Estas reformas são essenciais para melhorar as perspetivas de vida dos jovens da Guiana. Se mais adolescentes tivessem acesso à educação sexual e a contracetivos, menos raparigas teriam as suas vidas suspensas devido a uma gravidez. Somente capacitando as mulheres e as raparigas com os recursos para controlarem a sua reprodução é que as estatísticas sombrias que há muito têm sobrecarregado a Guiana – e muitos outros países – começarão a mudar para melhor.

PATRICEE DOUGLAS

Patricee Douglas é médica, vencedora do prémio 120 abaixo dos 40 por liderança em planeamento familiar e membro da Women Across Differences, uma organização sem fins lucrativos da Guiana que trabalha para capacitar mulheres e meninas.

 

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