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Vencer a guerra contra a tuberculose

19-10-2018 - Ibrahim Assane Mayaki

O mundo está finalmente a despertar para a ameaça representada por uma das doenças mais negligenciadas do nosso tempo. No mês passado, a Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) acolheu a primeira reunião de alto nível sobre a tuberculose (TB) para explorar opções de esforços internacionais de erradicação. Mas por muito bem-vinda que seja esta nova atenção global, a verdade é que o caminho para vencer a TB começa em África.

Simplificando, a TB continua actualmente a ser uma das epidemias mais mortíferas em África, e é aí que se regista um quarto de todas as mortes globais por TB. Em 2016, perto de 417 000 pessoas no continente sucumbiram à doença. Os surtos recentes de TB multirresistente e de TB extensivamente resistente na África do Sul, em Moçambique e no Gana podem fazer subir ainda mais o número de mortes anuais. Estas bolsas de bactérias, agora perfeitamente imunes ao tratamento antimicrobiano, significam que o desafio da erradicação global se tornou ainda mais gigantesco.

Parte do motivo para a persistência da TB está na vulnerabilidade das populações que infecta. Para começar, a TB está entre os principais assassinos das pessoas VIH-positivas, sendo responsável por perto de 40% das mortes por VIH. Isto também representa um perigo para os doentes VIH-negativos, especialmente os que tenham sistemas imunitários comprometidos, as crianças, e os bebés.

A erradicação também é difícil porque a TB é uma bactéria transportada pelo ar e altamente contagiosa; as pessoas que trabalhem e vivam em espaços limitados – como mineiros, prisioneiros, migrantes e refugiados – apresentam as maiores taxas de infecção. Finalmente, como a prevalência da TB está estreitamente ligada à pobreza e à marginalização social, nem sempre é fácil chegar às pessoas em situação de maior risco.

As doenças infecciosas não conhecem fronteiras, e à medida que os países africanos aprofundam as suas relações comerciais e a migração intra-africana cresce, aumenta também a ameaça de uma pandemia regional. Isto faz com que seja ainda mais crítico que África comece a desenvolver uma abordagem multissectorial e integrada para a contenção, o controlo e, eventualmente, a erradicação de desafios de saúde pública como a TB.

Para tal, uma abordagem que poderia ser adoptada pelos governos africanos é a estratégia de gestão da TB implementada pelo sector mineiro do continente, um plano interagências desenvolvido em 2014 pela Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral. Embora esta abordagem supostamente “harmonizada” se aplique a um sector comercial, o facto de centrar-se na coordenação com as   Comunidades Económicas Regionais (CER) - estados-membros da União Africana agrupados para integração económica – poderá servir como um modelo para uma acção colectiva mais eficaz para a contenção da TB.

Mas antes que se possa estabelecer um enquadramento específico, há três questões que precisam de atenção urgente. Em primeiro lugar, os responsáveis pelo planeamento dos cuidados de saúde e os especialistas em doenças devem definir metas nacionais, regionais e locais para a contenção. Por exemplo, a definição de objectivos para reduções de novas infecções de TB permitiria às autoridades sanitárias medirem com maior precisão o impacto das suas estratégias.

Além disso, para acabar completamente com a TB, a África precisará que o sector público e o sector privado estabeleçam compromissos financeiros novos e sustentados. E, finalmente, as estratégias para controlo de doenças devem ser concebidas para apoio às prioridades económicas e de saúde das CER. De momento, a maior parte dos sistemas nacionais e regionais de saúde carece de financiamento e de recursos humanos. Os legisladores africanos deverão, por conseguinte, desenvolver sistemas para a prevenção, diagnóstico e tratamento que ajudem os governos a partilhar o fardo da doença, e assegurar que os protocolos clínicos são consistentes entre as regiões.

Na verdade, existem alguns sinais positivos na luta contra a TB. As taxas de infecção globais estão a decrescer cerca de 2% todos os anos, e mesmo os países africanos atingidos pela TB conseguiram um decréscimo de 4% nas infecções entre 2013 e 2017. E com organizações como a Organização Mundial de Saúde e a União Africana a começarem a produzir roteiros para a erradicação da TB, torna-se claro que o ímpeto está a aumentar continuamente.

Ainda assim, sustentar esta evolução em África obrigará a uma coordenação regional significativa, para além de muito mais dinheiro. A maioria das vacinas e medicamentos é actualmente demasiado dispendiosa para a maioria dos africanos. Mas mesmo aqueles que têm a sorte de obter tratamento – normalmente, uma terapia com antibióticos potentes durante seis a oito meses – ainda enfrentam 20% de hipóteses de recaída.

O objectivo de erradicarmos a TB está ao nosso alcance; a recente reunião na AGNU marcou um ponto de viragem crítico na guerra mundial contra esta doença. Mas ao mesmo tempo que são estabelecidos compromissos e assinadas declarações, devemos lembrar-nos que, em África, a batalha está longe de estar terminada.

Ibrahim Assane Mayaki

Ibrahim Assane Mayaki, ex-primeiro ministro do Níger, é CEO da Nova Parceria para o Desenvolvimento da África (NEPAD).

 

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