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A prisão de Lula é política

13-04-2018 - João Filho

Parece que a justiça da República de Curitiba não é cega. É caolha, só enxerga com o olho direito e anda com uma agenda eleitoral debaixo do braço. Mas esse é só mais um de uma cadeia de acontecimentos construídos durante todo o processo para prejudicar Lula, não restando dúvidas de que estamos diante de uma caçada política.

Na véspera do julgamento do habeas corpus de Lula, o chefe das Forças Armadas usou o Twitter para colocar a faca no pescoço dos ministros do STF. O recado foi claro: ou os juízes pavimentavam o caminho para a prisão de Lula ou o homem que está sentado sobre o arsenal bélico da nação tomaria alguma atitude. A intimidação à democracia foi aplaudida publicamente por políticos, generais e até pelo juiz Marcelo Bretas. O perfil do TRF-4 no Twitter, o tribunal de segunda instância que condenou Lula sem provas, também curtiu o tweet que continha a ameaça golpista do comandante do Exército. 

Barroso declarou que o tribunal estava dentro da “fogueira das paixões políticas”  e que era preciso interpretar a Constituição em “sintonia com o sentimento social”, o que é uma aberração sob qualquer ponto de vista. No dia seguinte, o Vem Pra Rua convocou uma manifestação em Porto Alegre em que se botou fogo em 11 bonecos que representavam os ministros do Supremo. Estavam ali, literalmente, as “fogueiras das paixões políticas” representando o “sentimento social” com o qual Barroso está em sintonia.

É inegável que todos esses atores estão politicamente alinhados e atuando em conjunto com objetivo de tirar Lula das eleições nas quais aparece como favorito. O comandante das FA está vigilante e intimidando qualquer possibilidade de traição interna no conluio. Tudo isso seria um escândalo em qualquer democracia séria do mundo, o que não é o nosso caso, já que temos uma Justiça que está a reboque de um “sentimento social” e não da letra fria da Constituição.

Para os brasileiros que acreditam ser o PT o grande inimigo da nação, a prisão de Lula foi mais um dos orgasmos múltiplos e coletivos que eles têm alcançados nos últimos anos. O antipetismo, esse “sentimento social” que norteia as decisões de Barroso, virou uma patologia e não representa apenas uma ojeriza apenas ao partido, mas a todos os partidos de esquerda e qualquer pensamento proveniente deste espectro político.

Essa revolta contra o que dizem ser “impunidade” é mentirosa e não resiste aos fatos. A indignação não está calcada em princípios morais, mas ideológicos. MBL, Vem Pra Rua e congêneres que organizam o antipetismo jamais bateram uma canequinha na varanda contra a impunidade de Fernando Capez (PSDB) ou de Eduardo Azeredo (PSDB) e de outros do grupo político aos quais estão alinhados ideologicamente. Também não vimos o comandante do Exército usar suas redes sociais para reclamar da impunidade de algum tucano. A hipocrisia dos moralistas não é uma novidade.

Cármen Lúcia fez o que esteve ao seu alcance para negar o habeas corpus de Lula, assim como fez quando ajudou a impedir que Aécio Neves fosse preso - tudo de acordo com o “sentimento social”, que aplaudiu a decisão contra Lula e se calou diante da decisão favorável a Aécio.

Logo no dia posterior ao julgamento no STF, o presidente do TRF-4 conversou com a Rádio Band News e afirmou que a prisão só seria “possível a partir do esgotamento dos recursos do segundo grau” e que os advogados do Lula teriam até a próxima terça-feira (10/04) para apresentar novo embargo ao TRF-4. “Esses embargos deverão ser examinados pelo tribunal. Após o julgamento desses embargos, o relator do processo, aí sim, está autorizado a comunicar o juiz Moro para eventual cumprimento da decisão.”

Horas depois, ao se tomar conhecimento de que o ministro Marco Aurélio Mello poderia conceder liminar pedida pelos advogados de Lula, a prisão foi decretada. Ou seja, o tribunal fez exatamente o contrário do que o seu presidente havia declarado horas antes e autorizou Moro a decretar a prisão sem julgar os novos embargos. O juiz, com uma sede de Torquemada, emitiu o despacho com a ordem de prisão em apenas 22 minutos — um novo recorde para um processo acostumado a bater recordes de ligeireza. Um documento obtido pelo EL PAÍS revelou que  partiu do Ministério Público Federal a pressão pelo aceleramento da execução a iniciativa de pressionar pela rápida execução da condenação. Mauricio Gotardo Gerum,  procurador da República, assinou um documento que pedia ao TRF-4 para que liberasse imediatamente a prisão e, assim,  “estancar a sensação de onipotência” de Lula, que não estaria se submetendo às decisões judiciais. Um verdadeiro escárnio.

As outras oito determinações de prisão de réus da Lava Jato do Paraná, por exemplo, levaram entre 18 e 30 meses para serem expedidas. A de Lula levou apenas 9. Por que tanta ansiedade justamente nesse processo? Por que não esperar o esgotamento dos recursos jurídicos sem atropelar a lei? É uma pressa que não se justifica juridicamente, apenas politicamente. Um levantamento do Zero Hora não deixa dúvidas de que tudo leva metade do tempo quando o processo envolve o nome do ex-presidente:

Do julgamento em 1ª instância até apelação
Média: 96 dias
Processo de Lula: 42 dias

Tempo até conclusão do voto do relator
Média: 275,9 dias
Processo de Lula: 100 dias

Tempo entre revisão e julgamento
Média: 105 dias
Processo de Lula: 54 dias

Parece que a justiça da República de Curitiba não é cega. É caolha, só enxerga com o olho direito e anda com uma agenda eleitoral debaixo do braço. Mas esse é só mais um de uma cadeia de acontecimentos construídos durante todo o processo para prejudicar Lula, não restando dúvidas de que estamos diante de uma caçada política.

Posando de líderes messiânicos de uma cruzada moral, Sergio Moro e a turma que trata a prisão de Lula como troféu viraram simultaneamente heróis e reféns de um antipetismo delirante — aquele que chegou um dia a taxar esse mesmo STF de “bolivariano”. O recado está dado: Lula será preso antes das eleições, custe o que custar e nada, nem mesmo a Constituição, irá interromper essa missão divina do bem contra o mal.

A crise institucional se intensifica à medida que nos aproximamos das eleições. Trinta e três anos após a redemocratização, mesmo levando em conta significativos avanços democráticos conquistados nesse período, o quadro institucional atual é sombrio e a democracia segue fragilizada. Dos 4 últimos presidentes eleitos, 2 sofreram impeachment e 1 está prestes a ser preso. FHC, cuja possibilidade de reeleição foi comprada de maneira escandalosa em um esquema fartamente comprovado, é o único que passou ileso e hoje desfruta da aposentadoria e ainda é incensado pela grande mídia como grande analista da vida brasileira. Lula, que saiu com 89% de popularidade após 8 anos de mandato e hoje se apresenta como o candidato favorito dos brasileiros para a próxima eleição, está a caminho da cadeia por uma condenação muito mais embasada em convicções do que em provas. Até porque uma prisão política não carece de provas. Basta um certo “sentimento social”.

Fonte: The Intercept

 

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