Edição online quinzenal
 
Sexta-feira 19 de Abril de 2024  
Notícias e Opnião do Concelho de Almeirim de Portugal e do Mundo
 

O direito à saúde é universal

08-12-2017 - Michel Sidibé, Dainius Puras

GENEBRA – No Dia Mundial da SIDA deste ano, assinalado no dia 1 de Dezembro, devemos recordar os 35 milhões de pessoas que morreram de doenças relacionadas com a SIDA, e os 76 milhões de pessoas que foram infectadas com o VIH desde que os casos começaram a ser divulgados. Podemos, além disso, celebrar o facto de os cerca de 21 milhões de pessoas que vivem com VIH terem agora acesso a tratamentos que visam salvar a vida.

No entanto, também não devemos descurar o facto de que mais de 15,8 milhões de pessoas ainda estão à espera de tratamento, e um número estimado de 11 milhões de pessoas nem sequer sabem que têm o vírus. No tempo necessário para ler este artigo, mais três raparigas terão contraído o VIH. Estes valores representam uma injustiça inaceitável: o direito à saúde está a ser negado a milhões de pessoas.

O terceiro Objectivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS3) das Nações Unidas diz respeito à saúde. Visa reduzir os acidentes rodoviários; combater doenças não transmissíveis; erradicar a SIDA, a tuberculose, a malária e as doenças tropicais negligenciadas; garantir a cobertura universal à saúde e o acesso a cuidados e serviços de saúde sexual e reprodutiva; e reduzir substancialmente as mortes causadas pela poluição ambiental — tudo até 2030.

Embora haja países de todo o mundo empenhados na concretização deste objectivo, um grande número de pessoas ainda inala níveis perigosos de partículas tóxicas e não dispõe de acesso a água potável e saneamento adequado. Muitos governos continuam a não actuar em matérias ambientais e noutras questões regulamentares, fazem vista grossa às empresas que obtêm lucro com a venda de produtos não saudáveis e viciantes, defraudando assim aqueles a quem devem proteger e servir.

A saúde não é um dom, nem um acto de caridade. É um direito fundamental do ser humano, que abrange tanto as liberdades como os direitos. Cada pessoa é livre para tomar decisões sobre a sua saúde, independentemente de quem seja, do local onde viva, das suas convicções, ou da forma como ganha a vida. Além disso, todos têm direito a serviços de saúde de qualidade, economicamente acessíveis e isentos de discriminação e coerção. Gozar do direito à saúde significa ver a própria integridade física e mental respeitada e ter a capacidade para participar e contribuir para a comunidade.

Actualmente, instamos os líderes mundiais a enfrentarem as injustiças a nível da saúde onde quer que estas ocorram e a tomarem medidas para respeitar, proteger e defender o direito à saúde de todos os povos. A ambiciosa agenda dos ODS para 2030 proporcionou-nos a todos a oportunidade de moldar as políticas destinadas a criar e a capacitar o “cidadão da saúde global”.

Quem é este cidadão? É uma pessoa que conhece os seus direitos e é capaz de expressar as suas preocupações, enfrentar as injustiças e responsabilizar os decisores. É uma pessoa que não se limita a pedir, mas que exige o acesso a médicos, tratamentos ou cuidados preventivos. O “cidadão da saúde global” é aquele que se torna parte da solução.

A capacitação destes cidadãos exigirá a realização de progressos em pelo menos três domínios políticos: a popularização da participação, a democratização dos dados e a supressão da discriminação. Relativamente ao primeiro, temos de abrir os programas e as políticas de saúde à participação significativa do público. Na década de 1990, o movimento pelos direitos dos deficientes motores cunhou a expressão "Nada sobre nós sem nós". Todos os “cidadãos da saúde global” e, em especial, os responsáveis pela prestação de cuidados de saúde, devem adoptar este mantra.

Concretamente, a corrupção pública e privada continua a ser um obstáculo significativo à garantia do direito à saúde para todos os povos. Em muitos países, a saúde é um dos sectores mais corruptos. Para resolver esta situação, os cidadãos da saúde global necessitarão de apoio institucional e de melhores ferramentas para exigir que o seu direito à saúde seja respeitado. Devem começar a exigir mais medidas para assegurar uma boa governação e transparência, melhorar a alfabetização "legal", financiar as organizações da sociedade civil e reforçar os mecanismos legais de responsabilização dos governos.

O segundo domínio político que requer a realização de progressos é o acesso das comunidades aos dados. Na ONUSIDA, seguimos o ditado que diz "o que se quantifica é feito". A análise de dados provou ser uma das ferramentas mais poderosas na luta contra a epidemia do VIH, porque permite aumentar a sensibilização, identificar pessoas que estão a ser deixadas para trás, orientar o investimento e coordenar a acção.

No campo da saúde global, fomos sempre bons a estimar as taxas de mortalidade e de morbilidade. No entanto, é chegado o momento de olhar para além dos factos epidemiológicos. Para garantir o direito à saúde devemos igualmente acompanhar os efeitos da discriminação e da estigmatização, bem como as leis e factores ambientais que ameaçam a saúde e o bem-estar. Da mesma forma, a realização de avaliações exaustivas do impacto a nível da saúde das políticas e investimentos chave deve tornar-se a norma, e não a excepção. O sector da saúde global necessita de uma defesa e responsabilização muito mais independentes, algo que a ONU e os grupos da sociedade civil, em particular, estão em condições proporcionar.

O terceiro domínio político — pôr termo à discriminação nos contextos da prestação de cuidados de saúde — deve tornar-se uma prioridade internacional. A promessa central da agenda dos ODS é não deixar ninguém para trás. A discriminação cria barreiras concretas à cobertura universal dos cuidados de saúde e impede muitas pessoas de ter acesso a serviços de saúde de qualquer tipo. Por exemplo, um em cada oito dos inquiridos no HIV Stigma Index afirmou terem-lhe sido negados cuidados de saúde por preconceito.

É evidente que a erradicação da SIDA exigirá progressos a nível social e não apenas a nível clínico. Os governos devem redobrar os seus esforços para proteger as pessoas contra a discriminação e criar mecanismos eficazes para as pessoas possam obter reparação caso o seu direito à saúde seja alvo de violação por parte de intervenientes do sector privado ou público. Instamos todos os profissionais e instituições do sector da saúde a combaterem as leis, políticas ou práticas discriminatórias.

A salvaguarda do direito à saúde garante a base necessária para que todos possam realizar o seu potencial e os seus sonhos. Não devemos exigir menos.

MICHEL SIDIBÉ

Michel Sidibé is Executive Director of UNAIDS.

 

DAINIUS PURAS

Dainius Puras is United Nations Special Rapporteur on the right to physical and mental health.

 

Voltar 


Subscreva a nossa News Letter
CONTACTOS
COLABORADORES
 
Eduardo Milheiro
Coordenador
Marta Milheiro
   
© O Notícias de Almeirim : All rights reserved - Site optimizado para 1024x768 e Internet Explorer 5.0 ou superior e Google Chrome