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Segunda Guerra Fria: Rússia questiona consenso pós-União Soviética

11-04-2014 - Marcelo Justo

A regra implícita que a Rússia violou na Crimeia é que não se usa a força a não ser que isso seja autorizado pelos EUA e seus aliados.

A crise na Crimeia gerou um aparente consenso sobre o novo momento histórico internacional que vivemos: a segunda Guerra Fria. No Ocidente, diplomatas, políticos e jornalistas coincidem em que a era de cooperação entre Rússia e Estados Unidos no marco de um “mundo multipolar”, visível com os atentados das torres gémeas e a “guerra contra o terrorismo”, é coisa do passado. A pergunta é se este consenso reflecte uma nova realidade ou é a simples posição por “default” que o Ocidente adopta em relação a Rússia.

O mundo bipolar da Guerra Fria tinha como pano de fundo um irredutível enfrentamento ideológico entre Estados Unidos e Rússia com repercussões em distintas partes do planeta (América Latina, África, Oriente Médio, Ásia) e a ameaça do holocausto nuclear, factores ausentes hoje. A Carta Maior analisou o tema com o director em Moscovo do americano Fundo Carnegie para a Paz Internacional (Carnegie Endowment for International Peace), o russo Dmitri Trenin.

Fala-se da crise actual como algo nos marcos de uma segunda guerra fria. É simples manchete de jornal ou uma realidade concreta?

Depende de como se defina a guerra fria. Se você a define como o que ocorreu entre os anos 40 e os 90 é altamente improvável que haja uma repetição daquele esquema bipolar. Mas se você a pensa como uma expressão do equilíbrio entre competição e cooperação que rege as relações internacionais, sim, é possível falar de uma nova guerra fria. Neste momento, temos um claro predomínio da competição e da rivalidade internacional sobre a cooperação.

De que tipo de rivalidade estamos falando?

A zona de conflito hoje é a Ucrânia, o leste europeu, o Cáucaso. Em termos mais amplos, que estamos vendo é uma tentativa da Rússia de rever o consenso internacional que se seguiu ao fim da União Soviética com um claro desafio dos Estados Unidos a nível global. A Ucrânia é muito importante para a Rússia e, na visão do mundo de Vladimir Putin, faz parte da civilização russa, eslava e cristã moderna. Putin repetiu isso em várias ocasiões: a Rússia e a Ucrânia são um só povo. Isso se opõe por completo à visão que os Estados Unidos e a Europa têm em relação às fronteiras.

Por que se considera que a Crimeia é a ruptura da ordem mundial pós-queda do Muro de Berlim e, em troca, a invasão do Iraque não?

A Rússia objectou a invasão do Iraque e a política internacional para a Síria e conseguiu armar uma alternativa à política americana a respeito do regime de Assad, mas a grande regra implícita que a Rússia violou na Crimeia é que não se usa a força a não ser que isso seja autorizado pelos Estados Unidos e seus aliados. Em outras palavras, é possível usar a força, e isso tem ocorrido na África e em outras partes do planeta, mas para isso é preciso ter a bênção dos Estados Unidos. Este é o consenso pós-União Soviética que a Rússia está desafiando. A Ucrânia não é importante para os Estados unidos. O que é importante é o papel americano no mundo.

Como vê a posição da União Europeia nesta crise?

A crise endureceu a posição oficial e a dos meios de comunicação em relação a Rússia. No leste europeu, a Rússia é outra vez o adversário histórico e, na Europa em geral, é descrita como uma potência do século 19. Por outro lado, não parece haver muito entusiasmo em se avançar no caminho das sanções económicas porque os europeus estão preocupados com o nível de dependência energética e não querem comprometer suas exportações para a Rússia no meio da crise económica da União Europeia.

Mas a NATO, a aliança militar entre Estados Unidos e Europa, endureceu sua posição.

A NATO parece ter redescoberto sua velha missão histórica que era neutralizar a influência russa. O secretário-geral da NATO, Anders Fogh Rasmussen, que em 2009 empreendeu uma audaciosa abertura em direcção a Moscovo, fala agora dos assuntos pendentes que a organização tem em relação ao seu alargamento para o leste, algo que incluiria a Geórgia, Moldávia e Ucrânia. É possível que, na próxima cúpula da NATO, se decida um movimento militar mais ao leste, para a Polónia, Roménia e os países bálticos.

Quanto vai durar este novo cenário internacional?

Estamos muito no início deste novo tipo de guerra fria. Minha impressão é que vai durar anos, mas não sei como, quando e onde vai terminar. Tudo dependerá de como se resolva a questão da Ucrânia e de como se redefina o posicionamento da Rússia z nível interno, regional e mundial, e o papel do protagonismo internacional dos Estados Unidos.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

 

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