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"A esquerda francesa é hoje um campo em ruínas"

28-04-2017 - Pierre Carrey

O Novo Partido Anticapitalista, cujo candidato Poutou obteve 1,1% dos votos nas eleições francesas, recusa-se apoiar qualquer candidatura no segundo turno.

“É a pior eleição que já vivi", diz Alain Krivine, 75 anos, um dos líderes do Novo Partido Anticapitalista (NPA). Ele não está tão impressionado com a pontuação na primeira rodada da corrida presidencial de 2017, mas com as confusões, reviravoltas, hesitações e enganações que marcaram a campanha e acabam infiltrando a sociedade em suas camadas mais profundas. "Em Saint Denis (cidade vizinha a Paris, com grande mixidade étnica e social e historicamente à esquerda), cruzamos com pessoas que diziam: ‘Preferimos Poutou mas vamos votar em Macron porque ele é mais confiável’. Outros diziam: ‘Será o carteiro [Olivier Besancenot, ex-candidato pelo NPA] ou Marine [Le Pen]". Este é o resultado de cinco anos de Sarkozy mais cinco anos de Hollande: as pessoas estão perdidas".

No domingo à noite, os militantes do NPA se reuniram em um circo-cabaré de Paris, le Zèbre, com luzes laranja, cortinas grená, e, sobre o palco, afastados esperando o próximo espetáculo, um trapézio, um manequem de um homem dormindo e um globo espelhado. Eles tentam se transmitir alegria e coragem, como bons militantes que não se deixam abater apesar do 1,1% registrado por Philippe Poutou no primeiro turno – pior do que o 1,5% obtido em 2012. Mas há, no fundo de cada um, o sentimento de tristeza e um toque de ansiedade.

"Um voto de classe"

A reflexão que aparece com frequência nas conversas é: "A esquerda é hoje um campo em ruínas". Não se referem apenas ao NPA, mas também ao Partido Socialista, que foi massacrado, obtendo apenas 6,35% dos votos, e ao movimento France Insoumise (França Insubmissa), de Jean-Luc Mélenchon, que não se qualificou para o segundo turno (ficando em quarto lugar, com 19,62%), apesar de uma dinâmica promissora. Somados, os resultados revelam que, concretamente, menos de 30% dos eleitores franceses deram seu voto para a esquerda.

"E ainda não acabou”, avalia Julien Salingue. “Podemos ter agora um voto de classe no segundo turno, com Marine Le Pen de um lado, denunciando os excessos da globalização, e Emmanuel Macron do outro, na defesa dos bancos e do setor financeiro. Isso deve reforçar a conquista de algumas das classes populares por Le Pen. Esse confronto pode perturbar ainda mais os eleitores e complicar possíveis projetos futuros entre as forças de esquerda".

Philippe Poutou, candidato pelo movimento, equiparou os dois candidatos em seu discurso após o resultado, transmitido ao vivo do Zèbre. Ele se recusa a tomar posição em um duelo que opõe um Front National "tão capitalista e cheio de escândalos quanto os outros" à organização En Marche "herdeira direto dos bancos e de François Hollande." Assim, o NPA não indicará voto para o segundo turno. Mesmo que "entenda" que alguns eleitores possam apoiar Emmanuel Macron para barrar o projeto de Marine Le Pen.

Mais tarde, no estúdio do canal France 2, antes de tirar uma semana de férias para depois voltar à fábrica, Poutou rompia a unanimidade dos principais partidos em torno de Macron, dizendo três vezes lamentar que este estivesse cercado por tanta gente "nefasta".

"Um novo Nuit Debout"

O essencial para esta franja da esquerda anticapitalista se situa além da eleição presidencial. Philippe Poutou, 50 anos, operário na fábrica da Ford em Blanquefort (Gironde), que não será candidato novamente em 2022, esboçou um plano de ação em seu discurso: "mobilizar a juventude" "retomar as ruas" e criar "uma nova força para nos representar."

O primeiro encontro está marcado para 1º de Maio, Dia do Trabalho. A seis dias do desfecho desta eleição presidencial, o NPA deseja reunir muitos manifestantes, unificados e provenientes de vários sindicatos, partidos e associações. O objetivo é dar esperança aos cidadãos de esquerda que não estão seduzidos por Emmanuel Macron e buscam justiça social. "Precisamos de um novo Nuit Debout", diz Christine Poupin, porta-voz do NPA. Em coro, a sala do Zèbre grita "Greve geral!", estratégia sobre a qual os sindicatos e os partidos tradicionais não entram em acordo desde 1968 em escala nacional. Alain Krivine se mostra otimista. "Maio de 1968 teve efeitos tardios, como a vitória de Mitterrand, em 1981. Não me oponho às eleições, desde que validem um movimento de base. Em cinco anos, tivemos o Nuit Debout e as manifestações contra a lei El Khomri. É preciso ter esperança nos desdobramentos dessas mobilizações e não desperdiçar as que estão por vir".

"Vamos em frente"

Quanto à "nova força" da esquerda, poderia passar por alianças com outros movimentos políticos, como a Lutte Ouvrière (LO, Luta Operária), que havia aceitado apresentar listas conjuntas nas eleições europeias de 1999, a France Insoumise (França Insubmissa), que reúne a maior parte dos votos progressistas hoje. Os militantes do NPA, no entanto, mostram-se reservados sobre as chances desta aproximação, lamentando o percurso "egocêntrico" e "vertical" escolhido por Jean-Luc Mélenchon, que propõe que se aliem a ele sem, no entanto, parecer disposto a criar um plataforma mais ampla.

Paradoxo desta eleição: os eleitores NPA reunidos no domingo em Paris zombam de Mélenchon quando este ironiza na TV os "midiocratas" e os "oligarcas", mas muitos lamentam que ele não tenha ido para o segundo turno. Sua qualificação representaria "uma mudança radical", imaginava Besancenot na semana passada, em entrevista à revista Regards e, nesse caso, “tudo teria que ser rediscutido."

Enquanto espera reformular uma oposição de esquerda, o Novo Partido Anticapitalista não deve apresentar candidatos às legislativas de 11 e 18 de Junho, como tinha feito nas regionais em 2015. Uma decisão sobre o assunto deve ser tomada na segunda-feira à noite. O que esfria o NPA é a pontuação de Philippe Poutou, metade dos 2% esperados, sugerindo fracos resultados na corrida legislativa. As despesas de campanha de uma organização política só são reembolsadas se esta ultrapassa a marca de 1% em pelo menos 50 eleições. "Uma circunscrição representa entre € 3mil e 4mil de gasto mínimo, e se apresentarmos cem candidatos, são € 400mil", calcula um membro do NPA. Ele conclui: "Vamos em frente. Há sempre outras maneiras de se fazer ouvir. Continuamos a acreditar”.

Tradução de Clarisse Meireles

Fonte; Libération

 

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