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NA COREIA DO NORTE O TEMPO ESCASSEIA

24-03-2017 - Richard N. Haass

NOVA IORQUE – Existe um consenso crescente de que a primeira crise verdadeira da presidência de Donald Trump poderia envolver a Coreia do Norte e, mais especificamente, a sua capacidade de colocar uma ogiva nuclear num ou mais mísseis balísticos com alcance e precisão suficientes para atingir os EUA. Esta crise poderia igualmente ter outra origem: um grande aumento do número de ogivas nucleares produzidas pela Coreia do Norte, o que é prova de que vende materiais nucleares a grupos terroristas, ou ainda a utilização das suas forças militares convencionais contra as forças da Coreia do Sul ou dos EUA ali estacionadas.

Não há tempo a perder: qualquer um destes acontecimentos pode ocorrer nos próximos meses ou anos. A paciência estratégica — a abordagem em relação à Coreia do Norte que caracterizou vários governos norte-americanos desde o início da década de 1990 — chegou ao fim.

Uma das estratégias possíveis consistiria em aceitar simplesmente como inevitável o aumento contínuo da quantidade e da qualidade do armamento nuclear e dos mísseis da Coreia do Norte. Os EUA, a Coreia do Sul e o Japão apoiar-se-iam numa combinação de defesa balística e de dissuasão.

O problema é que a defesa antimíssil não é perfeita e a dissuasão é incerta. A única certeza é que o fracasso de uma ou de outra teria custos inimagináveis. Nestas circunstâncias, o Japão e a Coreia do Sul poderiam reconsiderar também a aquisição de armas nucleares, o que aumentaria o risco de uma nova corrida ao armamento na região, potencialmente desestabilizadora.

Uma outra possibilidade seria o recurso à força militar contra uma ameaça norte-coreana que parecesse crescente ou iminente. Um dos problemas desta abordagem é a incerteza quanto à possibilidade de todos os mísseis e ogivas da Coreia do Norte serem destruídos por ataques militares. Contudo, mesmo que tal sucedesse, a Coreia do Norte retaliaria provavelmente, atacando a Coreia do Sul com as suas forças militares convencionais. Dado que Seul e as tropas norte-americanas estacionadas na Coreia do Sul estão ao alcance de milhares de peças de artilharia, os custos em vidas e danos físicos seriam exorbitantes. O novo governo da Coreia do Sul (que tomará posse dentro de dois meses) irá certamente opor-se a qualquer acção susceptível de desencadear um tal cenário.

É por esta razão que alguns optam por uma mudança de regime, esperando que um novo governo norte-coreano possa revelar-se mais razoável. É possível que tal acontecesse; mas, tendo em conta que a Coreia do Norte é um país muito fechado, esta solução parece difícil de pôr em prática.

Isto conduz-nos à via da diplomacia. Os EUA poderiam propor (na sequência de consultas estreitas com os governos da Coreia do Sul e do Japão e, o que seria ideal, no contexto de resoluções e sanções económicas suplementares por parte das Nações Unidas) negociações directas com a Coreia do Norte. Uma vez iniciadas as negociações, os EUA poderiam propor um acordo: a Coreia do Norte teria de concordar em congelar a sua capacidade militar em matéria de armamento nuclear e de mísseis, o que exigiria a cessação de todos os testes de ogivas e de mísseis, bem como a presença de inspectores internacionais para verificar a conformidade com o acordo. A Coreia do Norte teria, além disso, de assumir o compromisso de não vender material nuclear a qualquer outro país ou organização.

Em troca, os EUA e os seus parceiros facultariam, além das negociações directas, o abrandamento das sanções. Os EUA e outros países poderiam também concordar em assinar — volvidos mais de 60 anos sobre o fim da Guerra da Coreia — um acordo de paz com o Norte.

A Coreia do Norte (um pouco à semelhança do Irão) poderia manter a sua opção nuclear, mas ficando proibida de a pôr em prática. O problema das muitas violações dos direitos humanos da Coreia do Norte não seria solucionado nesta fase, embora os dirigentes do país entendessem que não seria possível uma normalização das relações (ou a cessação das sanções) enquanto a repressão se mantivesse como norma. A normalização plena das relações exigiria igualmente que a Coreia do Norte desistisse do seu programa de armamento nuclear.

Simultaneamente, os EUA deveriam decidir até onde estão dispostos a ir e não cessar os exercícios militares conjuntos EUA-Coreia do Sul, que são um componente de dissuasão e de defesa potencial necessário, tendo em conta a ameaça militar que o Norte representa. Pela mesma razão, a imposição de limites às forças dos EUA no país ou na região seria inaceitável. As negociações deveriam ter lugar num período de tempo estabelecido, para que a Coreia do Norte utilizasse esse período para criar novos factos militares.

Será que uma tal abordagem poderia ser bem-sucedida? Talvez. A posição da China seria, sem dúvida, um elemento essencial. Os líderes chineses não apreciam o regime de Kim Jong-un nem as suas armas nucleares, mas aprovam ainda menos a perspectiva de um colapso da Coreia do Norte e a unificação da península coreana com Seul como capital.

A questão é saber se a China (o canal através do qual as mercadorias entram e saem da Coreia do Norte) poderia ser persuadida a fazer uso da influência considerável que exerce sobre o seu vizinho. Os EUA deveriam garantir que não utilizarão a reunificação da Coreia para obter uma vantagem estratégica, advertindo simultaneamente a China para os perigos que a política da Coreia do Norte representa para os seus próprios interesses. Seria bastante desejável a continuação das conversações com a China sobre a melhor forma de responder a possíveis cenários na Península.

Não há garantias de que a diplomacia seja bem-sucedida, mas não se deve excluir essa possibilidade. E mesmo que não tivesse êxito, a demonstração de que tinham sido envidados esforços de boa fé poderia facilitar ter em consideração, realizar e, posteriormente, explicar ao público nacional e internacional por que razão foi adoptada uma política alternativa, que incluiu o recurso à força militar.

Richard N. Haass

Richard N. Haass, Presidente do Conselho de Relações Exteriores, serviu anteriormente como Director de Planeamento de Políticas para o Departamento de Estado dos Estados Unidos (2001-2003) e foi enviado especial do Presidente George W. Bush para a Irlanda do Norte e Coordenador para o Futuro do Afeganistão. Ele é o autor de   A World in Disarray: American Foreign Policy and the Crisis of the Old Order

 

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