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Mujica: "o pior inimigo da esquerda é a divisão interna"

07-10-2016 - Victor Farinelli

O ex-presidente uruguaio falou em Guaiaquil sobre os novos governos Macri e Temer, dizendo que 'parecem duas repúblicas bananeiras'.

O senador e ex-presidente do Uruguai, José “Pepe” Mujica é um das vozes mais importantes da esquerda na América Latina e no mundo, e não é estranho que seja uma das estrelas do III Encontro Progressista Latino-Americano (ELAP, por sua sigla em espanhol), que está se realizando nesta semana, no Equador.

Durante sua participação no evento, o político se referiu aos novos presidentes do Brasil, Michel Temer, e da Argentina, Mauricio Macri. “Que desastre! Parecem duas repúblicas bananeiras. Não sei como vão sair de suas respectivas crises, especialmente o Brasil, que está mais complicado, parece uma telenovela”, qualificou o ex-mandatário.

Mujica também questionou a estratégia comercial de associação com o Pacífico, prioridade dos dois países vizinhos do Uruguai. Ele afirmou que os acordos comerciais nessa linha formam parte de “uma estratégia de Washington para afetar a China”.

Pactos e divisões

Outro tema importante abordado por Mujica foi a forma como a esquerda deve encarar a volta ao poder das correntes neoliberais nos países da América do Sul. Segundo ele, este é o momento de a esquerda buscar formar pactos políticos inteligentes, que sirvam para manter a força dos projetos progressistas na região.

Diante de milhares de pessoas que lotaram o Teatro Centro Cívico de Guaiaquil, Mujica fez um alerta para as forças progressistas sul-americanas e os movimentos sociais: “O pior inimigo da esquerda é a divisão interna”. O senador também afirmou que “jamais se deve pactuar com a direita, essa também é uma lição que aprendemos”.

O veterano dirigente político aprofundou sua postura com argumentos históricos, lembrou de como a Alemanha de Adolf Hitler e a Espanha de Francisco Franco se estabeleceram e prosperaram aproveitando que “as forças de esquerda se dedicaram a se enfrentar”. Mujica destacou o caso espanhol, afirmando que “o ditador se manteve por anos no poder porque socialistas, comunistas e anarquistas perdiam mais tempo em conflito interno do que enfrentando o fascismo”. Em seguida, ele explicou que “a briga não tem que ser por uma reles fração de poder, por se sentar num banco, a briga estratégica é por uma mudança de cultura”.

Por isso, ele defende uma necessária unidade na diversidade da esquerda, com uma saudável perspectiva, pois “se pretendemos mais, não podemos acabar com a diversidade, porque isso é perder a unidade”. Também insistiu na importância da militância e dos partidos como instrumentos que expressam as vontades coletivas, mas lembrou que os mesmos não devem se descuidar quando chegam ao poder. Como exemplo, ele comentou o caso da Argentina, onde, em sua opinião, “não foi Macri que ganhou, mas o peronismo que perdeu, embora seja clara maioria, porque se deixou afetar por suas confrontações internas”.

Mujica também deu conselhos aos militantes e políticos presentes, aos quais recomendou “viver em função do que se pensa e ter uma vida que represente as ideias que nos mobilizam”. Nesse sentido, enfatizou a necessidade de que os governantes vivam como vive seu povo, porque “está bem que a direita cultive sua imagem, e por isso nós não devemos ter essa mesma imagem, nós temos a nossa, e temos que fortalecer essa”.

Ao aprofundar esse pensamento, ele disse que “nós (políticos de esquerda) temos que viver como vive a imensa maioria do nosso povo, essa questão da imagem é uma forma de comunicação e respeito”.

Desigualdade e crescimento do capital ameaçam a democracia

Em outro tema, o senador uruguaio falou sobre a desigualdade e o crescimento do capital em detrimento da estabilidade da economia, como as principais ameaças que as democracias enfrentam hoje no mundo inteiro.

“Hoje, uns 80 e poucos senhores possuem as mesmas riquezas que metade da humanidade, então o problema aqui é a desigualdade. Que a taxa de crescimento do capital seja mais importante que a taxa de crescimento global da economia é terrível, e se trata da ameaça mais feroz que a democracia enfrenta hoje no mundo inteiro”, comentou o ex-mandatário socialista.

Ele explicou que o mundo de hoje caminha a um projeto cada vez mais transnacional, concentrador da riqueza, que “levou ao surgimento de seres econômicos com dimensões que pesam mais que os Estados, mas que têm a vantagem de não ter bandeira, nem hino, nem vergonha… mas que acumula e continua acumulando riqueza”. Segundo Mujica, o comércio contemporâneo que mais cresce é o comércio interno, o das empresas multinacionais, mas afirma que gostaria de ver “como vão fazer para que esses números sejam cristalinos”. Seu discurso também se referiu ao fato de que as taxas de juros, que favorecem o capital, crescem mais rápido que as economias do mundo, o que significa que “a economia está crescendo, mas a concentração da riqueza aumenta muito mais”.

“Os governos precisam lidar com o peso do lobby em favor da concentração do capital, que é a característica contemporânea mais importante, e também a maior ameaça à democracia no mundo”.

Nesse sentido, ele agregou que as distintas formas de riqueza vem tendo uma “explosão secular” e que essa “enorme quantidade de recursos anda pelo mundo através da especulação, sem nenhuma regulação, e isso se torna um problema”.

Finalmente, Mujica criticou as reservas internacionais que os países devem manter por obrigação, que, segundo ele, produz “uma gigantesca paralisação dos recursos, que não podem ser utilizados a favor da vida humana e do desenvolvimento econômico”.

“É preciso por um freio nessa ideologia, ou a humanidade pode terminar vivendo o ocaso da democracia. Nossas repúblicas podem se transformar em relíquias, sem nenhum poder perante a força das empresas transnacionais”, concluiu.

 

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