Paris: ameaça e paranóia persistentes
15-01-2016 - La Jornada,
É necessário que a sociedade francesa exija das suas autoridades uma nova postura, partindo pelo entendimento das raízes históricas do terrorismo.
No dia 7 de Janeiro, quinta-feira da semana passada, ao se recordar o primeiro aniversário do ataque homicida contra a sede da revista satírica Charlie Hebdo – que tirou a vida de 12 pessoas –, a polícia francesa abateu um homem armado que tentou invadir uma delegacia no bairro Goutte d’Or, no norte de Paris. De acordo com as informações, o suposto agressor trazia consigo uma reprodução da bandeira da organização fundamentalista Estado Islâmico (EI) e um colete com explosivos falsos. Minutos antes do tiroteio, num discurso relativo ao atentado contra a Charlie Hebdo, o presidente francês, François Hollande, afirmou que a “ameaça terrorista” sobre o seu país continua sendo “temível”.
O mandatário revelou involuntariamente, com essa afirmação, o carácter inoperante e contraproducente da resposta dada por seu governo contra as agressões do EI. O episódio de ontem forma parte de uma cadeia de agressões e ameaças persistentes, que vem se tornando mais audazes desde o primeiro evento, que foi justamente o ataque à revista satírica. Essas agressões chegaram à sua expressão máxima no dia 13 de Novembro, com os ataques simultâneos na capital francesa que levaram à morte de mais de 130 pessoas, e que logo foram reivindicados pelo grupo fundamentalista.
Diante desses fatos, o governo francês reagiu intensificando suas operações militares nos territórios da Síria e do Iraque. Dessa forma, a França se envolveu numa guerra profundamente imoral e confusa, na qual os aliados ocidentais dizem actuar contra os actos terroristas do EI, mas que, na verdade, se trata de um conjunto de acções reprováveis e incompatíveis com qualquer princípio humanitário, e que, longe de extinguir, alimentam os ressentimentos que incubarão novas acções tão cruéis e bárbaras como as realizadas no dia 13 de Novembro, em Paris.
O episódio de ontem é, em suma, uma prova de que a escalada do belicismo francês não serviu para desativar a ameaça de ataques terroristas. Pelo contrário, a França e a Europa em geral vivem uma onda de pânico e seus habitantes sofrem com o aumento e o endurecimento das medidas autoritárias que os prejudicam. Além disso, como era de se esperar, os atentados serviram também para a reactivação de uma onda reaccionária e xenófoba no velho continente, fortalecendo os discursos dos grupos ultraconservadores – como a Frente Nacional francesa, encabeçada por Marine Le Pen – que pedem o endurecimento da política migratória no país.
A um ano dos ataques contra a Charlie Hebdo, é necessário que a sociedade francesa – que vem manifestando de forma exemplar na sua rejeição à violência e ao fundamentalismo – exija das suas autoridades uma nova postura, partindo pelo entendimento das raízes históricas, económicas, políticas e sociais do terrorismo islâmico, capazes de enfrentar de melhor forma a ameaça fundamentalista, com medidas concretas nesses âmbitos – e não com acções bélicas incendiárias e contraproducentes –, agindo, em suma, com responsabilidade.
Editorial do diário La Jornada, do México
Tradução: Victor Farinelli
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