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Causas e consequências da vitória da oposição na Venezuela

11-12-2015 - Gilberto Maringoni

Será possível reverter o quadro em favor do governo Maduro? Parece difícil, uma vez que o motor da expansão interna, a procura de fora, permanece retraída

1. A derrota do chavismo na Venezuela é daqueles acontecimentos políticos cuja avaliação se estenderá por meses. As lições da perda da maioria na Assembleia Nacional apontam para uma dramática perspectiva no referendo revogatório – mecanismo democrático inscrito na Carta Magna do país, desde 1999 – que terá lugar em 2016.

2. A Venezuela foi palco do mais exuberante processo de negação do neoliberalismo no quadro sul-americano. Foi também o primeiro país a eleger um governante de esquerda, em uma onda que exibiu líderes de variadas matizes progressistas, como Evo Morales, Rafael Correa, Pepe Mujica, o casal Kirchner e – mais ao centro – Lula e Dilma, no Brasil.

3. Esses processos embutiram uma novidade em experimentos à esquerda. Conseguiram combinar um quadro de reformas sociais e expansão económica. Ao contrário de situações mais radicais, como na Rússia dos anos 1920 ou na China na década de 1950, foram dinâmicas que lograram de imediato melhorar a vida de suas populações.

4. A vida ganhou qualidade na América do Sul em geral, mas de forma mais acentuada nesses lugares. O motor da expansão e de um breve interregno desenvolvimentista foi impulsionado pela demanda externa por commodities, como se sabe. O salário real aumentou, bem como as taxas de emprego e crédito. Uma alta do consumo de bens duráveis – em especial entre 2005-10 – foi a expressão maior desses tempos.

5. Na Venezuela, na Bolívia e no Equador, a vida democrática foi potencializada por mudanças reais na seara institucional. Novos pactos de convivência cidadã se expressaram na reconstitucionalização dos países, com ampliação de direitos e garantias, especialmente para os sectores mais pobres e vulneráveis.

6. A força motriz do alargamento da democracia foi a percepção de mudanças na vida quotidiana de cada um. A mola mestra das derrotas que vêm acontecendo na Argentina, na Venezuela e – prevê-se – no Brasil embutem a mesma lógica em sentido inverso. Com a sensação de piora na qualidade de vida, o desejo de negação de “tudo o que está ai” torna-se força politica objectiva.

7. Com todos os avanços dos últimos 17 anos, a Venezuela – e os demais países – não alteraram sua inserção no mundo globalizado. Reafirmamos uma sina que nos persegue ao longo dos últimos cem anos: somos fornecedores de matérias-primas e importadores de bens duráveis e de capital.

8. No caso venezuelano, o petróleo respondia por 95% da pauta exportadora no final dos anos 1990. Hoje, o produto atende 97% dessa agenda.

9. Com a queda acentuada dos preços nos últimos anos – hoje, o produto é cotado a menos de um terço do preço de 2007 – a situação tornou-se dramática.

10. Para resumir, em um país no qual a arrecadação fiscal soma pouco mais de 10% do PIB – no Brasil representa 36% – o óleo negro é a garantia primeira e última do financiamento do Estado. Não há indústrias e nem diversificação produtiva que possa garantir o bom desempenho das contas públicas. Venezuela é sinónimo de petróleo.

11. Por que o chavismo, em seu auge – entre 2005-10 – não logrou expandir a economia para outros ramos de actividade? Essa é a questão central a ser colocada.

12. Isso demandaria um esforço brutal por parte do Estado, uma vez que a Venezuela tem uma economia pequena, em termos relativos, e um mercado interno também diminuto. Qualquer investimento de monta tem de ser feito pelo poder público.

13. Mesmo assim, investir em industrialização representaria desviar um montante de capital aplicado em programas sociais e em outras esferas da economia, com retorno extremamente lento. É muito mais barato importar automóveis e electro electrónicos do que colocar fábricas de pé, investir em tecnologia em negócios cujo prazo de maturação se estenderiam por mais de uma década.

14. Evidentemente que não são apenas objectivas as causas da derrota desse fim de semana. A liderança de Nicolas Maduro – menos expressiva do que a de Hugo Chávez – também conta. Situações como escassez de géneros de primeira necessidade – expressão da crise cambial crónica – e aumento da violência pesam e muito na definição de voto.

15. O exame dos mapas eleitorais ajudará a entender a extensão da derrota. É bem possível que quem tenha dado a vitória à direita sejam os sectores mais pobres, históricos apoiantes do chavismo.

16. Será possível reverter o quadro em favor do governo Maduro? Parece difícil, uma vez que o motor da expansão interna, a demanda de fora, como já falado, permanece em retracção.

17. Mesmo assim, a vida política venezuelana da última década e meia servirá como ponto de apoio para uma futura retomada do impulso à esquerda. Enquanto isso, as praças financeiras do mundo comemoram.

 

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