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Cameron: “poderemos cumprir com as promessas do nosso programa”

15-05-2015 - Marcelo Justo

A participação eleitoral representou somente 66% do eleitorado. Os que deixaram de votar são os que mais deverão sofrer com as políticas conservadoras.

A extraordinária vitória dos conservadores, a avalanche de votos a favor dos nacionalistas escoceses do SNP, o pobre desempenho dos trabalhistas de Ed Miliband e o paupérrimo resultado dos liberal-democratas desafiaram as previsões de todas as sondagens e deixaram uma fila de cadáveres políticos de alto calibre. Enquanto um sorridente David Cameron reivindicava sua estratégia política, com uma maioria de 331 parlamentares, que lhe permitirá governar sem fazer alianças, os dois grandes derrotados, o trabalhista Ed Miliband e o liberal-democrata Nick Clegg renunciaram às respectivas presidências dos seus partidos. Com a Escócia dominada por separatistas, Gales pelos trabalhistas e Inglaterra pelos conservadores, à excepção de Londres e do norte do país, a eleição deixa um Reino Unido mais desunido que nunca.

Radiante, com uma vitória tão contundente quanto inesperada, mas consciente das profundas divisões do país, o primeiro-ministro David Cameron prometeu no seu discurso, na porta nº 10 de Downing Street, voltar a unir o Reino Unido. “Como governo com maioria própria, poderemos cumprir com as promessas do nosso programa… Vamos governar para todo o Reino Unido. Queremos que todos tenham uma oportunidade. E, com certeza, temos que harmonizar a relação entre as diferentes nações do nosso Reino Unido. Queremos implantar uma relação que entregue mais benefícios para Gales, Escócia e Irlanda do Norte”, disse Cameron.

A vitória de Cameron é assombrosa, não só porque ninguém previu essa vantagem, mas também porque o seu governo impôs como tema central a necessidade de um novo ajustamento dos gastos nas despesas sociais, até conseguir a eliminação do deficit fiscal, o que, segundo asseguram os conservadores, seria decisivo para o crescimento económico. Aquele programa suavizado, com promessas de redução de impostos, aumento da pensão estatal e maior investimento no Serviço Nacional de Saúde, brilhou por sua ausência no discurso dado ontem pelo primeiro-ministro reeleito. O respeitado Instituto de Estudos Fiscais publicou parecer, durante a campanha, mostrando que era impossível acabar com o deficit e reduzir a carga de impostos ao mesmo tempo, e ainda por cima elevar os gastos em sectores importantes como saúde, pensões e a prometida renovação do caríssimo sistema nuclear Trident.

Em seu discurso, o primeiro-ministro confirmou que cumpriria sua promessa eleitoral de promover um referendo sobre a continuidade do Reino Unido na União Europeia (UE), em 2017. A iniciativa visa acalmar os eurocépticos e evitar um futuro êxodo eleitoral em favor do partido que propõe a separação britânica da UE – o UKIP, terceira força em percentagem de voto popular, o que representa um perigo duplo, uma legenda que cresce e que ganha apoio nas massas.

O Reino Unido poderia votar a favor de abandonar a UE, grande temor do sector empresarial e financeiro, e se aventurar a um incerto panorama futuro. Internamente, a consulta pode reabrir as feridas que dividiram o partido conservador entre europeístas e eurocépticos, durante os Anos 90. Uma disputa que levou a legenda a derrota eleitoral mais desastrosa de sua história, em 1997 – cinco anos antes, os conservadores havia tido uma vitória com vantagem ampla, semelhante a desta última quinta, e inclusive com o mesmo condimento das pesquisas indicando cenário apertado na véspera.

Do lado trabalhista, a derrota terminou com o sonho de Ed Miliband de chegar ao nº 10 da Downing Street, e também é o fim das carreiras de pesos pesados do partido, como Ed Balls e Danny Alexander, ambos ministros durante o governo de Gordon Brown. Miliband apostou numa guinada à esquerda moderada, com uma campanha que destacava a agenda social. A ideia fracassou. A autópsia desse fracasso começou com a renúncia de Miliband à liderança partidária.

A chamada “direita” do partido, sector ligado a Tony Blair, acusará essa viragem à esquerda de ser responsável pela derrota, alegando que não caem bem num país com as características do Reino Unido. Segundo essa visão, o centrismo do ex-primeiro-ministro ganhou três eleições sucessivas para o trabalhismo: 1997, 2001 e 2005. Um feito único nos mais de 100 anos de história da legenda, que alcançaram porque conseguiram vencer no importante sul do país, e formaram uma ampla aliança de classes sociais ao seu redor. “Os trabalhistas perderam e não puderam recuperar o apoio da classe C2, os trabalhadores qualificados. Carecem de uma mensagem que fale com esse público que tem aspirações. Mais educação e menos foco nas contas da electricidade, mais construção de propriedades que ajuda social”, comentou nesta sexta-feira (8/5) o analista político Andrew Neather, no diário vespertino Evening Standard.

Uma análise alternativa da performance trabalhista critica a moderação dessa viragem à esquerda de Miliband, que aceitou os limites impostos pela agenda conservadora, como a redução do deficit fiscal. O ex-prefeito de Londres, Ken Livingstone, afirmou que o trabalhismo não deveria voltar às políticas centristas do Blairismo. “Perdemos o voto da classe trabalhadora nos anos do Novo Trabalhismo de Blair, porque não nos preocupamos mais por suas condições de trabalho, por suas moradias, e pela educação de seus filhos. Não vamos recuperar esses votos voltando a virar as costas para esse mundo”, disse Livingstone.

Os liberal-democratas pagaram caro pela coligação que formaram com os conservadores em 2010, que os obrigou a apoiar um programa de drástica redução de gastos e deixar uma enorme lista de promessas não cumpridas. Em 2010, eles haviam ganhado 57 cadeiras no parlamento: nesta eleição, terminou reduzido a somente oito deputados. A derrota de figuras importantes mostra a profundidade do desastre. Os ex-ministros Vince Cable (da Indústria), Danny Alexandre e Simon Hughes (ambos do Tesouro, o segundo também foi presidente do partido), não puderam se eleger, em derrotas directas para os conservadores, os nacionalistas escoceses e os trabalhistas, respectivamente.

O sistema eleitoral não proporcional britânico contribuiu para que essas derrotas se tornassem ainda mais contundentes. A realidade é que, com 36,9% dos votos, os conservadores obtiveram mais da metade das cadeiras em disputa, enquanto o terceiro partido em quantidade de votos, o ultranacionalista UKIP, com quase o dobro do apoio registado pelos liberal-democratas obtiveram somente um deputado, contra 8 do partido de Clegg. O parlamentarismo britânico fez com que Nigel Farage renunciasse à chefia do UKIP, por não poder ganhar mais espaço no parlamento.

Esse sistema favorece o bipartidarismo e a apatia eleitoral. Na quinta, a participação eleitoral foi a mais alta desde 1997, mas que representou somente 66% do eleitorado. Os que deixaram de votar são os que mais deverão ser golpeados pelas políticas conservadoras. Segundo uma ONG que organiza bancos de alimentos para os sectores que sofreram efeitos dos cortes de gastos, entre 2011 e 2012, cerca de 128 mil pessoas buscaram os centros, por necessidade. A cifra, no ano seguinte a esse período, foi o triplo. Este ano, se estima que as entregas de alimentos subsidiados aumentarão em 38%.

 

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