8 razões pelas quais o preço do petróleo está voltando a subir
20-02-2015 - Nazanín Armanian
Apesar da conspiração entre árabes e americanos para baratear o petróleo e pressionar economicamente a Rússia, Irão e Venezuela, os preços voltam a subir.
Se ainda alguém não sabe, a Aramco – a empresa de petróleo da Arábia Saudita, e também a maior do mundo –, até bem pouco tempo, em 1977, se chamava Arabian American Oil Co., sendo de propriedade comum entre a família saudita e várias empresas da Califórnia e do Texas. Por isso, não se pode ficar surpreso se a dupla Washington-Riad tiver algo a ver com a queda brusca dos preços de 115 dólares o barril para 45 dólares entre Junho e Dezembro passados, levando em conta que o mercado de petróleo não é “livre”: ele é controlado por um cartel chamado OPEP e por grandes empresas petrolíferas ocidentais. E mais, o combustível gorduroso e malcheiroso, antes de tudo, é uma arma que nesse caso foi apontada contra a Rússia, o Irão e a Venezuela com a finalidade de conseguir mudanças em suas políticas via afundamento de suas economias, e ainda resgatar um falecido petrodolar – um dos pilares da hegemonia mundial dos EUA.
No entanto, a festa durou pouco e os promotores da “conspiração Aramco” se deram conta de que os prejuízos dessa queda de preços são maiores do que seus benefícios político-económicos. Por isso, o preço de venda do petróleo para o mês de Março teve uma notável melhora nos três mercados de Brent, dos EUA e da OPEN, oscilando por volta de 59 dólares o barril.
Aqui vão alguns motivos:
1. Os membros dos Brics, com excepção da Rússia, foram os principais agraciados pela compra de um petróleo barato.
a) China, o principal rival dos EUA e o segundo consumidor mundial de petróleo, bateu seu recorde de importações de petróleo, apesar de seu crescimento económico ter sido o mais fraco desde 1990 (mas registou, no primeiro trimestre de 2014, um crescimento de 7,2%): começou a comprar 6,2 milhões de barris por dia, e acabou o mês de Dezembro com 7,2 milhões de barris por dia, injectando-os em sua Reserva Estratégica de Petróleo (o armazenamento ocorre para afrontar as emergências, como a interrupção do abastecimento). Com isso, a China não só deixou os EUA nervosos, mas contribuiu para empurrar os preços para o alto, por dois outros factores: tirar boa parte do excedente de petróleo que nadava no mercado e gerar incerteza sobre seu passo seguinte no mercado.
b) Beneficiou o Brasil, a principal potência rival dos EUA na América, e que agora está decidida a recuperar sua influência no seu “quintal”, e a África do Sul, o principal competidor de Washington na África. Os Brics decidiram abandonar o dólar em suas transacções e criaram um banco com a finalidade de debilitar as instituições financeiras ocidentais.
2. Não conseguir mudar a postura de Moscovo nos casos da Ucrânia, Crimeia e Síria. Pois se os sectores belicistas ocidentais desferiram o primeiro ataque à Rússia, provocando um golpe de Estado na Ucrânia, levando à surpresa da integração da Crimeia à Federação Russa, eles pensaram que uma drástica queda nos preços do petróleo – triturando o rublo e a economia russa – fosse provocar a rendição do Kremlin. Estratégia ruim, já que o golpe à economia do país eslavo, assim como a dramática guerra da Ucrânia, deixou cerca de 6 mil mortos e milhões de desabrigados, e teve um efeito negativo sobre os países europeus aliados de Washington, que enfrentam uma ameaça de recessão: estão perdendo o mercado russo e também os investimentos, tanto dos magnatas russos como de seu Estado. Na Espanha, por exemplo, os milionários russos estavam comprando prédios inteiros herdados da era da especulação mobiliária. Além disso, é incompreensível que não previssem uma aproximação Moscovo-Pequim (sem precedentes após a morte de Stalin) e Moscovo-Teerão: os presidentes Vladimir Putin e Hassan Rouhani, que compartilham o sofrimento pelas sanções impostas pelos EUA e seus sócios, assim como pela “Conspiração Aramco”, tiveram quatro encontros em um ano, algo também sem precedentes na história dos dois vizinhos.
3. Quanto ao Irão, não conseguiram pressioná-lo para conseguir mais vantagem nas negociações nucleares em curso e subtrair suas forças na região porque:
a) Teerão não deixou de apoiar o governo de Bashar al-Assad (a Síria representa a profundidade estratégica do Irão enquanto ele está no poder), e inclusive já fala abertamente dos generais iranianos que trabalham em solo sírio;
b) Nem aceitou o fecho total de seu programa nuclear, e isso apesar de John Kerry ter lançado um ultimato a Teerão para assinar um acordo político global até o final de Março – se não, não retomariam as negociações. O certo é que a administração Obama está muito consciente da luta pelo poder no seio da República Islâmica entre os sectores militares – contrários a um acordo com os EUA – e o governo do presidente Rouhani, que tenta, por um lado, driblar as sanções que estão afogando a economia iraniana e, por outro, evitar um confronto bélico (tentou baixar a tensão depois que o míssil israelita matou um general iraniano na Síria, no último dia 20 de Janeiro). Se Obama pretende impedir um Irão nuclear, um petróleo com preços no chão, aumentará a tensão social em um Irão mono produtor e fortalecerá a posição dos cépticos e dos sectores que querem guerra (assim como EUA e Israel). As medidas de Rouhani diante da manobra da Aramco foram incentivar a exportação dos produtos não petrolíferos, investir no turismo, aumentar os impostos, manter os subsídios aos principais produtos de consumo e a ajuda às famílias desfavorecidas, além de uma política externa agressiva na região com um ramo de oliveira nas mãos – que inclui sobretudo os países árabes “inimigos” e membros da OPEP, como Kuwait ou Catar.
4. A perda de centenas de milhões de dólares por parte das grandes empresas petrolíferas ocidentais, como as que operam no Iraque, Líbia, Nigéria, entre outros.
5. O déficit orçamentário gerado pela queda do preço do petróleo criou dificuldades para os xeiques sauditas, em pelo menos estes três cenários:
a) No interior do país: seus orçamentos foram elaborados com base no barril de 72 dólares, e agora se enfrenta um aumento importante dos preços dos produtos básicos. Além disso, previu-se, desde a repressão da primavera de 2011, realizar uma série de projectos que melhorariam a vida dos cidadãos – como a construção de moradias, a criação de postos de trabalho, ou a chegada de água e luz a milhões de pessoas que vivem na pobreza absoluta – e que agora estão paralisados.
b) No Egipto: a promessa feita em 2011 aos militares encabeçados pelo general Al-Sisi de receber 160 biliões de dólares anuais acaba com a Irmandade Muçulmana do presidente Mohammed Mursi, preso após o golpe de Estado. O que acontecerá no Egipto, seu grande aliado contra Irão, se não cumprir?
c) No Iraque e na Síria: dificuldade para pagar os honorários de milhares de jihadistas do Estado Islâmicos e grupos parecidos, cuja missão é acabar com os governos de Damasco e de Bagdad, ambos próximos a Teerão, e arrastar o Irão para uma guerra regional sectária. Desde 2011 até hoje, investiu bilhões de dólares nesses terroristas, com um êxito parcial: destruiu o Estado sírio, mas ainda não conseguiu levantar um novo e afim.
6. Nos EUA, dois factos contribuíram para o aumento dos preços do barril:
a) Os cortes nos investimentos de capital por parte das multinacionais na extracção do petróleo de xisto como resposta à queda dos preços. Pois cada barril lhes está custando entre 70 e 80 dólares (diante dos 15-20 dólares no Oriente Médio) e um petróleo por menos desse preço, obviamente, não é rentável. Com isso, nos EUA e no Canadá, cerca de 90 plataformas de exploração fecharam. BP perdeu bilhões de dólares em todo o mundo e planeja reduzir suas actividades de exploração à metade e os investimentos até 20%. A Chevron está em situação parecida.
b) A greve de cerca de 4 mil trabalhadores das empresas Royal Dutch Shell Oil e BP em nove refinarias em Ohio, Califórnia, Kentucky, Texas e Washington, iniciada em 1° de Fevereiro. Exigem um convénio colectivo para o sector, a redução do número de trabalhadores não sindicalizados e melhorias nas condições de segurança e saúde, em uma greve que é a primeira dessa envergadura há várias décadas.
7. O aumento da tensão na Líbia e a perda de 800 mil barris em um incêndio.
8. O perigo de instabilidade social em países aliados aos EUA, como Iraque (incluindo seu Curdistão) ou Nigéria, pela queda dos petropreços.
O único e grande triunfo dos EUA e da Arábia Saudita nessa história até o momento foi transformar a OPEP em espectro do que foi entre 1960 e 1990, e não apenas porque sua cota de mercado caiu de 62% para os 30% de hoje, mas porque a Arábia, o Kuwait e os Emirados Árabes Unidos fizeram uma frente contra pesos pesados da organização, tais como Irão, Iraque, Argélia, Venezuela e Equador.
Os preços do petróleo tocaram fundo. É perfeitamente lógico que o “Naft” (seu nome em persa, e do qual vêm palavras como “naftalina”) não apenas recupere seu preço – que hoje é mais barato do que uma garrafa de bom vinho –, mas também seu valor: é o resultado de milhões de anos do esforço “não renovável” da natureza.
Nazanín Armanian
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