Efeitos do petróleo barato: benção ou maldição?
30-01-2015 - Tossan
Os preços do petróleo vão manter-se baixos por muito tempo?
Trata-se do tema do momento em todo o mundo: os preços do petróleo perderam mais de metade do seu valor no último ano, encontrando-se neste momento abaixo dos $50 USD por barril, em ambiente de grande volatilidade.
As causas desta queda são múltiplas e complexas, mas é possível afirmar-se que se trata de um choque do lado da oferta, existindo no mercado mais petróleo do que a procura pode absorver, o que dita a inevitável queda dos preços.
Os factores que levaram ao aumento da oferta são conhecidos há algum tempo, e prendem-se com evoluções tecnológicas, possíveis devido à prolongada alta de preços, e que permitiram explorar e extrair reservas de petróleo de acesso complexo e dispendioso, como o gás e petróleo de xisto dos EUA, as areias betuminosas no Canadá ou a exploração de águas ultra-profundas do Brasil.
Este choque do lado da oferta, combinado com as persistentes dificuldades das economias europeia e japonesa e o crescimento sucessivamente revisto em baixa da China, bem como a crescente eficiência energética impulsionada pelos preços elevados e pelas políticas dos países, pressionando a
procura, são factos há muito conhecidos. A novidade nos últimos seis meses surgiu na tomada de posição pela Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP), e em particular pelo seu maior exportador, a Arábia Saudita, que afirmou que o seu governo está empenhado em preservar a sua quota de mercado, baixando os preços para garantir a sua posição, o que alterou dramaticamente a dinâmica do mercado.
De acordo com uma análise recente do Banco Mundial, os níveis actuais de preços deverão manter-se durante o corrente ano, e possivelmente durante 2016, pressionados por duas tendências principais.
Por um lado, as preocupações relativamente à resiliência da economia global, e ao seu fraco crescimento, não deverão dissipar-se rapidamente. Espera-se que o crescimento europeu se mantenha fraco nos próximos anos, cenário que o Banco Central Europeu tenta contrariar com as medidas de estímulo monetário lançadas esta semana, ainda com resultados incertos. Igualmente os cenários de crescimento da economia da China têm apresentado visões sucessivamente mais moderadas. Por outro lado, a produção que será agora reduzida por efeito dos preços baixos, poderá ser retomada a qualquer momento, assim como a nova produção dos investimentos em curso.
Esta situação encontra paralelo no colapso de preços que se verificou nos anos 80, entre 1985-1986, quando a Arábia Saudita, então o maior exportador de petróleo mundial, tomou medidas para proteger a sua quota de mercado face às evoluções tecnológicas que impulsionaram fortemente a produção em campos offshore, como o Mar do Norte e Alasca. A queda dos preços foi superior a 60% na primeira metade de 1986, mantendo-se uma tendência de preços baixos durante os 15 anos seguintes.
Teremos que esperar para ver se também aqui a história se repete…
Qual o efeito de uma baixa prolongada do preço do petróleo na economia portuguesa?
Os efeitos do petróleo barato serão bons ou maus dependendo de que lado se encontra cada país: do lado dos exportadores ou do lado dos importadores.
O Banco Mundial estima ganhos líquidos para o crescimento económico global, apesar do efeito negativo nas economias dos países fortemente dependentes das exportações de petróleo e com reservas financeiras reduzidas, caso da Venezuela, Angola ou Nigéria. Estes países terão que diversificar as suas economias e cortar nos subsídios, nomeadamente aos combustíveis, o que poderá reduzir a sua produção no futuro, mas também a sua dependência de uma só fonte de receitas.
Portugal é um importador líquido de petróleo, pelo que preços mais baixos nas compras deverão significar que os consumidores terão mais dinheiro para gastar, impulsionando a economia.
Mas preços mais baixos poderão igualmente provocar pressões deflacionárias, aumentando o risco de recessão, razão para as medidas de estímulo agora lançadas pelo Banco Central Europeu, que têm como efeito último a libertação de mais recursos financeiros paras as famílias e para as empresas e consequente aumento de consumo e investimento.
O saldo global para Portugal deverá ser no entanto positivo, lançando maior optimismo para o crescimento da economia portuguesa em 2015, sendo que a Universidades Católica reviu recentemente as estimativas de crescimento do PIB de 1,9% em 2015, significativamente acima dos 1,3% estimados anteriormente.
Qual o efeito de uma baixa prolongada de preços do petróleo nas empresas energéticas portuguesas?
Uma baixa prolongada de preços de petróleo deverá beneficiar a economia portuguesa e a generalidade das empresas, que deverão sofrer um alívio na sua factura energética, podendo canalizar recursos financeiros para investimentos e melhorar a rentabilidade dos seus negócios.
No caso de duas das maiores empresas cotadas na Bolsa portuguesa, a EDP e a Galp Energia, deverão sofrer com maior intensidade os efeitos da baixa dos preços do petróleo.
A EDP será maioritariamente afectada pelos preços do gás natural que consome nas suas centrais térmicas, e cujo preço, embora com desfasamento temporal face ao petróleo, está a ter um comportamento em baixa.
Esta baixa de custo do gás terá como efeito um decréscimo significativo dos custos de produção das centrais a gás natural, sendo que esta diferença poderá ser repassada para os consumidores na medida em que os contratos e a regulamentação em vigor o permitam. O efeito para a EDP dependerá da rapidez com que tal acontecer, podendo até lá a poupança de custos permanecer na empresa, contribuindo para os seus resultados e para sua valorização.
Apesar de ter realizado uma aposta importante na exploração e produção de petróleo, a Galp Energia é um importador líquido, sendo que a produção ronda ainda os 10% das necessidades das refinarias portuguesas, embora o plano de negócios da empresa aponte para que este número cresça para próximo dos 100% em 2020.
Assim sendo, o efeito principal da baixa de preços não será no imediato, mas sim na expectativa da empresa do crescimento da sua produção de petróleo, que tem suportado a valorização bolsista da Galp, representando cerca de 70% do seu valor em Bolsa.
Nos recentes anos, a Galp efectuou investimentos significativos na produção de petróleo em Angola e no Brasil, encontrando-se em fase final de decisão de investimentos importantes em Moçambique, que poderão agora estar em risco, por via da baixa de preços. Os potenciais atrasos no desenvolvimento dos projectos no Brasil, provocados pelo escândalo de corrupção da operação
“Lava-Jato” que envolveu a Petrobras, parceira da Galp, poderão igualmente impactar de forma negativa os seu resultados.
No curto prazo a Galp irá beneficiar de ser uma empresa integrada, presente em todas as fases da cadeia de valor, desde a produção de petróleo à refinação e distribuição de produtos petrolíferos e gás natural.
A produção de petróleo, e a refinação e distribuição de combustíveis, têm historicamente um comportamento em contra-ciclo, esperando-se que as perdas na produção venham a ser compensadas por ganhos nas margens de refinação e no crescimento da procura de combustíveis.
Não sendo ainda claro qual a resposta dos consumidores à diminuição de preços, optando por maiores consumos de combustíveis ou decidindo-se pela aplicação da poupança em outras compras,
é cedo ainda para avaliar se a procura acrescida e a melhoria das margens de refinação serão sustentáveis e suficientes para compensar a Galp por perdas e adiamentos no segmento de Exploração e Produção.
Este é um desafio para a nova gestão da empresa a ser nomeada em breve e para os seus accionistas de referência (Amorim, Sonangol e Isabel dos Santos), que terão que demonstrar que a aposta e os investimentos realizados na produção de petróleo serão capazes de transpor o período de tormenta e assegurar a rentabilidade e valorização da empresa no médio prazo.
Voltar |