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Estados Unidos, Direitos Humanos e a Guerra de Israel Contra a Palestina

04-06-2021 - Jeffrey D. Sachs

A tentativa de Israel de justificar seu mais recente e brutal ataque a Gaza parece inócua  para qualquer pessoa familiarizada com os acontecimentos em Israel, onde o governo do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu, apoiado por racistas anti-árabes, violou sistemática, cruel e persistentemente os direitos humanos básicos da população árabe. A Human Rights Watch, uma ONG global com muitos líderes judeus, condenou  Israel recentemente por crimes contra a humanidade.

O comportamento de Israel coloca o governo do presidente americano Joe Biden, que professa, sob os holofotes, uma política externa baseada nos direitos humanos. Se esse compromisso for genuíno, o governo deveria apoiar uma investigação independente da ONU sobre as violações dos direitos humanos de Israel contra a população árabe e suspender a ajuda militar a Israel até que o inquérito fosse concluído e os direitos humanos dos palestinos fossem assegurados.

Os antecedentes dos recentes ataques aéreos e de artilharia de Israel em Gaza foram as ameaças israelenses de expulsar os palestinos de suas casas no bairro Sheikh Jarrah em Jerusalém Oriental e a violência provocada por Israel na Mesquita de al-Aqsa, um dos locais mais sagrados do Isláo. Os israelitas de direita marcharam por Jerusalém Oriental gritando "morte aos árabes". O lançamento de foguetes de Gaza logo se seguiu, o que pode muito bem ter sido o objectivo de Netanyahu, que está batalhando por sua vida política em face de um iminente julgamento por corrupção, além de fomentar e explorar o ódio antiárabe, do qual há muito vem se utilizando para perseguir e manter o poder.

Como judeu, estou profundamente perturbado com a imprudente violência anti-árabe de Israel, que vai contra o próprio cerne da ética judaica. O Talmud diz que: “Quem salva uma única vida é considerado pelas Escrituras como tendo salvado o mundo inteiro”. O grande sábio Hillel observou  que toda a Torá (lei judaica) poderia ser resumida em uma única frase: "O que é odioso para ti, não o faças a outrem”.

O implacável bombardeio de Israel em Gaza, causando sofrimento em massa e matando pessoas inocentes, incluindo pelo menos 63 crianças, viola ambos os princípios. Políticos corruptos e egoístas como Netanyahu costumam se proteger sob vestes religiosas para encobrir seus actos malévolos. No processo, eles contrariam seriamente a religião.

Netanyahu afirma estar agindo em nome do povo judeu. Ele, certamente não está. Muitos judeus em todo o mundo, inclusive eu, desprezam a política racista de Netanyahu.

Como americano, também estou profundamente preocupado com o apoio automático do governo dos EUA a Israel. Felizmente, não estou sozinho nessa visão. Um número crescente  de congressistas democratas, judeus e não judeus, apelou aos Estados Unidos para pararem de apoiar a ilegalidade de Israel. A verdade é que o apoio sem discernimento do governo dos EUA a Israel passou a depender mais dos cristãos evangélicos, como o ex-secretário de Estado Michael Pompeo, do que dos judeus americanos, que estão profundamente divididos pelas acções de Netanyahu. E o real interesse dos evangélicos no sionismo não é a segurança dos judeus, mas o Armagedão, o fim do mundo, que eles acreditam que virá somente quando todos os judeus estiverem em Israel.

Além disso, o cheque em branco que o ex-presidente Donald Trump deu a Israel nos últimos anos encorajou o racismo extremo em partes da sociedade israelita, junto com um sentimento entre os líderes israelitas de que nenhum abuso que cometam ou admitam abalará o apoio do governo dos EUA. A linguagem do ódio, exclusão racial e pogroms é invocada com muita facilidade entre a direita israelita. A dor e a perda dos palestinos foram poderosamente descritas por meu ilustre colega da Universidade de Columbia, Rashid Khalidi, em sua nova história do conflito, The Hundred Years’ War on Palestine (A Guerra dos Cem Anos contra a Palestina).

recente relatório da Human Rights Watch  sobre a política israelita em relação aos árabes de Israel e à Palestina ocupada chega a uma conclusão nítida e reveladora:

“Metodicamente, as autoridades israelitas privilegiam os judeus israelitas e discriminam os palestinos. Leis, políticas e declarações de importantes autoridades israelitas deixam claro que o objectivo de manter o controle israelita judaico sobre a demografia, o poder político e a terra há muito orienta a política governamental. Em busca desse objectivo, as autoridades desapropriaram, confinaram, separaram à força e subjugaram os palestinos em virtude de sua identidade em vários graus de intensidade. Em certas áreas, conforme descrito neste relatório, essas privações são tão graves que equivalem aos crimes contra a humanidade do apartheid e da perseguição.”

Se o governo Biden quer cumprir a lei internacional de direitos humanos, não pode apontar o dedo para a China e depois dar passe livre a Israel, que de fato depende de apoio financeiro e munições fornecidas pelos EUA. Os direitos humanos são direitos humanos e fazem parte do direito internacional ao abrigo da Carta das Nações Unidas. Se o caso é Xinjiang e os uigures, Mianmar e Rohingya, ou Israel e os árabes palestinos, a maneira correcta de defender o direito internacional é por meio das Nações Unidas, começando com uma investigação independente sob os auspícios do Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Nesse ínterim, também darei um conselho económico simples: uma maneira poderosa de impedir o mau comportamento no futuro é aumentar os custos. Em vez de mais uma conferência de doadores na qual os EUA, o Reino Unido, a União Europeia e outros países prometem fundos para pagar pela reconstrução de Gaza, é hora de obrigar Israel a pagar pela reconstrução de Gaza. Os escassos fundos de doadores internacionais deveriam ser usados ​​para ajudar as pessoas mais pobres do mundo, não para subsidiar a reiterada e gratuita destruição.

JEFFREY D. SACHS

Jeffrey D. Sachs, Professor da Universidade de Columbia, é Diretor do Centro para Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Columbia e Presidente da Rede de Soluções de Desenvolvimento Sustentável da ONU. Ele serviu como conselheiro de três Secretários-Gerais da ONU e actualmente atua como Advogado ODS sob o Secretário-Geral António Guterres. Seus livros incluem The End of Poverty, Common Wealth, The Age of Sustainable Development, Building the New American Economy, A New Foreign Policy: Beyond American Exceptionalism e, mais recentemente, The Ages of Globalization.

 

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