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ONDAS DE CHOQUE PROVOCADAS PELA PANDEMIA

28-08-2020 - Neto Simões

A pandemia provocada pelo covid-19 é uma crise de muito difícil resolução e de consequências imprevisíveis do ponto de vista sanitário, político, económico, social e de segurança.

Esta talvez seja a provação mais dura de entre as grandes calamidades epidémicas. Porém, esta nova normalidade está a desfocar crises políticas e conflitos disseminados por todos os continentes.

Não sabemos aquilo em que nos tornaremos – como indivíduos e comunidades, tendo em conta as ondas de choque provocadas em todo o Mundo.

V ivem-se tempos de excepção e de incerteza para os quais não estávamos minimamente preparados ou suficientemente apetrechados – nem países, nem governos, nem instituições, nem cidadãos.

Para podermos sobreviver como países temos de nos unir, tendo em vista três realidades: reparar os danos colaterais do covid-19; reformar as economias; e reflectir como vamos sobreviver em sociedade, que tem de ser remodelada com base do papel mais activo dos recursos humanos na inovação.

A actual pandemia sendo um desafio global – só globalmente poderá ser resolvido - devia ter tido uma estratégia global para lhe fazer frente com uma maior cooperação e solidariedade entre regiões e Estados.

Enquanto alguns países negaram evidências e a seguir a redução dos contactos sociais, outros decretaram confinamentos, mais ou menos rigorosos, que poderão voltar com uma eventual segunda vaga.

No entanto, nos desconfinamentos tem existido falta de critério – sem o necessário faseamento -, alguma histeria, falta de racionalidade e falta de adesão à realidade com um discurso político contraditório e sem sintonia com a comunidade científica. Que também não se entende quanto à origem da doença. Esta situação tem induzido a ausência de confiança dos cidadãos provocando desconexão entre a autoridade do Estado e a sociedade com danos reputacionais.

Tem-se constatado ainda falta de capacidade de planeamento estratégico na maioria dos países incluindo Portugal. Além disso, a postura inusitada de muitos Estados é reveladora de enorme egoísmo!

Na acelerada dinâmica de contaminação identificam-se indícios que novos alinhamentos apontam para possibilidade de mudanças ou aceleração de tendências na geopolítica internacional. E os principais riscos de longo prazo são geopolíticos e provenientes da Rússia, China, Médio Oriente e do ciberespaço.

A pandemia terá consequências no quadro macro da geopolítica global, mas antecipá-las continua a ser um desafio. Um golpe final no multilateralismo? Um novo paradigma da globalização? E uma crescente bipolarização entre EUA e China que poderá ter contornos de uma nova “guerra-fria”.

A tendência é de uma aceleração da competição estratégica das duas potências pela supremacia do século XXI a vários níveis: económico, modelo social, disputa pela influência sobre outros Estados ou regiões e luta pela influência tecnológica. E a pandemia funciona como um teste para uma nova ordem mundial, cuja liderança os EUA abdicaram.

Acresce, ainda, que o impacto da crise nos respectivos sistemas e líderes pode favorecer certos regimes mais autocráticos (China, Coreia do Norte e Rússia) ou fazer questionar certos modelos e procedimentos mais democráticos .

O futuro próximo obrigará à de fi nição de prioridades no emprego das disponibilidades fi nanceiras dos Estados, que terão de reforçar os sistemas de saúde e a aumentarem os seus orçamentos nessa área em detrimento de outros sectores. A resposta face a pandemias passará assim a ser também uma prioridade de segurança nacional.

Todavia, será de avisada prudência não deixar de investir nas Forças Armadas e Forças de Segurança, pois já demonstraram ser essenciais no apoio às crises pandémicas.

A actual pandemia, o colapso económico e financeiro e social associado são o maior desafio da UE e de Portugal. Nesse sentido, agudizou-se a percepção que a UE revela falta de coesão e solidariedade e tem muito pouca influência na dinâmica internacional, pois não foi capaz de ter uma solução concertada.

A única surpresa foi a sua resposta a nível económico – ainda não concretizada - com o plano de recuperação (iniciativa franco-alemã), que constitui a última oportunidade para salvar o projecto europeu.

Mas sem a aprovação pelo Parlamento Europeu e sem capacidade de cooperação a recuperação económica e social será uma miragem!

Contudo, nesta pandemia foram os Estados membros que tiveram de intervir para apoiar as populações; esta situação poderá contribuir para os populismos e aceleração dos nacionalismos e isolacionismos.

Para a UE a única forma de evitar o seu declínio será, através do reajustamento de políticas e instituições, da reindustrialização, da reposição do mercado único, da transformação digital, da transição energética e economia verde.

Há lições a reter, nomeadamente a preservação do Estado como garantia de mínimos sociais e regulação e intervenção no mercado com um papel mais activo; novos conceitos de territorialização e de liberdade; uma UE que permita o seu renascimento minimizando as assimetrias; alteração d o paradigma da globalização, tendo em conta que o processo de interdependência e integração do sistema económico mundial será afectado; a reemergência das fronteiras é algo que poderá ser temporário, mas vai afectar a mobilidade mundial; reindustrialização e reconfiguração das cadeias logísticas; descoberta de novas dinâmicas laborais,  como o teletrabalho, ferramentas de videoconferência, entre outras; a transformação digital será incrementada, bem como a transição energética e economia verde.

Por último, esta crise sanitária veio evidenciar uma verdade insofismável: a de que a UE não pode continuar dependente, quase exclusivamente, da manufactura e da produção industrial, em países terceiros e de outros continentes, de medicamentos e de equipamentos que sejam necessários e indispensáveis a uma área tão sensível como a da saúde

Esta crise veio também demonstrar que, para desafios globais, pode e deve haver também respostas locais e regionais. Os lideres mundiais terão de acabar na prática, e não apenas usando palavras, com o egoísmo nacional e perceber a responsabilidade comum pelo futuro da civilização humana.  Será que no mundo se percebeu como é frágil o equilíbrio em que vivemos e as suas consequências?

José Manuel Neto Simões

Capitão-de-Fragata SEF (R)

 

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