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HISTÓRIAS – XL

10-01-2020 - Henrique Pratas

Como já vos mencionei em alguns textos meus eu iniciei a condução com a idade de 14 anos, nessa altura não existiam muitos carros em Lisboa e sem os meus pais saberem ou fingirem que não sabiam eu pegava nas chaves do carro e ia dar uma volta sempre com a intenção de parar a viatura no mesmo local para que não dessem por isso mal eu sabia que eles estavam “carecas” de saber o que andava a fazer.

Um belo dia no Arripiado e na Carregueira o meu pai volta-se para mim e diz-me mostra-me lá as tuas “habilidades” em termos de condução e passa-me as chaves do carro para a mão, não me dando tempo para lhe dizer o que quer que fosse, nomeadamente o de não saber conduzir.

Calei-me, fiz o que me mandou, coloquei-me ao volante dei há ignição coloquei a viatura em funcionamento e iniciei a marcha em direção há Carregueira. Apesar de ser arriscado, naquele não havia muitos polícias e naquela zona o meu pai conhecia a maior parte deles e senti-me de alguma forma protegido tanto mais que ele no início da “curta” viagem me disse não te preocupes que comigo ao teu lado podes conduzir, foi o que queria ouvir.

Comportei-me como o meu pai não esperava, ágil e desenvencilhado com as artes de conduzir quando cheguei há Carregueira mereci a aprovação do meu pai, elogiando-me da forma como me tinha comportado, mas não deixou de me acrescentar que ainda tinha muito para aprender, ouvi e calei-me.

Como estava com a “corrente” a favor pedi-lhe para me emprestar a viatura para ir dar umas voltas com os meus primos, nas estradas de terra que existem, ou existiam no cimo da Carregueira, ele acedeu e eu todo lampeiro fiz-me ao caminho, mal sabia o que me esperava.

Andei por onde achava que devia andar e passado horas decidi voltar ao local onde o meu pai se encontrava, que era em casa de um tio nosso, que fazia uma água-pé de se lhe tirar o chapéu. O meu pai tinha comprado um sável fêmea, fez uma açorda de sável com as ovas e fritou como deve ser feito o sável em fatias muito finas por causa das espinhas. Este acepipe foi servido por uma série de amigos deles e já ao final da tarde quando eu decidi retornar ao local de partida, aconteceu-me uma peripécia com a qual aprendi para o resto da vida.

Ao tentar inverter a marcha da viatura, que tinha tração atrás as duas rodas de trás caíram numa parte em que havia areia e estas patinavam e nem para trás nem para a frente. Eu sempre fui desenrascado, nas primeiras tentativas fiquei enervado porque estava a ver que a viatura ficava atravessada na estrada de terra e eu não a conseguia tirar de lá, mas como referi, não sou de me ficar e como já tinha visto muitas pessoas utilizar métodos expeditos para solucionarem algumas situações, visualizei o que restava de umas botas de borracha que se utilizavam para regar os campos agrícolas, cortei-as e coloquei uma superfície suficientemente larga para colocar nas duas rodas de trás que não aderiam na areia. Sentei-me no carro, pu-lo a trabalhar, com pouca aceleração para que a borracha não saltasse consegui tirar o carro e coloca-lo na direção que pretendia, diga-se de passagem com uma grande alívio, pois esta situação dar-me-ia direito a um responso valente, consegui safar-me, mas não deixei de evitar que o meu pai e o meu tio já andassem noutra viatura à nossa procura, pois eu tinha levado os meus primos que eram menores de idade e caramba há que ser responsável e eu fui, consegui resolver a adversidade que me ocorreu.

Chegados a casa do nosso tio, esperava levar um responso, mas não o único comentário que ouvi foi: ”soubeste safar-te”.

Aproveito também para vos contar uma outra situação que passei semelhante a esta os meus pais gostavam de ir às festas da Nossa Senhora da Boa Viagem, em Constância, nesse dia chovia torrencialmente e depois de termos dado a volta à Chamusca, perto de entrar em Tancos, entrou água para o distribuidor da viatura e esta parou nem para trás nem para a frente. Vi o meu pai tirar a tampa com uns jornais que tinha pegou-lhes fogo para secar a tampar do distribuidor e permitisse que a viatura funcionasse, não conseguiu a chuva era muita e como estávamos a alguns, longos metros, do Restaurante do Zé Fernandes o meu pai decidiu meter-se ao caminho à chuva para poder ligar para os seus amigos que tinha em Torres Novas para o poderem desenrascar.

Neste espaço de tempo e contra a vontade da minha mãe executei a mesma coisa que o meu pai tinha feito, aqueci a caixa do distribuidor, coloquei-a com o mais dos cuidados para que não entrasse uma pinga de água, sento-me ao volante e dou à ignição e qual não é o meu espanto a viatura começa a trabalhar como um relógio, dei-lhe umas acelerações para aquecer mais a caixa de distribuição e deixei-o a trabalhar ao ralenti e meti-me na estrada a pé ao encontro do meu pais para lhe dizer que a viatura já se encontrava a trabalhar. Tomei esta atitude para que ele não soubesse que eu já conduzia, quando chego ao pé dele e lhe conto o que se passava, ouvi como resposta, “então porque é que não trouxeste o carro, agora temos que voltar para ele à chuva vamos lá chegar todos encharcados”. Importa salientar que na viatura tinham ficado a minha mãe e a minha avó.

Com a resposta do meu pai fiquei a saber que ele sabia o que eu pensava que ele não tinha conhecimento, eu já conduzia a viatura sem o seu consentimento.

Isto só demonstra a ingenuidade, o respeito que existia entre nós, por um lado eu queria conhecer, saber, aprender, mas não queria que ele soubesse e ele que sabia tudo o que se passava não me dizia nada, mantinha-se no seu silêncio, sabendo tudo o que se passava e estou certo que me apoiou sem o fazer de forma explícita nas minhas incursões, foi o meu apoio de certeza absoluta.

Henrique Pratas

 

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