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ESTA INFLAÇÃO É IMPULSIONADA PELA PROCURA PERSISTENTE
Autor: Jason Furman

29-04-2022

Em geral, comentaristas têm oferecido dois argumentos sobre o desempenho das economias avançadas desde o início da covid-19, dos quais só um pode ser verdadeiro. O primeiro é que a recuperação económica tem sido surpreendentemente rápida, superando o que analistas previam e situando essa recuperação à parte do rescaldo de recessões anteriores.

O segundo argumento é que a inflação está atingindo seus picos recentes devido a novidades inesperadas do lado da oferta, incluindo problemas na cadeia de abastecimento, como escassez de semicondutores, uma mudança persistente e inesperada do consumo de serviços para o de bens, um atraso na volta das pessoas ao mercado de trabalho e a persistência do vírus.

O primeiro argumento tem mais chances de ser verdadeiro do que o segundo. O forte crescimento  real do PIB (corrigido pela inflação) sugere que a actividade económica não foi prejudicada de modo significativo por problemas de oferta e que a inflação recente é em grande parte impulsionada pela demanda. Além disso, há razões para esperar que a demanda continue muito forte, o que significa que a inflação irá persistir.

Sem dúvida, pressões inflacionárias reflectem tanto factores de oferta quanto de demanda, cuja combinação exacta é desconhecida. Mas, quando se considera a economia como um todo, é implausível que todas as histórias de oferta individuais fossem se somar à inflação generalizada que estamos vendo. É muito mais provável o aumento da demanda exceder o que a economia pode produzir, levando a preços mais altos.

Por definição, crescimento de preços é igual ao crescimento do produto nominal menos o crescimento do produto real (com uma pequena diferença devido à composição). Ao longo de 2021, o PIB real dos EUA cresceu 5,5%, o PIB nominal, cerca de 11,5%, e o crescimento dos preços do PIB, portanto, em torno de 5,9%. Para a OCDE como um todo, o crescimento  real do PIB  foi ligeiramente inferior, de 4,9%, enquanto o crescimento nominal  do PIB  foi de 10,4%, gerando inflação de preços de 5,2% do PIB.

Lembrem-se de que a maioria dos formuladores de políticas protegeu ou aumentou a renda pessoal disponível num momento em que as possibilidades de consumo eram restritas (durante a maior parte de 2020). Se formos considerar essa poupança excedente ao lado da persistência de taxas de juros baixas  durante a maior parte de 2021, um mercado de acções em alta, demanda reprimida e apoio fiscal adicional, a magnitude do aumento do PIB nominal não é algo tão surpreendente assim. Nos Estados Unidos, o estímulo  fiscal discricionário totalizou US$ 2 triliões no ano civil de 2021, mas o PIB  nominal  foi apenas US$ 1,6 trilião maior do que em 2019. No mínimo, a surpresa é que o gasto nominal tenha sido tão limitado e que as taxas de poupança tenham permanecido tão elevadas.

E quanto ao PIB real? Aqui, precisamos lembrar que todas as histórias do lado da oferta são diferentes jeitos de dizer que a produção real foi limitada. Segundo uma narrativa comum, o consumo mudou dos serviços para os bens e, como a produção de bens responde menos às mudanças do mercado (é menos “elástica”), ela não se conseguiu expandir depressa o bastante. Outra narrativa é que a oferta de trabalho foi contida pela pandemia e pela resposta política (graças a fraquezas  na oferta de trabalho nos EUA e a reduções  nas horas trabalhadas na Europa). E ainda outras narrativas se concentram em mercados específicos, como a redução na produção de micro-chips ou o congestionamento nos portos dos EUA.

O problema dessas versões não é  serem falsas; é que elas perdem a história mais importante em economias que também têm experimentado um crescimento real do PIB surpreendentemente forte. As principais economias vêm tendo recuperações mais rápidas do que experimentaram no rescaldo da crise financeira mundial. De fato, a recuperação na maioria dos países foi mais em forma de V do que qualquer coisa que tenhamos visto em décadas. O crescimento em 2021 superou em muito o que os analistas tinham previsto no final de 2020, quando os analistas já estavam optimistas  com a eliminação do covid-19.

No geral, a economia americana cresceu 1,6% ao ano do fim de 2019 até o fim de 2021, o que é apenas um pouco menor do que as estimativas anteriores do potencial da economia. É uma realização incrível, considerando todos os ventos contrários que vêm reduzindo o PIB potencial: imigração menor, mortes prematuras, redução da formação de capital e a histerese associada ao alto desemprego.

A questão não é que não há problemas na cadeia de suprimentos. Os navios de facto estão lotando os portos, e os fabricantes estão realmente atrasando a produção por falta de micro-chips. Mas isso não é necessariamente evidência de uma mudança adversa na oferta. Se déssemos milhões de dólares a cada família, isso também levaria a retardamentos nos portos e a fabricantes sobrecarregados. O fato de as quantidades terem subido tanto – a julgar pelo volume nos portos  e pelo nível global de produção de micro-chips, para não mencionar os números reais do PIB – sugere que nosso principal problema não é a redução da oferta, mas o aumento da demanda.

Olhando à frente, há algumas razões para esperar que a demanda esfrie, mas elas precisam ser colocadas na balança. O apoio fiscal de fato está diminuindo em todos os lugares. As taxas de juros estão começando a subir nos EUA e no Reino Unido, e vão aumentar ainda este ano também na Europa. Além disso, os mercados de acções têm caído aos valores anteriores  de modo brusco nos últimos tempos.

Mas as famílias ainda têm um excesso significativo de poupança, e a orientação geral da política monetária permanece acomodatícia, sugerindo que a demanda continuará forte. Além disso, com a guerra da Rússia na Ucrânia, há agora um choque de oferta genuinamente grande impulsionando a inflação, na forma do preços de petróleo e gás (especialmente na Europa). Combine isso ao aumento das expectativas inflacionárias de curto prazo, e devemos esperar que a inflação alta permaneça connosco por algum tempo.

JASON FURMAN

Jason Furman, ex-presidente do Conselho de Assessores Económicos do presidente Barack Obama, é professor de Prática de Política Económica na Escola de Governo John F. Kennedy da Universidade de Harvard e membro sénior do Instituto Peterson de Economia Internacional.

 

 

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