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O QUE PODE UM PRESIDENTE FAZER?
Autor: Barry Eichengreen

17-03-2017

SEOUL – Ao tomar posse, Donald Trump prometeu uma série de mudanças radicais na política económica dos Estados Unidos. Descobriu rapidamente, como aconteceu a anteriores presidentes dos EUA, que o sistema político da América foi concebido para evitar mudanças rápidas e em grande escala, ao interpor enormes obstáculos institucionais, que vão do Congresso e dos funcionários públicos de carreira, aos governos estaduais e aos tribunais.

Comecemos pela reforma do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares. Esta deveria ser simples, já que o presidente e os líderes Republicanos do Congresso estão em sintonia. O objectivo de Trump de afastar a mão do governo dos bolsos dos americanos, diminuindo a taxa marginal máxima de imposto sobre os rendimentos correntes de 39,5% para 33%, é completamente consistente com a ideologia Republicana vigente, segundo a qual as elevadas taxas de imposto penalizam o sucesso e asfixiam a inovação.

Mas, para serem politicamente viáveis, as reduções fiscais significativas para os mais abastados teriam de ser acompanhadas de reduções fiscais pelo menos simbólicas para a classe média. E as reduções fiscais generalizadas afectariam o orçamento e alarmariam os falcões do défice no Congresso, dos quais ainda resistem alguns.

Poderíamos pensar em colmatar lacunas, e fazer com que as reduções nos impostos fossem neutrais relativamente ao rendimento. Mas a lacuna de uma pessoa é o direito de outra. Mesmo que existam argumentos económicos para, por exemplo, eliminar a dedutibilidade dos pagamentos de juros sobre empréstimos hipotecários, imaginam-se os uivos de protesto dos proprietários, incluindo muitos eleitores de Trump, que se endividaram para adquirir as suas casas. Imagine-se a reacção dos amigos de Trump no sector imobiliário.

Os cortes na despesa acalmariam os falcões do défice. E no topo da lista dos Republicanos estão cortes importantes para a Agência de Protecção Ambiental, a Agência dos EUA ara o Desenvolvimento Internacional, e a Rádio Pública Nacional. Mas a grande maioria dos gastos federais destina-se a prerrogativas, aos militares, e a outros proverbiais itens “sensíveis”, nos quais os responsáveis eleitos só mexem por sua própria conta e risco. Em termos práticos, não é politicamente viável proceder a cortes generalizados na despesa para contrabalançar reduções generalizadas do imposto sobre rendimentos.

A eliminação dos subsídios federais para seguros de saúde ao abrigo da Lei dos Cuidados Acessíveis (o “Obamacare”) pouparia ao governo pouco mais de 100 mil milhões de dólares por ano, ou cerca de 3% da despesa federal. Mas esses subsídios são pagos em grande parte pelos seus próprios impostos dedicados. Além disso, Trump e os Republicanos no Congresso estão a aprender que é mais fácil pensar na substituição do Obamacare do que concretizá-la. A reforma da saúde, como Hillary Clinton lhes poderia ter dito, é assustadoramente complexa. É cada vez mais claro que o nome será alterado (talvez para “Trumpcare”?), e que o plano Republicano cobrirá menos pessoas; mas grande parte do seu conteúdo permanecerá igual.

Como os impostos sobre as sociedades são menos significativos, em termos do rendimento federal global, a redução das suas taxas não representa uma ameaça comparável para o equilíbrio orçamental. Mas não existe aqui acordo entre o Congresso e a administração Trump, quanto à forma que estes cortes deveriam tomar.

O porta-voz da Câmara dos Representantes, Paul Ryan, entre outros, é a favor de ajustamentos fiscais na fronteira que tributem os fluxos financeiros corporativos, independentemente de onde sejam produzidos os bens vendidos por empresas dos EUA, ao mesmo tempo que as exportações seriam isentadas. Outros, como o Secretário do Tesouro Steven Mnuchin, são mais cépticos. E uma parte importante do eleitorado empresarial de Trump – retalhistas que se encontram dependentes das importações, como a Target e a Walmart – é activamente hostil. Não será fácil chegar a acordo sobre um plano.

A outra principal proposta de Trump é um programa de infra-estruturas no valor de 1 bilião de dólares. Mas esta iniciativa será acompanhada de preocupações relativas ao défice, e contradiz fundamentalmente o cepticismo Republicano quanto a um governo sobredimensionado, e especificamente quanto à capacidade do sector público de implementar planos de investimento de forma eficiente. Trump vai querer salientar alguns projectos específicos. Vai querer o seu muro fronteiriço com o México. Mas quaisquer novos gastos federais em infra-estruturas serão provavelmente mais simbólicos que relevantes.

Então, o que poderá fazer um presidente impaciente, frustrado, e cercado por todos os lados? Primeiro, Trump concentrar-se-á no único conjunto de políticas económicas que um presidente pode desenvolver sem a cooperação próxima do Congresso, nomeadamente as que afectam o comércio. Pode invocar a Lei sobre a Expansão Comercial de 1962, impondo restrições às importações, sob o pretexto de que estas ameaçam os “interesses relevantes” dos EUA. Pode invocar a Lei sobre os Poderes Económicos em caso de Emergência Internacional de 1977, sob o pretexto de que a perda de empregos para o México e para a China constitui uma emergência económica. Pode até invocar a Lei do Comércio com Inimigos de 1917, sob o pretexto de que os EUA têm Forças Especiais activas no Médio Oriente.

Em segundo lugar, Trump responderá, como fazem os populistas, tentando desviar as atenções da sua incapacidade de apresentar resultados económicos. Isto significa dirigir a sua ira e a dos seus apoiantes para outros, sejam eles inimigos internos como a imprensa, a comunidade dos serviços de informações, e Barack Obama, ou adversários externos como o Estado Islâmico e a China. Não seria a primeira vez que um político usaria uma cruzada política interna ou uma aventura política externa para desviar as atenções dos seus falhanços económicos.

Já testemunhámos a tendência de Trump para atacar inimigos percepcionados, tanto estrangeiros como nacionais. E sabemos que este estilo conflituoso é o modus operandi de conselheiros seniores da Casa Branca, como Stephen Bannon e Stephen Miller. Podemos esperar que prevaleçam as mentes mais calmas. Mas dadas as restrições à implementação da agenda económica de Trump, é difícil sermos optimistas.

Barry Eichengreen

Barry Eichengreen é professor de Economia na Universidade da Califórnia, Berkeley; Pitt Professor de História e Instituições da Universidade de Cambridge American; e ex-conselheiro sénior de políticas do Fundo Monetário Internacional. Seu último livro é Hall of Mirrors: A Grande Depressão, a grande recessão, e os usos - e abusos - de História.

 

 

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