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Um internacionalismo do século XXI, contra o capitalismo e o nacionalismo (2)
Autor: Vitor Lima

10-03-2017

O nacionalismo é uma doença infantil; é o sarampo da Humanidade.
Albert Einstein

Sumário

1 - Uma (des)ordem económica e política

2 - A globalização é um processo

2.1 - Como o capitalismo vem cavalgando a globalização

2.2 - A instituição de um estado de excepção generalizado

3- Os grandes promotores do desastre

3.1 - As ameaças vindas das classes políticas

4 – A leitura do contexto.

4.1 - As alternativas possíveis e as desejáveis

4.2 – O desenvolvimento do espirito do fascismo

4.3 – Um novo internacionalismo, precisa-se!

(primeira parte deste texto aqui) fazer link para 423

3 - Os grandes promotores do desastre

Quando a grande maioria dos povos está tomada pelo medo do futuro, pelo conformismo e, perante a ausência de uma abordagem teórica popular que explique a estrutura económica a política do mundo de hoje, os mais favorecidos são os que se aproveitam e prosperam com a situação atual – o sistema financeiro, as multinacionais e as classes políticas.

O sistema financeiro cujas necessidades de crescimento são irrestritas, captura as populações e os estados através da imposição de dívidas enormes, com a interessada colaboração das classes políticas, à qual aquele incumbe da aplicação de resgates ou recapitalizações de bancos, para pagamento pelas populações, através de desemprego, baixos salários, austeridade, precariedade, punção fiscal agravada, etc; e da repressão bruta, se necessário.

As multinacionais segmentam a produção por tantas localizações quantas os componentes de um produto, procurando os menores custos laborais para cada nível de tecnologia ou, localizações onde os direitos laborais ou ambientais sejam mais desprezados. Dominam a logística mundial, competindo acerbamente por minerais, recursos energéticos, água, terras, recursos agrícolas, mercados globais de equipamentos, bens de consumo, bens intermédios ou matérias-primas. Os estados e os seus ocupantes, as classes políticas, entram nessa complexa equação, nessas disputas, enformando a geopolítica e ainda elaborando as políticas de salários, de rendimentos, fiscais, de saúde, educação ou de ambiente, prevenindo a contestação, preparando as guerras…

Os sistemas políticos nacionais, plurinacionais no caso da UE, constituem o promotor do desastre que tem com maior visibilidade. Movem-se de um modo agregado, em grupo, como uma massa para pão, ajustável à forma onde a despejam; isto é, à conjuntura[1]. Os partidos-estado[2], na Europa, contêm duas alas, nomeadamente as pertencentes aos gangs PPE e S&D que, isoladas ou em coligação, desenham as agendas políticas, praticam um conservadorismo atávico com o auxílio declarado dos grupos de media e de spin doctors, para favorecerem os interesses económicos dominantes e manter na mansidão e no atordoamento, o eleitorado, designação que se equipara a mercado, daí resultando o que muitas vezes referimos por “democracia de mercado”; isto é, o modelo de representação dominante. Como no mercado, os vários partidos apresentam-se como prestadores de serviços, cuja venda depende de campanhas publicitárias ou sessões de wrestling televisivo. Tudo isto é pago com verbas orçamentais que mascaram e complementam óbulos empresariais e corruptos.

3.1 - As ameaças vindas das classes políticas

No contexto dos sistemas políticos montados nos países ocidentais, com réplicas aproximadas um pouco por todo o lado, evidencia-se um partido-estado - ou centrão – que desliza no tempo, num sentido mais conservador ou vagamente progressista, consoante os humores do eleitorado. Arrasta na sua órbita os partidos à sua direita ou à sua esquerda, em regra, sem peso eleitoral para substituírem o partido-estado mas, apostando nas desavenças no seio deste último, para fazerem valer os seus créditos em troca de cargos e maior quinhão no pote. Estes últimos, raras vezes conseguem sair da sua relativa marginalidade e firmar-se como forças de poder, como se observou, com os Verdes alemães ao tempo de Joshka Fisher, com o CDS português, os liberais e sociais-democratas ingleses ou ainda, no tempo presente, com o BE e o PCP, como auxiliares do PS de António Costa, facto que lhes poderá sair caro em termos eleitorais futuros.

Os sistemas partidários são como os sistemas planetários. Não deixam de orbitar em torno da defesa do capitalismo, do aplanamento das suas dificuldades, mantendo-se as distâncias relativas entre os vários planetas constituintes, por ação das respetivas forças gravitacionais. Daí que haja regularmente movimentos de elementos que se deslocam dos partidos periféricos para o partido-estado, o elemento de maior massa (eleitoral e sobretudo monetária), o grande fornecedor de conforto, no seio de cada sistema partidário.

O habitual rotativismo no poder, entre duas alas de um partido-estado, associado à inexistência de grande contestação social, interage com o medo do desconhecido, com o conformismo em torno de um minimalismo, de um mal menor, gerando situações de pantanoso imobilismo.

Não há na esquerda europeia referências ao capitalismo ou contestação aos regimes políticos vigentes que nada têm de democráticos – nem na sua arquitetura, nem na sua prática; regimes esses, centrados em partidos decididamente longe da população, portadores implícitos de estados de excepção, seja porque surgiu uma troika, seja porque é preciso capitalizar os bancos, reduzir o deficit, aumentar o PIB, exportar mais, combater o terrorismo… adiando para futuros longínquos, o bem estar da população, a disponibilidade de rendimentos decentes e garantidos, a redução de cargas fiscais asfixiantes.

As esquerdas tradicionais, não fomentam contestação, apenas acompanham o conservadorismo imanente aos ambientes parlamentares e à agitação folclórica dos momentos eleitorais. No fundo, zelam pela marcha do capitalismo, esperando que apresente “um rosto humano”, mais próximo das suas ideias fortes, contidas no catálogo trotsko-estalinista – socialismo, partido, autoridade, nacionalizações, vanguarda…- embrulhadas na ideia obtusa de que o Estado zela pelo bem-estar do povo; ou na verdadeira estupidez de que “o Estado somos todos nós”. Sem capacidade política para saírem da lógica das respetivas nacionalidades, têm como único forum de diálogo e concertação, no seio da UE, o Parlamento Europeu, cuja composição funções não indiciam nada de positivo para os europeus[3].

Na agenda mediática de uma parte dessa esquerda do sistema, privilegia-se a agitação de causas marginais, a focagem em parcelas minoritárias da população e na conjuntura governamental. Em contrapartida, podem obter o apoio benevolente do partido-estado, - excepto das franjas sociais ligadas ao fundamentalismo católico ou evangélico - desde que não afetem os deficits, não alterem minimamente a ordem capitalista, nem afetem os balanços das multinacionais ou dos grandes bancos; como é o caso das questões que se prendem com as orientações sexuais.

Outro segmento dessa mesma esquerda define-se pela prevalência de um estreito economicismo, conduzido por quadros partidários acampados em sindicatos vazios e que se polariza na concertação social, em protestos e lutas sectoriais ou em “grandes” manifestações ritualizadas, onde preponderam os habituais militantes partidários - capazes das atuações mais torpes e repressivas para quem não aceite as suas ordens “unitárias”.

Nesse caldo de cultura que é a política partidária, emerge o papel da extrema-direita, xenófoba, nacionalista, evocadora das glórias passadas, reais ou inventadas, da pátria, capaz de atrair os desprovidos, os pobres, gente de pouca escolaridade ou formatada pela tecnocracia universitária, beneficiando do descrédito dos partidos-estado e do desfasamento ideológico das esquerdas tradicionais, mesmo quando as últimas perfilham igualmente o nacionalismo. Essa narrativa atrai os vencidos das lógicas da concorrência, da competitividade, do empreendedorismo, as vítimas do individualismo assente num salve-se quem puder e que se focam na consideração do Outro como concorrente, como estorvo para a concretização do bem-estar próprio; são o alvo das colheitas eleitorais, além Atlântico, de Trump e, na Europa, da constelação que inclui Farage, de Wilders, LePen, Frauke Petry, Kaczinsky, Orbán ...

Não deixa de ser curioso e preocupante que a agenda dos últimos, na Europa, seja semelhante - no saudosismo nacionalista, nas soluções salvíticas como a saída do euro e da UE, nacionalizações, poder musculado - à do KKE grego, do PCP e de alguns intelectuais subsidiários; embora os últimos se diferenciem por não evidenciarem pulsões xenófobas. A dívida, forma central do capital para a captura dos povos, não lhes merece mais do que renegociações ou reestruturações, míticas e ineficazes se de aplicação específica a um país isolado, tendo do outro lado da mesa todo o poder do sistema financeiro global; falta-lhes uma visão global depois de apagado o farol moscovita mas, sobra-lhes o espírito paroquial.

Entende-se, que da extrema-direita ou da dita “esquerda” nacionalista, emanem também críticas à bem real falta de democracia das estruturas europeias; não se compreende é o espírito reverencial, a sacralização, que na esquerda placebo portuguesa prepondera face à Constituição, tomada como inamovível, embora seja, excludente, oligárquica e antidemocrática, tal como os tratados europeus, onde as pessoas não existem como construtores dos seus próprios futuros. Isso revela, claramente, que desprezam a democracia preferindo o nacionalismo; e que, para eles, uma oligarquia nacional, “nossa”, com selo de origem lusa, é preferível a uma qualquer outra oligarquia. Um carcereiro que fala a língua do preso torna a cadeia um resort de luxo?

Vitor Lima

(continua)

 

 

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