Edição online quinzenal
 
Terça-feira 7 de Maio de 2024  
Notícias e Opnião do Concelho de Almeirim de Portugal e do Mundo
 
DOSSIERS
 
Rumo ao desenvolvimento industrial
Autor: Jim O'Neill

23-12-2016

LONDRES — Há alguns dias, o Presidente eleito Donald Trump declarou no Twitter — o seu canal de comunicação privilegiado — que não precisa de permissão da China para contactar Taiwan, porque a China não pediu autorização para desvalorizar a sua moeda . Naquele momento, a minha esperança de que a agitação causada por Trump seria economicamente benéfica para os Estados Unidos diminuiu.

Considero que as economias desenvolvidas precisam de ser agitadas para acabar com a situação de mal-estar em que se encontram desde 2008, bem como com a sua dependência excessiva da política monetária fácil. Dada a propensão de Trump para agitar as coisas, parecia ser um bom candidato para desempenhar esta tarefa. Mas se Trump quiser realmente ajudar os EUA, deve concentrar-se no que é essencial a nível económico, e não em memes populistas simplistas, e muitas vezes falsos.

A julgar pelas acusações que faz à China, parece que Trump está simplesmente a provocar irritação nos seus apoiantes — não avançando com nenhum tipo de agenda construtiva. Afinal de contas, qualquer observador da China que seja razoável — incluindo alguns dos assessores do próprio Trump com quem trabalhei no passado — sabe que o país não desvaloriza sua moeda há algum tempo.

É certo que o renminbi chinês registou recentemente uma desvalorização face ao dólar, mas não tanto como o iene japonês, o euro ou a libra esterlina — e estas desvalorizações foram determinadas por um nível relativo de confiança na economia dos EUA. De qualquer modo, os chineses têm uma política de taxas de câmbio ponderada com base no comércio, e não na manutenção do renminbi num determinado nível alvo em relação ao dólar.

Ao invés de acusar a China de prejudicar a competitividade das empresas dos EUA, Trump devia focar-se numa estratégia genuína para o crescimento. Tal estratégia poderia seguir o modelo britânico da "northern powerhouse" (uma proposta governamental destinada a incrementar o desenvolvimento da região do norte da Inglaterra, NdT.) — que ajudei a criar na qualidade de membro do governo — concentrado na revitalização das economias do antigo centro nevrálgico do sector industrial britânico.

Londres é a única cidade no Reino Unido classificada entre as primeiras 50 a nível mundial. Isto é muito importante num mundo em que, nos últimos 20 anos, as cidades foram responsáveis por mais de 60% do crescimento económico, expansão da riqueza e aumento das condições de vida. Individualmente, as cidades com dimensão muito inferior situadas na região do norte da Inglaterra não têm capacidade para competir com isto.

No entanto, se as principais cidades fossem associadas — incluindo Manchester, Sheffield, Leeds e Liverpool — a região do Norte poderia tornar-se muito mais unificada, e sete milhões de pessoas agiriam como uma única economia regional, proporcionando assim muitos dos benefícios da aglomeração das grandes cidades globais. Além disso, as distâncias entre Manchester, Leeds, Liverpool e Sheffield são menores do que as distâncias percorridas pelas linhas Central, District e Piccadilly do metro de Londres. Assim, com sistemas de transporte de ponta acessíveis, parece claro que estas cidades poderiam aproveitar os benefícios da aglomeração urbana.

É evidente que as cidades da região do norte da Inglaterra têm orgulho nas suas histórias e estão interessadas em manter o seu próprio sentido de identidade. Nada disto lhes seria retirado. Embora seja compreensível que algumas pessoas viram a estratégia northern powerhouse como uma plataforma para dar ênfase à sua própria superioridade, tal revela-se inútil, até porque leva a que alguns decisores da administração central duvidem da relevância do projecto. Por que razão investir tanto nessas cidades, quando há tantas outras áreas do país que também estão em dificuldades? A única resposta consiste justamente na oportunidade de colher os benefícios da integração.

Felizmente, apesar de algumas dúvidas, o governo do Reino Unido anunciou que iriam ser empreendidos esforços para o arranque algumas das ligações de transportes necessárias, com o objectivo de reduzir a viagem de comboio entre Leeds e Manchester para 30 minutos. No entanto, outros elementos do projecto northern powerhouse são igualmente importantes, especialmente a devolução às cidades de um grande número de poderes de decisão — bem como de poderes em matéria de despesas e receitas — em troca da eleição de presidentes de câmara (algo que o Reino Unido pode aprender com os EUA). Afinal de contas, a Inglaterra é provavelmente a economia mais centralizada a nível político em toda a OCDE — uma realidade que provavelmente contribui para os seus profundos desequilíbrios regionais.

Além da referida devolução e dos transportes, a região do norte da Inglaterra necessita de melhorar significativamente o nível de escolaridade e as competências da sua força de trabalho, a fim de atrair e de manter empresas de ponta. Os planos para replicar algumas das melhorias notáveis do nível de escolaridade de Londres e do sudeste da Inglaterra verificadas nos últimos 20 anos são ambiciosos, mas realizáveis.

A verdade é que, dotadas de maior poder de decisão e de mais ligações e competências, as cidades da região do norte da Inglaterra poderiam tornar-se muito mais dinâmicas e, possivelmente, inverter décadas de declínio económico relativo. Na verdade, arriscar-me-ia a prever que o projecto northern powerhouse, que já atraiu a atenção de investidores locais e estrangeiros, constituirá uma das mais importantes políticas económicas estruturais do Reino Unido durante muitos anos. É por isso que é fundamental que os líderes do Reino Unido continuem a desenvolvê-lo.

A estratégia northern powerhouse oferece lições valiosas a outros países. A China já está a prosseguir uma estratégia de desenvolvimento regional semelhante, destinada a revitalizar a sua antiga cintura industrial do norte, retirando deste modo alguma pressão às cidades costeiras ultradinâmicas do país. Os EUA deviam seguir o exemplo, com um plano para revitalizar o chamado "Cinturão da Ferrugem" que era parte integrante da vitória de Trump.

Como benefício adicional, tal abordagem poderia desencadear a "inveja competitiva" noutras regiões de desenvolvimento mais lento. Foi o que aconteceu no Reino Unido. onde o progresso na região do norte da Inglaterra levou a que alguns apelassem, por exemplo, a uma "máquina para a região das Midlands", que abrangesse a outra grande área urbana situada fora de Londres, com um grande número de cidades muito próximas entre si.

É certo que os EUA têm uma dimensão muito maior do que a Inglaterra, e as suas antigas cidades industriais são muito mais distantes entre si. Porém, algumas das ideias que animaram o projecto northern powerhouse poderiam enriquecer consideravelmente os planos económicos de Trump. Tendo em conta que o investimento em infra-estruturas é um elemento-chave da sua agenda, e que a devolução de poderes aos estados goza de popularidade entre os republicanos norte-americanos, existe, seguramente, espaço para tal abordagem.

Jim O'Neill

Jim O'Neill, ex-presidente da Goldman Sachs Asset Management e ex-secretário de comércio para o Tesouro do Reino Unido, é professor honorário de Economia na Universidade de Manchester e Presidente do comentário sobre a resistência antimicrobiana.

 

 

Subscreva a nossa News Letter
CONTACTOS
COLABORADORES
 
Eduardo Milheiro
Coordenador
Marta Milheiro
   
© O Notícias de Almeirim : All rights reserved - Site optimizado para 1024x768 e Internet Explorer 5.0 ou superior e Google Chrome