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O ÁRTICO NA LINHA DE FRENTE
Autor: Gail Whiteman

05-02-2021

Cientistas do clima há tempos sabem que o Árctico está esquentando muito mais depressa  do que qualquer outro lugar do planeta. Mas até mesmo aqueles de nós que acompanham o Árctico de perto ficaram chocados com as mudanças ocorridas em 2020, ano de recordes quebrados, geleiras em recuo e desintegração de lâminas de gelo. Os alarmes estão soando mais alto do que nunca: precisamos reduzir nossas emissões de gases do efeito estufa urgente e drasticamente.

No ano passado, as temperaturas no Círculo Árctico atingiram seus maiores volumes já registados. Uma onda de calor  na região árctica da Sibéria causou temperaturas de 38°C (100°F) – 18°C a mais que a média da temperatura máxima diária dos últimos anos. Enquanto isso, ferozes incêndios florestais  no Árctico liberaram um volume inédito de dióxido de carbono, estabelecendo um novo recorde de poluição na região.

Com o calor subindo, a paisagem do Árctico vem mudando rapidamente. Pela primeira vez desde o início do monitoramento, o gelo marítimo na região da Eurásia do Árctico ainda não tinha começado  a congelar em Outubro. Um mês antes, um bloco de gelo do tamanho de Paris se soltou  da maior camada de gelo da Groenlândia e, em julho, a camada de gelo do Canadá, até então intacta – há 4 mil anos - se partiu . À medida que o gelo árctico derrete, os níveis do mar sobem, ameaçando países em todo o mundo.

Ao longo do ano passado, cientistas também registaram sinais preocupantes de futuras falências climáticas. À medida que temperaturas mais altas fazem as plantas do Árctico crescerem mais, o permafrost (gelo permanente do subsolo) vem descongelando mais depressa – processo que libera enormes quantidades de dióxido de carbono e metano (gás do efeito estufa muito mais potente que o CO 2 ), acelerando o aumento das temperaturas. No ano passado, uma cratera de quase 50 metros de profundidade, ou “funil”, um de vários encontrados nos últimos anos, foi descoberta no norte da Sibéria, depois que um bolsa subterrâneo de metano, formado por permafrost em processo de derretimento, explodiu pela tundra.

As consequências do colapso climático no Árctico são de longo alcance. Um tanque de combustível se partiu  no Árctico russo após se instaurar em permafrost amolecido, liberando cerca de 150 mil barris de diesel em um rio. Um relatório da Human Rights Watch descobriu  que mudanças associadas ao clima nos padrões de migração animal estão tornando mais difícil para as comunidades indígenas no Canadá achar comida ou percorrer leitos de água até então congelados. Além disso, vilas à beira-mar podem ser devastadas quando as espécies de peixes migrarem  para fugir das águas em aquecimento.

Estas histórias podem parecer distantes, até mesmo abstractas, para a maioria dos leitores. Mas isso não continuará assim por muito tempo. Se os eventos de 2020 nos ensinaram alguma coisa, foi que o que acontece no Árctico não fica no Árctico. Pelo contrário, as temperaturas em alta do Árctico ameaçam desencadear um efeito dominó devastador que acabaria em catástrofe global.

Isto se deve a dois fenómenos naturais poderosos. Primeiro, o aquecimento do Árctico enfraquece  a corrente de jacto – o rio de ar que flutua acima da superfície terrestre.

A corrente de jacto é impulsionada pelo contraste entre os pólos congelados do planeta e seu equador quente. À medida que este contraste diminui, a corrente de jacto fica mais lenta e pode até ficar estagnada. Cientistas crêem que esta mudança na corrente de jacto esteja por trás de diversos eventos climáticos mortais, entre eles os incêndios florestais na Califórnia  e Sibéria, tempestades de inverno extremas no leste dos EUA  e temperaturas altas nunca registadas antes no deserto de Mojave.

A segunda maneira pela qual o aquecimento árctico afecta o resto do mundo é atrapalhando  o vórtice polar, um sistema climático de baixa temperatura situado acima de cada polo e que preserva o ar frio nestas regiões. Quando o Árctico esquenta, supõe-se que o ar frio contido no vórtice polar se desloque para o sul, causando baixas temperaturas extremas e incomuns em lugares distantes. Neste inverno, ItáliaJapão  e  Espanha  tiveram nevadas extremas.

Durante a pandemia de covid-19, “reconstruir melhor” vem se tornado uma espécie de mantra. Medidas para preservar o Árctico devem estar no centro destes esforços. Para ajudar neste processo, a Árctica Basecamp, criada por mim, desenvolverá este ano uma plataforma de livre acesso de Risco ao Árctico, para chamar a atenção para os primeiros sinais de alerta para riscos emergentes causados por mudanças no ecossistema do Árctico.

Felizmente, um número crescente de lideranças parece reconhecer  a importância fundamental do Árctico. O recém-lançado “Relatório de Riscos Globais 2021” do Fórum Económico Mundial listou temperaturas extremas, acção climática deficiente e dano ambiental humano entre os riscos mais prováveis – e de maior impacto – que nós enfrentaremos na próxima década. Durante a pauta semanal de Davos do FEM, eu conduzi um painel de alto nível  focado em acelerar os avanços  no sentido de proteger esta região crítica.

É reconfortante imaginar o Árctico como um lugar distante coberto de neve, povoado por renas e ursos polares. De fato, a região é um dos pilares do sistema climático que mantém nossas temperaturas estáveis, nossas comunidades habitáveis e nossas economias prósperas. E também está sob pressão imensa. Aliviar esta pressão – especialmente pondo um fim a toda mineração por petróleo e gás – é um prerrequisito para um mundo mais sustentável e mais justo.

GAIL WHITEMAN

Gail Whiteman é fundadora do Arctic Basecamp, uma equipe de especialistas e cientistas do Árctico.

 

 

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