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Redescobrir a promessa da energia nuclear
Autor: Wade Allison

29-06-2018

Em 2015, na Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas, realizada em Paris, os líderes mundiais pareceram finalmente reconhecer a realidade sobre as alterações climáticas. Contudo, a resposta que defendem é fundamentalmente deficiente, dada a sua dependência das “fontes de energia renováveis” – nomeadamente: hidroeléctrica, solar, eólica e biocombustíveis - que prejudicam verdadeiramente a natureza. Ironicamente, a solução mais adequada a nível mundial para alcançar os objectivos do Acordo de Paris é contar com uma fonte de energia que é frequentemente demonizada: a energia nuclear.

A energia eléctrica produzida a partir da água, do vento ou dos raios solares não tem condições para fornecer, de forma fiável, a energia na escala necessária a uma economia moderna. Um quilograma de água de uma barragem com 100 metros de altura apenas tem capacidade para produzir 1/3.600 quilowatts-hora de energia. Um quilograma de carvão, por outro lado, produz cerca de 7 kW/h de energia - 20.000 vezes mais.

Assim sendo, um sistema hidroeléctrico teria de ser enorme para produzir a mesma quantidade de energia que um equivalente termoeléctrico a carvão, o que implica elevados custos do ponto de vista ambiental e humano. Para construir o maior projecto hidreléctrico existente - o dique das Três Gargantas, no Rio Yangtzé, que se estende por 600 quilómetros - 1,3 milhões de pessoas foram realojadas, na sequência de inundações em 13 cidades, 140 vilas e 1.350 aldeias.

O vento tem uma densidade energética semelhante. Mesmo com as suas turbinas enormes e ruidosas, os parques eólicos no mar produzem, no máximo, apenas nove megawatts por quilómetro quadrado. Para corresponder a um gigawatt de uma central termoeléctrica a carvão são necessárias várias centenas de turbinas. O mesmo se aplica às unidades de produção de energia solar: para serem competitivas, têm de ser enormes, abrangendo vastas áreas de encostas e prados.

No entanto, mesmo que estas estruturas maciças e nocivas para o ambiente fossem instaladas, não teriam capacidade para produzir energia suficiente de modo fiável. Os artigos que fazem a divulgação dos picos de produção de energia eólica e solar, muitas vezes não mencionam o facto de haver períodos (que por vezes, se prolongam por muitos dias) em que a produção deste tipo de energia é escassa ou mesmo nula. Se o excesso de energia pudesse ser armazenado de forma eficiente, seria possível cobrir os períodos de escassez; mas as melhorias em termos da tecnologia de baterias estão limitadas pelas leis da química.

Uma recente alegação de que as fontes de energia renováveis, por si só, poderiam satisfazer todas as necessidades de electricidade dos EUA foi desacreditada. Para evitar os apagões, é necessário construir fontes de energia complementares totalmente fiáveis e mantê-las em “stand-by”, a um custo atribuível à flutuação das energias renováveis.

Algumas pessoas argumentam que a resposta reside em biocombustíveis como o etanol e o biodiesel, que beneficiam de subvenções em alguns locais. No entanto, de entre as opções em termos de energias renováveis, os biocombustíveis são os que representam o maior impacto ambiental, porque requerem grandes extensões de terras agrícolas e florestas, não conseguindo, porém, reter o dióxido de carbono que a natureza captura de forma tão eficaz.

A energia nuclear é uma fonte de energia livre de carbono e sem estas desvantagens ambientais. Com efeito, o combustível nuclear tem 100.000 vezes a densidade energética do carvão, de modo que uma central nuclear de um gigawatt exigiria apenas 15 hectares de terra. Seria possível incluir de forma discreta na paisagem pequenas centrais modulares. Além disso, os minérios nucleares estão amplamente distribuídos do ponto de vista geográfico, e o combustível é facilmente transportado e armazenado. Além disso, uma central nuclear - que pode funcionar durante 60 anos - é mais resistente a condições meteorológicas extremas do que as centrais de produção de energia eólica ou solar.

Apesar destas vantagens, os países de todo o mundo recusam-se a investir em novas centrais nucleares e estão inclusivamente a encerrar as já existentes. A razão reside na falta de entendimento quanto à forma como estamos expostos à radiação dos processos nucleares - uma parte integrante da natureza - todos os dias.

Durante três mil milhões de anos, a vida evoluiu de modo a não ser afectada pela radiação natural das rochas e do espaço. Há um século, Marie Curie foi galardoada com dois prémios Nobel por explicar a física e a química da física nuclear e das radiações, antes de ser pioneira na utilização de elevadas doses de radiação para o tratamento do cancro.

No entanto, embora quase todas as pessoas tenham um familiar ou amigo que já beneficiou de radioterapia, as atitudes do público em relação à energia nuclear e às radiações nunca se recompuseram do choque causado pelas bombas nucleares lançadas sobre Hiroxima e Nagasaki em 1945. Contudo, os efeitos a longo prazo das radiações libertadas por essas bombas foram substancialmente exagerados.

É certo que até 200.000 pessoas podem ter morrido nos atentados à bomba e em razão das suas consequências imediatas, mas as mortes deveram-se principalmente à explosão e ao incêndio resultantes. Poucas morreram de cancro. Na verdade, os registos médicos dos sobreviventes   indicam   um número suplementar de mortes por cancro de 550-850 ao longo de 50 anos.

Não ajudou o facto de, durante o período da Guerra Fria, os políticos e os meios de comunicação social terem explorado o receio relativamente às radiações. Foram promulgados regulamentos de segurança draconianos na década de 1950, não por que as provas existentes assim o exigiam, mas para apaziguar um público ansioso, cujas preocupações foram exacerbadas pela corrida ao armamento nuclear por parte dos EUA e da União Soviética.

Em 1986, o acidente nuclear de Chernobil pareceu confirmar estes receios, embora o número de mortes causadas pela radiação tenha sido de apenas 43. Da mesma forma, embora ninguém tenha morrido em consequência das radiações decorrentes do acidente que ocorreu no Japão em 2011, na central de Fukushima, esse episódio foi amplamente considerado como uma prova de que os países deviam abandonar a energia nuclear. O impacto negativo de Fukushima - incluindo 1.600 mortes e sérios prejuízos económicos e ambientais - foram o resultado de regulamentação e procedimentos de evacuação inadequados. Além disso, o que causou o acidente em primeiro lugar foi a geologia, não a prossecução da energia nuclear.

O mundo deve ir além da fobia da radiação e aceitar uma regulamentação nuclear menos rígida e baseada em evidências. (É a conformidade com regulamentações excessivas que torna a energia nuclear aparentemente dispendiosa.) O que é necessário, acima de tudo, é a vontade política para desafiar o   status quo , em nome de opções políticas inteligentes e viradas para o futuro, bem como uma melhor educação do público (começando pelas crianças em idade escolar e um maior investimento na educação).

A energia nuclear não pode ser popular actualmente, mas deveria sê-lo no futuro. É a melhor opção para o futuro colectivo. Devíamos adoptá-la.

Wade Allison

Wade Allison é Professor Emérito de Física do Keble College da Universidade de Oxford, e o autor, mais recentemente, do Nuclear is for Life. Ele também é secretário honorário da SONE (Supporters of Nuclear Energy).

 

 

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