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Garantir controlos e equilíbrios antes da construção de estradas e pontes
Autor: Paolo Mauro

03-03-2017

WASHINGTON, DC — Nas eleições presidenciais norte-americanas de 2016, Hillary Clinton e Donald Trump reconheceram que a economia dos EUA apresenta infra-estruturas deploráveis, e ambos instaram ao reforço do investimento na renovação e na modernização do capital social público do país. Num momento em que o Governo de Trump prepara o seu primeiro plano orçamental, as suas iniciativas neste domínio constituirão um foco central de atenção.

Os EUA não são os únicos. Na verdade, as lacunas a nível de infra-estruturas são um problema ainda mais premente no resto do mundo. Outras economias avançadas necessitam igualmente de reanimar o investimento, e as economias emergentes devem preparar-se para o crescimento demográfico, o aumento do consumo e um aumento das despesas com transportes.

As iniciativas adoptadas na sequência da crise financeira global de 2008 estão a começar a promover o investimento em infra-estruturas. Na União Europeia, o Plano de Juncker — que se apoia em fundos da UE para ajudar a financiar os projectos mais arriscados e mais inovadores — tem por objectivo gerar mais de 300 mil milhões de dólares em investimentos entre 2016 e 2018.

Além disso, verifica-se uma pressão ainda maior relativamente ao investimento em infra-estruturas nas economias emergentes — especialmente na China, que está a executar projectos dentro e fora do país. Nos últimos anos, a China criou instituições financiadas a nível interno, como o Fundo da Rota da Seda e impulsionou a criação de novas instituições financeiras internacionais como o Banco Asiático de Investimento em Infra-estruturas.

O investimento em infra-estruturas, quando realizado correctamente, pode reanimar economias fragilizadas e pagar-se a si pr óprio, galvanizando a actividade do sector privado e promovendo o crescimento económico. No entanto, quando o investimento não é realizado correctamente, a despesa com infra-estruturas públicas pode levar à corrupção e ao desperdício, e os contribuintes acabam por ter de pagar as facturas de "pontes que não conduzem a lugar algum". Um investimento em infra-estruturas executado adequadamente implica mais do que apenas financiamento; exige também que toda a miríade de pormenores de selecção, concepção e execução de um projecto seja cuidadosamente gerida.

E, neste ponto, a chave para o sucesso não se limita à competência profissional e à experiência tecnocrática. Implica também a transparência e a liberdade de imprensa. Os cidadãos devem dispor de factos concretos sobre os projectos para que possam acompanhar de perto o seu progresso e pressionar os decisores políticos no sentido de protegerem o interesse público.

Num novo livro, Tomas Hellebrandt e eu previmos que a despesa dos consumidores com transportes quadruplicará até 2035 na África subsariana, na Índia, na China e noutros países asiáticos emergentes.

As pessoas que auferem 200 dólares por ano gastam apenas 1 % do seu rendimento em transportes, em comparação com os 18 % gastos pelas pessoas que ganham 20 000 dólares. Nas próximas duas décadas, o número de pessoas cujo rendimento se situa entre os 6 000 e os 20 000 dólares aumentará em mais de mil milhões, e muitas delas irão adquirir o seu primeiro automóvel. Entretanto, o número de pessoas com rendimentos anuais iguais ou superiores a 20 000 aumentará em quase 800 milhões, e muitos delas começarão a viajar de avião para fins de lazer.

As redes de transporte nas economias emergentes terão de ser amplamente expandidas para acompanhar esta procura crescente. E embora as economias avançadas disponham já de amplas infra-estruturas de transportes e de populações estáveis, as suas redes necessitam de ser urgentemente renovadas e reparadas.

Os países emergentes apenas poderão reunir financiamento suficiente para as infra-estruturas se reforçarem o papel do sector privado; os fundos de pensão e as companhias de seguros de vida, em particular, poderiam fornecer vastos recursos. Contudo, para aproveitar esta oportunidade, os requisitos prudenciais para tais investidores devem tornar-se menos restritivos, para que possam manter carteiras diversificadas de projectos de infra-estruturas. Além disso, devem ser criadas plataformas de co-investimento com bancos multilaterais e regionais de desenvolvimento para aumentar a credibilidade desses investimentos.

Para atrair os investidores privados, os governos terão de manter um ambiente regulamentar estável, livre de ingerências arbitrárias. Ao mesmo tempo, terão de verificar e divulgar obrigações fiscais de projectos com participação privada, como o faz regularmente o Chile. Esta medida ajudará a evitar que as garantias do governo para as parcerias público-privadas imponham custos orçamentais equivalentes a um ou mais pontos do PIB, tal como aconteceu na Colômbia, na Indonésia e em Portugal.

Os governos deverão promover uma cultura de transparência para garantir que o financiamento seja utilizado de forma produtiva — ao invés de ser ilicitamente canalizado ou direccionado para projectos de baixo valor acrescentado para fins políticos. As adjudicações e as principais características da contratação pública devem ser publicadas regularmente, e a conservação de registos e o controlo da qualidade devem ser adequadamente mantidos durante todo o processo de adjudicação, bem como durante a execução do contrato.

Para evitar fraudes, os governos devem recompensar os delatores e protegê-los de retaliações. Muitos dos países emergentes onde o investimento é mais necessário devem realizar uma reforma urgente do seu quadro institucional de selecção e execução de projectos de infra-estruturas. Contudo, a corrupção atinge de algum modo todos os países, pelo os países avançados devem igualmente proteger os projectos de infra-estruturas de influências indevidas do sector privado e da ingerência oficial arbitrária.

A promoção bem-sucedida do investimento em infra-estruturas nas economias emergentes é do interesse de todos. E com as economias emergentes actualmente na vanguarda da luta contra as alterações climáticas, o mundo beneficiará ainda mais se os investimentos nestes países forem direccionados para projectos de infra-estruturas verdes. A construção de novas redes metro-ferroviárias, em vez de estradas, ajudaria a reduzir as emissões de dióxido de carbono nas próximas décadas.

Os países mais avançados podem ajudar neste esforço, apoiando a investigação e o desenvolvimento em matéria de tecnologias verdes e oferecendo incentivos financeiros para o investimento em infra-estruturas respeitadoras do clima através de agências de crédito às exportações e de bancos multilaterais e regionais de desenvolvimento. Com um sistema de contratos públicos internacional aberto e transparente, as tecnologias mais eficientes sairiam vencedoras.

O investimento em infra-estruturas é muito promissor, mas para colher os seus benefícios, os decisores políticos das economias emergentes terão de reforçar os seus quadros institucionais de contratação pública o mais depressa possível. Além disso, os decisores políticos das economias avançadas devem preservar e aplicar controlos e equilíbrios reconhecidos, a fim de manter a igualdade de condições na selecção de projectos e de permitir o acompanhamento da execução de fio a pavio.

As opiniões aqui expressas são as do autor e não representam necessariamente os pontos de vista do FMI, nem do seu Conselho Executivo ou de Administração.

Paolo Mauro

Paolo Mauro, Diretor Adjunto do Departamento Africano do Fundo Monetário Internacional, co-autor de " O Mundo em Movimento: Padrões de Consumo em uma Economia Global Mais Igual" com Tomas Hellebrandt enquanto membro sénior do Peterson Institute of International Economics.

Tradução: Teresa Bettencourt

 

 

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