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Questões Oportunas

SERÁ QUE VIVEMOS NUM ESTADO DE DIREITO?
20-03-2020 - Cândido Ferreira

Algumas democracias optaram por tribunais constitucionais, enquanto outras dispensam esse apêndice. Por imperativo da nossa Constituição, embora a sua composição seja determinada por critérios de confiança política, o nosso Tribunal Constitucional é, sem outro controlo ativo, o órgão supremo da magistratura portuguesa.

Essa “anomalia” até poderia nem ser motivo de preocupação, se não tivéssemos entretanto assistido a uma progressiva subserviência do Tribunal Constitucional a quem o nomeia, com a crescente subversão de regras elementares do Direito: uma evidência hoje apreendida por muitos portugueses, geradora de alarme social, e que até induziu ao recente chumbo de algumas personalidades, na AR, por suspeita de poderem branquear processos em curso.

Haverá quem se apreste a dizer que tudo isto não passa de “gramática”. Sigamos pois para a “matemática”, esta uma ciência certa.

Quem ignora que, tendo o Tribunal de Contas indiciado algumas práticas incorretas, ou mesmo graves violações à lei, alegadamente cometidas por altos responsáveis pelo Tribunal Constitucional, que determinariam uma rigorosa investigação policial em qualquer Estado de Direito, a resposta foi:

- Vocês aí falam, mas quem manda somos nós!

Não será estranho que, perante este “irregular” funcionamento das Instituições, a Provedoria da Justiça, a Procuradoria e mesmo a Assembleia e a Presidência da República tenham mantido um total alheamento?

Mas deixemo-nos de incidentes nunca esclarecidos, e das alegadas suspeitas que correm, e passemos a factos, citando algumas violações grosseiras das boas práticas de um Estado de Direito e que configuram uma promiscuidade intolerável entre a Justiça e a Política.

Entre outras funções, compete ao Tribunal de Contas fiscalizar as contas públicas e corrigir procedimentos que violem as regras instituídas.

Até por ser a única estrutura competente, foi-lhe naturalmente atribuído o controlo das despesas do sistema político-partidário.

Há tempos, contudo, os partidos políticos deliberaram, na AR, que as suas próprias contas, bem como as de todas as restantes campanhas eleitorais, passassem para a alçada do Tribunal Constitucional. Uma decisão tanto mais insólita, sobre tão delicada matéria, quando é sabido que, com outra “vocação”, o Tribunal Constitucional “foi obrigado” a endossar essa sua nova responsabilidade para uma “comissão independente” que, aparentemente, assenta as suas decisões na consultadoria de um gabinete contabilístico privado.

Não admira pois que, em favor dos partidos do “charco-da-governação”, o Tribunal Constitucional levante hoje todo o tipo de obstáculos aos movimentos cívicos e às candidaturas independentes, com a imposição de práticas e de leis de inconstitucionalidade indisfarçável: a título de exemplo, lembro que as candidaturas independentes pagam IVA e as partidárias gozam de isenção desse imposto. Será que os juízes desconhecem que a nossa Constituição proclama o princípio da igualdade?

Não me agrada tratar de “aventuras pessoais” mas, encerrada a última campanha para as Presidenciais, logo o Tribunal Constitucional entendeu suscitar múltiplas questões sobre os gastos da minha candidatura, que nem sequer beneficiou de patrocínios obscuros ou de subvenções oficiais. E apesar do custo da campanha em pouco ter excedido os 20 000 € (vinte mil euros!), invocando dúvidas, irregularidades processuais e até ilícitos, em breve o Tribunal Constitucional desencadeava pedidos de explicação – alguns deles anedóticos - e até emitia pareceres contraditórios.

Resultado dessa exaustiva investigação, acabaria mesmo por me ser levantado um processo-crime por insuficiências detetadas na “declaração de património e de rendimentos”, exigível para me candidatar.

Com espanto e repulsa, confirmei então que, para além das acusações serem totalmente desajustadas ou mesmo delirantes, e tendo até já sido inquiridos simpatizantes, o processo suscitava ainda outras matérias que nada tinham a ver com a candidatura como configuram uma devassa à minha vida privada.

Escrevi então que tendo 97% dos magistrados portugueses boas classificações, eu acreditava ter 97% de possibilidades de sair inocentado. Mantenho neste caso esse otimismo porque, entretanto, o Ministério Público até já encerrou uma dessas falsas “pistas”, abertas pelo Tribunal Constitucional.

Enquanto isto, e alegando dúvidas insanáveis sobre irregularidades processuais, acusação que a candidatura vai contestar, recebi há dias, tal como o meu mandatário financeiro, o anúncio de várias contra ordenações que poderão obrigar ao pagamento de coimas que, no limite, poderão exceder largamente o custo da campanha.

Neste novo caso, três razões me impedem de estar otimista:

- Porque quem aprecia a réplica é quem promove as acusações;

- Porque dessa decisão só cabe recurso para o Tribunal Constitucional, o mesmo que tutela essa entidade;

- Porque todos esses juízos estão beliscados por notório conflito de interesses.

E é assim que, naturalmente, três questões se levantam:

- Será esta uma boa prática num Estado de Direito?

- Será que as instâncias europeias não irão dar provimento ao recurso que, naturalmente, desencadearei?

- E quem vai pagar tudo isso?

Apesar da gravidade destas notícias que vou dando conta, e que as redes sociais têm amplificado, registo com alguma apreensão e mágoa que nem um só órgão de informação teve, até hoje, coragem para tocar neste assunto.

Perante o silêncio ensurdecedor a que assisto, será que a sociedade portuguesa não está ainda mais doente do que no tempo da ”outra senhora”, quando milhares de verdadeiros democratas e patriotas erguiam a sua voz e resistiam, heroicamente, aos Tribunais Plenários da ditadura?

Cândido Ferreira

 

 

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