A crise económica e social (possivelmente também financeira) que a pandemia do Covid-19 está a produzir leva muita gente a colocar a seguinte questão:
como financiar tudo o que é preciso para evitar a fome, a falência de milhares de empresas, o desemprego de massa e, num segundo momento, também investir para recuperar a economia e a sociedade, no quadro de uma estratégia de desenvolvimento verde?
O país não tem moeda própria, não tem um banco central para financiar directamente o Estado sem criar dívida. Contudo, é assim que as coisas estão a funcionar nos EUA, no RU, no Japão ... porque têm soberania monetária.
Dentro da união monetária que é o Euro, Portugal tem uma moeda que não controla, e tem de aceitar o que os países da ortodoxia financeira - com a Alemanha a liderar - entenderem o que é bom para a UE, quer dizer, o que é bom para eles.
O que quer que venham a decidir no próximo Conselho Europeu será pouco (a garantia do Orçamento da UE para obter empréstimos nos mercados é muito pequena) e implicará um aumento significativo da dívida pública dos Estados da periferia na hora de lhes entregar o dinheiro (algum fundo perdido também será atribuído, mas em pequena escala e condicionado).
O que vai fazer a UE quando, daqui a dois anos, a nossa dívida pública estiver bem acima do que já esteve no pico da anterior crise? Se, no caso de Portugal, subir aos 145% do PIB - ainda assim deixando muita gente passar fome -, como é que a UE vai enquadrar esta situação no Tratado Orçamental?
Vai manter o Tratado Orçamental suspenso por muitos anos, e vai tolerar uma política orçamental expansionista que faça reduzir a % da dívida através de um crescimento do PIB pela dinamização da procura interna (o contrário do que até agora obrigou a fazer)?
E quanto tempo vai durar a suspensão do Tratado? Quando retomar a aplicação das regras (limites de défice e dívida), voltaremos às cativações orçamentais para reduzir aceleradamente a dívida (vulgo 'austeridade fofinha', em vigor desde que Centeno passou a presidente do Eurogrupo) para tranquilizar os mercados financeiros, degradando o Estado social e a vida da maioria da população?
Continuará a aplicar uma teoria económica comprovadamente errada?
É o futuro das gerações mais jovens, é o futuro do nosso país, que se vai decidir nos próximos tempos. E as alternativas são estas:
(1) mudar alguma coisa na UE para que o essencial fique na mesma => austeridade 'fofinha' com grave sub-financiamento do Estado social (no nosso caso sem a ajuda das bolhas do turismo e do imobiliário que rebentaram com a pandemia), continuado empobrecimento do país, emigração dos que ainda têm condições para arriscar em países que ainda podem acolher;
(2) pôr em causa a união monetária elegendo um governo de libertação nacional - uma frente política ampla - que explore todas as margens de manobra possíveis para o desenvolvimento do país dentro do espartilho do euro, em nome do desenvolvimento de Portugal, e também em nome de uma Europa de paz e cooperação entre Estados soberanos.
Ou seja, adoptar uma estratégia de "mau aluno" enquanto esperamos que um país fundador da UE ponha em cima da mesa a dissolução organizada do euro. Um governo que prepare o país para o inevitável fim desta UE. Desejavelmente um divórcio amigável.