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João Lourenço e o Protocolo de Malabo

14-09-2018 - Rui Verde

Por estes dias, quando se avizinha a eleição de Lourenço como líder primeiro do MPLA (tornando-se todo-poderoso em Angola), depois de uma algo inconclusiva visita à China e de uma alargada e abrangente entrevista de Marcolino Moco ao Jornal de Angola, haveria certamente temas mais importantes do que um obscuro Protocolo assinado na capital da Guiné Equatorial.

No entanto, o Protocolo de Malabo pode bem ser a pedra-de-toque do empenho contra a corrupção e a impunidade propalado por João Lourenço nas suas variadas entrevistas e intervenções.

O Protocolo de Malabo é um acordo internacional, celebrado no âmbito da União Africana, que institui um tribunal criminal internacional africano, melhor dizendo, uma secção criminal no Tribunal Africano de Justiça e de Direitos Humanos e dos Povos, a instituir resultando da fusão do Tribunal Africano dos Direitos Humanos e dos Povos e do Tribunal Africano de Justiça.

Na prática, trata-se de criar para África aquilo que o Tribunal Criminal Internacional de Haia, sem sucesso, tem pretendido ser para o mundo: um tribunal supra-estadual que responsabilize os líderes políticos pelos seus crimes mais atrozes.

Além de instituir o tribunal criminal africano, o Protocolo tipifica os vários crimes que passa a punir. Mais precisamente, estabelece os 14 crimes que estarão debaixo da jurisdição do tribunal: genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra, crime de mudança inconstitucional de governo, pirataria, terrorismo, mercenarismo, corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de pessoas, tráfico de drogas, tráfico de resíduos perigosos, exploração ilícita de recursos naturais e crime de agressão.

O Protocolo foi assinado em 27 de Junho de 2014 e entraria em vigor 30 dias após a ratificação por parte de 15 países. O problema é que, tão tarde como Maio de 2018, apenas 11 países ratificaram o Protocolo: Benim, Chade, Comoros, Congo, Gana, Guiné-Bissau, Quénia, Mauritânia, Serra Leoa, São Tomé e Príncipe e Uganda.

Nem o Protocolo entrou em vigor (pelo que o tribunal não existe), nem Angola ratificou o Protocolo marcando a sua adesão.

Compreende-se que debaixo da presidência de José Eduardo dos Santos (JES) não houvesse vontade de submeter o país a este dispositivo legal africano.

No fim de contas, JES e os seus apaniguados terão cometido vários dos crimes aí previstos, pelo menos corrupção, lavagem de dinheiro e, provavelmente, exploração ilícita de recursos naturais. Embora o normativo do tratado preveja imunidade para o chefe de Estado e altos dirigentes do Estado, essa imunidade só existe durante o exercício dos mandatos e em actos ligados às suas funções. Assim sendo, se Angola tivesse aderido ao Protocolo, JES e associados poderiam agora estar a ser incriminados pelo Tribunal Africano.

O que não se percebe é que João Lourenço faça discursos contra a corrupção e imunidade – discursos que aliás são bastante convincentes, como demonstra a entrevista de Marcolino Moco acima referida – mas depois não tome as medidas legais consonantes com tais discursos.

A adesão a este instrumento legal internacional, puramente africano – portanto, não sujeito às críticas de neocolonialismo jurídico –, seria um passo importante no combate à corrupção e impunidade em Angola.

Ao ratificar o Protocolo de Malabo, João Lourenço daria um sinal claro a todos os dirigentes e a si próprio. Ninguém estaria dispensado de prestar contas no final do mandato. E, em caso de comportamentos criminais, todos estariam sujeitos a uma jurisdição africana superior.

É esta a relevância do Protocolo de Malabo: trata-se de um mecanismo africano que pretende submeter os dirigentes africanos a um juízo posterior sobre o seu comportamento no exercício de cargos públicos. Nesta fase da vida política de Angola, faria todo o sentido que João Lourenço promovesse a entrada de Angola e a tornasse campeã da instituição do Tribunal Criminal Africano.

Fonte: Maka Angola

 

 

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