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A PROPOSTA INCONSTITUCIONAL DO MPLA

23-06-2017 - Rui Verde

Depois de termos publicado o texto Dos Santos: Impunidade Vitalícia como Presidente Emérito houve quem muito gentilmente nos fizesse chegar o Projecto de Lei Orgânica sobre o Regime Jurídico dos Ex-Presidentes e Vice-Presidentes da República após a cessação de mandato, bem como o Relatório de Fundamentação do mesmo.

Da leitura conjunta de ambos os documentos resulta a confirmação de que o MPLA pensa que o seu presidente emérito goza de impunidade vitalícia.

Comecemos pelas duas vertentes que devem ser pesados na balança da impunidade:

i) A responsabilidade por actos ilícitos cometidos no exercício das funções presidenciais (por exemplo, corrupção).

ii) A responsabilidade por actos ilícitos estranhos ao exercício das funções presidenciais (por exemplo, não pagar bananas à zungueira).

Analisemos a segunda vertente.

No Projecto de Lei, a responsabilidade por actos ilícitos estranhos ao exercício de funções apenas é contemplada no artigo 2.º, que determinará que o presidente da República, findo o seu mandato, goza de foro próprio para efeitos criminais ou de responsabilidade civil, por actos estranhos ao exercício das suas funções perante o Tribunal Supremo, nos termos do disposto na lei. Na sua essência, este artigo transcreve o artigo 127.º, n.º 3 da Constituição de Angola, que dispõe que pelos crimes estranhos ao exercício das suas funções o presidente da República responde perante o Tribunal Supremo, cinco anos depois de terminado o seu mandato. Isto quer dizer que o foro próprio do presidente para assuntos estranhos às suas funções é estendido para além do fim do seu mandato. Um exemplo: se o presidente em exercício comprar bananas a uma zungueira e não lhas pagar, apenas poderá ser questionado cinco anos depois de deixar de ser presidente, e apenas no Tribunal Supremo. É o que diz a Constituição. Agora, com o artigo 2.º do Projecto de Lei, se o ex-presidente não pagar as bananas também só poderá ser demandado no Tribunal Supremo.

Regressemos agora à primeira vertente, a dos actos em exercício da função presidencial.

O Projecto de Lei é omisso no seu articulado sobre esta questão. Já o Relatório de Fundamentação é bem claro: o presidente da República goza das imunidades dos membros do Conselho da República, que por sua vez são aquelas que gozam os deputados à Assembleia Nacional e que consistem em “não respondem civil, criminal nem disciplinarmente pelos votos ou opiniões que emitam em reuniões, comissões ou grupos de trabalho da Assembleia Nacional, no exercício das suas funções”. Tal de facto deriva da leitura dos artigos 133.º, n.º1; 135.º,n.º 3 e 150.º da Constituição.

Mas daí não resulta, como parece sugerir o Relatório, que o presidente tenha imunidade pelos actos praticados no exercício das suas funções, sendo por isso apenas necessário regular em lei o que aconteceria por actos estranhos ao exercício das suas funções.

De facto, o artigo 127.º n.º 1 da CRA prescreve que o presidente da República não seja criminalmente responsabilizado pelos actos praticados no exercício das suas funções, salvo em caso de suborno, traição à pátria e prática de crimes definidos pela presente Constituição como imprescritíveis e insusceptíveis de amnistia. Mas logo o n.º 2 do mesmo artigo esclarece que a condenação implica a destituição do cargo e a impossibilidade de candidatura a outro mandato.

Daqui se vê que esta imunidade termina no momento em que termina o mandato presidencial.

A partir do primeiro dia após o fim da Presidência, de acordo com a Constituição, o PR é responsável por todos os actos ilegais cometidos durante a Presidência.

Nestes termos, o Relatório da Fundamentação do Projecto de Lei peca por deduzir aparentemente uma imunidade que não existe. A única imunidade que a Constituição confere a ex-presidentes é a de não responderem pelos votos ou opiniões que emitam no exercício das suas funções enquanto membros do Conselho da República ou enquanto ex-presidentes. Nada mais.

Face ao exposto, apesar das notícias de jornal não serem precisas quanto aos termos em que o Projecto de Lei está escrito, percebe-se que a base interpretativa do MPLA é que tanto o presidente como o ex-presidente gozam de imunidade vitalícia. E isso vai contra a Constituição.

Fonte: Maka Angola

 

 

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