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PANDEMIA ECONÓMICA: PROPOSTAS DE SOLUÇÃO

03-04-2020 - Maka Angola

As principais bases em que assenta a economia nacional estão sob tensão. Aliás, podemos mesmo afirmar que, depois de superada a pandemia da covid-19, os modelos económicos da grande maioria dos países dificilmente se manterão iguais.

Por agora, é necessário tomar medidas – algumas necessariamente difíceis ou pouco ortodoxas – para responder quer às emergências médicas, quer às emergências económicas. Medidas, em suma, para proteger a vida da população.

Os problemas da economia

Entretanto, a pandemia corrói a economia angolana a um ritmo veloz – trata-se de uma frente de batalha que tem de ser encarada desde já.

O primeiro problema é a quebra dos preços do crude, que veio para ficar por um período longo. É conhecida a origem da quebra dos preços: por um lado, a paralisação das economias, resultante pandemia, levou uma quebra abrupta na procura de petróleo. As contas ainda não estão feitas (até porque a maioria dos países consumidores declarou estado de emergência há poucas semanas), mas já em inícios de Fevereiro de 2020 a China estava a consumir menos 25% de petróleo. Nas próximas semanas, teremos novas projecções internacionais, mas prevê-se que haverá uma quebra global da procura entre 5,5 e 7 milhões de barris/dia nos próximos meses.

Por outro lado, os Estados Unidos têm conseguido travar o crescimento produtivo da Rússia e do Irão através da aplicação de sanções; isto permitiu-lhes conquistar quota de mercado, actualmente com cerca de 12 milhões de barris/dia. Neste contexto disruptivo de quebra de procura, a Rússia e a Arábia Saudita iniciaram uma guerra de preços, aumentando a produção, trazendo os preços de cerca de 60 dólares para menos de 25 dólares por barril. Esta estratégia envolve a tentativa de destruir parte da indústria de “shale gas” dos EUA, procurando reequilibrar a força das três maiores economias produtoras de petróleo. Os EUA, a Arábia Saudita e a Rússia terão condições de alimentar uma guerra de preços por um longo período. Como se costuma dizer popularmente: “Numa luta entre elefantes, quem sofre é o capim.” Aos países como Angola não resta senão assistir a esta guerra. Mesmo que haja alguma trégua nas próximas semanas (os EUA estão a pressionar a Arábia Saudita nesse sentido), devido à abrupta quebra da procura, o preço do barril não deverá subir muito acima dos 30 dólares nos próximos meses.

No Orçamento Geral do Estado (OGE), previa-se um preço de 55 dólares o barril. Num contexto de estabilização de preços nos 30 dólares/barril, corremos o risco acrescido de os blocos em Angola baixarem significativamente a produção ou paralisarem por alguns meses.

Consequentemente, as receitas petrolíferas de Angola cairão abruptamente em 2020, criando dois efeitos.Por um lado, o Estado terá uma descida acentuada das receitas fiscais provenientes do sector. Por outro, as reservas internacionais líquidas ficarão ainda mais ameaçadas, porque o país exportará um valor muito menor.

Adicionalmente ao problema do crude, a pandemia da covid-19 provocará uma contracção da economia não petrolífera. Primeiro, a quebra das receitas do crude terá um impacto muito negativo nos sectores conexos e nos serviços. Segundo, a instauração do estado de emergência (caminho necessário para controlar a velocidade da pandemia) vai obrigar ao distanciamento social e à paralisação de diversas actividades, como a restauração, as agências de viagens, o turismo, o comércio de bens não essenciais, os centros comerciais, a hotelaria, o turismo, o imobiliário, a construção civil, a venda de equipamentos, etc.  

A soma destes factores originará uma quebra do rendimento disponível em Angola de, previsivelmente, mais de 40 por cento em 2020. As incertezas são muitas, pelo que só podemos conceber hipóteses sem cálculos detalhados.

As soluções propostas

Tratemos, então, do problema económico pelo factor de maior emergência: corremos um risco elevado de não haver dinheiro no país para honrar os seus compromissos.Angola precisa de ganhar tempo e encontrar liquidez para cumprir com a despesa básica. E todos os agentes económicos terão de fazer deste tempo um momento de excepção, sacrificando-se para ultrapassar a maior tormenta económica que o mundo vive desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

O Estado dificilmente conseguirá respeitar os pagamentos da dívida pública de 2020. O OGE de 2020 previa usar cerca de 55% das receitas para esse efeito. Até ao final do corrente ano, estão previstas amortizações e pagamentos de juros que superam os 20 mil milhões de dólares (de dívida interna e externa). Assim, com a quebra abrupta das receitas, o Estado terá que colocar um travão no pagamento do serviço da dívida em 2020 e será obrigado a obter o máximo de liquidez possível.

Adicionalmente, tendo em conta a actual turbulência dos mercados de todo o mundo, é muito provável que não haja condições para ir aos mercados financeiros internacionais captar mais empréstimos, pelo menos não a preços minimamente comportáveis.

Face ao contexto de escassez de receitas e de quebra económica abrupta, é urgente criar soluções para permitir ao Estado e às empresas obterem a liquidez necessária para sobreviverem esta fase. A única forma de o fazer no curto prazo é mudar a política monetária seguida pelo Banco Nacional de Angola (BNA), de modo a gerar liquidez ao mercado interno.

O controlo da inflação terá de deixar de ser o objectivo principal do BNA durante os próximos 24 meses. Se o BNA mantiver a mesma política de metas de controlo de inflação, mantendo um apertado controlo sobre a liquidez, então é altamente provável que a economia angolana colapse, fruto do incumprimento generalizado por parte do Estado e das empresas; se esse momento ocorrer, entraremos num longo inverno económico, onde a inflação será o menor dos problemas.

Propomos que seja criado um programa intensivo para trazer liquidez à economia, com base em duas grandes iniciativas:

  • Reduzir significativamente as reservas obrigatórias dos bancos, de modo que estes voltem a ter liquidez para financiar a tesouraria das empresas e comprem mais dívida pública para entregar dinheiro vivo ao Estado.
  • Lançar um programa de “Quantitative Easing”, em linha com as acções do Banco Central Europeu (BCE) e da Reserva Federal dos Estados Unidos da América. Esse programa deve permitir que o Estado emita dívida publica, a ser comprada pelo BNA. Assim, o Estado recebe dinheiro para pagar aos funcionários públicos e aos fornecedores, de forma a manter a economia minimamente a funcionar. Para que isso aconteça, será necessário rever a lei do endividamento público, a fim de permitir que (excepcionalmente) o BNA mantenha dívida pública no seu balanço, por um período longo.
  • Não se recomenda que o Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) adquira mais dívida pública. Numa situação de  stress  da dívida nacional, isso aumentaria o risco dos valores que estão sob gestão do INSS, que servirão para cumprir com as responsabilidades do Estado social. Em vez disso, é preferível que o BNA – ou os Bancos, caso se altere a política monetária – assuma o lugar do INSS, comprando mais dívida do Estado.

É essencial e urgente que o BNA e o FMI assumam que Angola atravessa um “período de guerra” e que a quebra abrupta do rendimento disponível do Estado e dos privados terá de ser minimamente compensada pela criação de moeda. Isso permitirá manter a economia a funcionar, mas não irá disparar a inflação, uma vez que a quebra da procura será tão acentuada que os efeitos se irão compensar, pelo menos parcialmente.

Como base comparativa, note-se que os EUA lançaram um plano de emissão de dívida de dois biliões de dólares (10% do PIB); a maioria desta dívida será comprada pelo Banco Central dos EUA (que aliás já tem no seu balanço mais de 4,5 biliões de dólares de dívida dos EUA). O BCE recomeçou a comprar dívida pública dos países comunitários. A própria Alemanha aprovou há dias um pacote de mais de 700 mil milhões de euros de apoio à economia (mais de 20% do PIB) e contará com o BCE para este lhe comprar a dívida que vai emitir.

Afigura-se prudente que o Governo angolano se sente com o FMI para em conjunto criar um novo quadro de gestão da dívida pública, o qual mantenha os níveis de confiança dos mercados internacionais que foram conquistados no novo ciclo anterior à covid-19. Medidas desgarradas, não articuladas com o FMI, como o recurso às reservas internacionais líquidas e ao Fundo Soberano, só nos fragilizarão e comprometerão o futuro. As medidas de controlo de despesa com a dívida pública poderão permitir ao Estado (e à economia nacional) sobreviver a este primeiro período da tormenta.

Simultaneamente, desejavelmente o Estado não deverá deixar de pagar aos funcionários públicos, mas serão inoportunos quaisquer aumentos em 2020. Para que a economia sobreviva, o Estado deverá também pagar os “atrasados” às empresas que operam no mercado nacional. Não é aconselhável suspender qualquer imposto, e recomenda-se que seja analisada a futura criação de um imposto extraordinário da covid-19 (por 12 a 24 meses), aplicável às principais empresas do país (petrolíferas, bancos, telecomunicações, indústria, etc.); tratar-se-á de um contributo das principais empresas para que a economia não colapse, à semelhança do que foi feito em Portugal nos anos da  troika .  

De forma a defender as reservas internacionais líquidas (que deverão descer significativamente nos próximos 12 meses, devido à quebra das exportações), sugere-se que haja um plano de importação ainda mais restrito, centrado nos produtos de cesta básica e bens de primeira necessidade, tais como medicamentos, bens de produção para a indústria, e que se suspenda a importação de todos os bens não prioritários. É ainda aconselhável a suspensão de todos os projectos de investimento que não sejam estratégicos nem prioritários.

Terá de ser dada uma atenção especial às famílias de renda baixa, que sofrerão o maior impacto nesta fase. Alguns exemplos para reflexão:

  • As empresas de telecomunicações móveis poderiam reduzir em 50%, por 12 meses, os custos das recargas; o mesmo deveria ser aplicado aos custos das emissões de TV por cabo.
  • À semelhança do que foi feito em outros países, durante este período, as comissões bancárias deveriam ser reduzidas ou anuladas para as famílias de baixo rendimento.
  • Igualmente, a cobrança das contas da água e da electricidade, nas famílias de baixa renda, deveria ser adiada.
  • Os alimentos da cesta básica devem ser subsidiados.

Apelamos portanto ao Governo para que tome medidas urgentes e de curto prazo, essenciais para ganharmos tempo e evitarmos uma derrocada da economia nacional.

Fonte: Maka Angola

 

 

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