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O JARDINEIRO PARTICULAR

22-11-2013 - João Chamiço

O meio-dia de um certo mês de Agosto aproximava-se, hora a que o sol se encontra quase na vertical. O jardineiro ansiava pela hora do almoço, mas não resistiu a fazer uma pequena pausa no seu labor para se refrescar um pouco e secar o suor que abundantemente lhe inundava os olhos. Refugiou-se uns instantes à sombra de uma das árvores do jardim de cuja manutenção estava encarregue.

O patrão chegou subitamente surpreendendo o “nosso” jardineiro naquela pequena pausa.

– Então monsieur? Não está a trabalhar? Olhe que, a continuar assim não poderei pagar-lhe grande coisa.

- Peço desculpa monsieur Schmith, estava apenas a descansar um pouco e a enxugar o suor que já me ardia nos olhos.

- Pois sim, mas eu pago-lhe para estar a trabalhar e não para descansar durante o seu horário de trabalho.

Mesmo que estejamos a falar do Luxemburgo, também ali o sol de Agosto é fustigante, apesar da temperatura raramente ultrapassar os 28º e assim era em 1975 quando esta história aconteceu.

- Olhe monsieur Schmith, eu quero aproveitar o facto de estarmos agora a conversar porque tenho algo a comunicar-lhe: um assunto sobre o qual precisamos falar. Era para lhe ser ao fim do dia, mas assim, aproveito para lhe comunicar que não poderei continuar a fazer a manutenção do seu jardim.

- Oh homem, não precisa ficar assim apenas porque há pouco lhe fiz aquele reparo.

- Não Senhor, não se trata disso, o sr. está no seu pleno direito de me chamar à razão, já que me paga para lhe prestar um serviço é meu dever executá-lo. A questão mesmo é outra: é que, eu consegui um lugar como professor de português.

- Ai sim? Mas: mas então o sr. Não é jardineiro?

- Na verdade não sou sr. Schmith. Eu sou professor, para além do facto de também ser Sacerdote. Padre, entende?

O sr. Schmit emudeceu, perplexo e envergonhado por ter sido duro para com o seu jardineiro prior.

- Mas então, porque é que nunca me disse nada disso?

- Ora! Será que o sr. contratava um padre para cuidar do seu jardim? Peço desculpa se o enganei, mas a verdade é que este lugar de jardineiro me permitiu a sobrevivência no Luxemburgo até agora.

- Não sr. eu é que lhe peço esculpa a si sr. Padre, se alguma vez fui menos correcto para com a sua pessoa.

- Ora essa, o sr. e a sua esposa trataram-me muito bem, e o alojamento que me facultaram foi-me de grande utilidade. Sem este emprego e sem o quarto que me cederam, teria muito provavelmente regressado aos Açores contra a minha vontade.

Esta é mais uma das muitas histórias verídicas, umas narradas e outras adormecidas na memória colectiva, que tiveram lugar no seio da nossa comunidade emigrante dos anos 60/70.

A pessoa em causa que aqui é referida e que tratamos apenas por sr. Januário, por razões óbvias, é actualmente um professor aposentado do nosso ensino oficial, tendo exercido a sua actividade ao serviço do ensino da língua portuguesa aos filhos dos nossos emigrantes no Luxemburgo.

Veio a casar com uma colega de ofício, professora, em cuja companhia divide actualmente o seu tempo entre Portugal e o país que o acolheu, primeiro como jardineiro, e depois como professor.

As duas filhas de ambos, são actualmente duas senhoras já licenciadas. Será sem dúvida um belo epílogo para esta história repleta de acasos mais atribulados uns que outros, desde que este então jovem padre, sobrinho de outro padre açoriano, resolveu virar costas à sua terra algures no magnifico arquipélago dos Açores onde os valores tradicionais eram ainda muito arreigados e por ventura muito limitadores dos horizontes que este homem pressentia para lá das ilhas de bruma.

João Chamiço

 

 

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