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Greves na saúde: já há cirurgias oncológicas a serem adiadas por dois meses

12-10-2018 - Pedro Vilela Marques

Médicos responsáveis pela remarcação de operações que têm sido canceladas em dias de greve falam de situação "muito preocupante" no combate às listas de espera.

Os hospitais estão a ter dificuldades em responder às cirurgias adiadas pelas sucessivas greves no setor da Saúde. Numa altura em que os enfermeiros voltaram aos protestos, médicos responsáveis pela remarcação de operações que têm sido canceladas nos últimos tempos falam de uma situação "muito preocupante" que vai fazer derrapar mais os tempos de espera. Atrasos que podem ser de meses e a que nem doentes mais urgentes, com cancros, escapam.

Protestos como o que os enfermeiros estão a realizar nesta semana deixam os blocos operatórios a meio gás, quando não obrigam mesmo ao seu encerramento. As estimativas apontam para cerca de três mil cirurgias adiadas por cada dia de greve, o que numa paralisação de seis dias equivale a falar em 18 mil operações canceladas. Mas além dos transtornos imediatos - e sem discutir o direito e as razões que levaram à greve -, quando podem estes doentes ter nova resposta para os seus problemas?

"Tenho 12 doentes com cancro que tiveram cirurgias adiadas por causa da greve dos enfermeiros de setembro e três delas voltam a ter operações canceladas por causa destas greves de outubro. Portanto, vão ter de esperar pelo menos dois meses"

"Admito que cirurgias não urgentes possam já não ser feitas neste ano, mas, em 2019, porque é preciso responder primeiro aos casos mais urgentes", admite uma especialista em senologia (doenças da mama) de um grande hospital da Região de Lisboa e Vale do Tejo. "No meu caso, o planeamento é feito mês a mês, tenho 12 doentes com cancro que tiveram cirurgias adiadas por causa da greve dos enfermeiros de setembro e três delas voltam a ter operações canceladas por causa destas greves de outubro. Portanto, vão ter de esperar pelo menos dois meses." Esperas que furam os tempos máximos de resposta garantidos nesta área, que preveem que os doentes oncológicos muito prioritários têm de ter resposta em 15 dias, os prioritários em 45 dias e mesmo os casos normais têm de ser operados até 60 dias.

Maria ainda não é um desses casos, mas pode vir a ser a curto prazo. Depois de uma espera que se arrasta desde julho, esta doente da região de Lisboa tem uma cirurgia de ambulatório à mama marcada no mesmo hospital para dia 26 de outubro, dia de greve da função pública, e já foi avisada pela médica que pode fazer a viagem em vão. "É complicado, desde logo porque quero ver a minha situação [retirar um tumor benigno] resolvida, mas também porque vou ter de fazer uma viagem, apresentar-me logo às oito da manhã em jejum, provavelmente para nada."

Mais a norte, preocupações semelhantes. O responsável pelo agendamento de cirurgias de um grande hospital da região centro adianta que só no primeiro dia de greve dos enfermeiros - que incidiu precisamente sobre os blocos operatórios -, mais de 50 doentes viram as suas cirurgias canceladas. "E o que causa maior preocupação é que os doentes com cancro também são afetados", realça outro médico ao DN. "Porque um doente não urgente pode ser operado depois, mas os casos urgentes têm de ter resposta rápida. Os serviços mínimos deviam acautelar estas cirurgias da área oncológica", defende.

Como o DN noticiou recentemente, este ano está a bater os recordes dos últimos cinco anos em termos de dias de trabalho perdidos no setor da Saúde na sequência de greves, com 84 mil dias perdidos até julho, mais 37 mil do que no período homólogo. O presidente da Associação Portuguesa de Cirurgia de Ambulatório, Carlos Magalhães, reconhece que perante "o número de greves que tem existido, necessariamente a produção tem sido afetada e a espera aumentou".

No Centro Hospitalar e Universitário de Lisboa Central, cerca de um terço das cirurgias programadas para os dias de greve em 2018 não se realizaram

O DN questionou também oito dos maiores hospitais de norte a sul do país sobre o impacto das sucessivas greves nas listas de espera. A informação mais detalhada veio do Centro Hospitalar e Universitário de Lisboa Central, que adianta que cerca de um terço (32%) das cirurgias programadas para os dias de greve em 2018 não se realizaram. "Todas as cirurgias não realizadas foram e estão a ser novamente agendadas, procurando-se garantir uma resposta assistencial adequada à situação clínica de cada um e o cumprimento dos tempos máximos de resposta garantidos para a prioridade clínica."

O Centro Hospitalar de Lisboa Norte respondeu apenas que fornece todos os dados sobre greves à Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e ao Ministério da Saúde. A ARS de Lisboa remeteu qualquer esclarecimento sobre o assunto para a Administração Central do Sistema de Saúde, que, por sua vez, informou que esta é uma matéria que é coordenada pelo Ministério da Saúde. Já o gabinete de Adalberto Campos Fernandes respondeu que ainda "não é possível avançar esses dados", e que "a reprogramação ainda está em curso".

Mais doentes enviados para o privado

Uma das perguntas que fica no ar é se estes atrasos vão redundar na emissão de mais cheques-cirurgia e no envio de mais doentes para serem operados no setor privado. A resposta vem de um especialista do Hospital de São José, que considera isso inevitável, "já que a emissão dos vales é automática a partir do momento em que se atinge determinado tempo de espera". Mas o médico recorda que os blocos operatórios já estão "muito desaproveitados", dando o exemplo do seu próprio hospital: "São José, por exemplo, perdeu metade dos tempos operatórios em cirurgia plástica. E esse desaproveitamento dos blocos, que é geral, deve-se essencialmente à falta de enfermeiros e de anestesistas."

O presidente da secção sul da Ordem dos Enfermeiros sublinha os mesmos argumentos, lembrando que as dificuldades nos blocos resultam de "fenómenos multissetoriais, não se devem só às questões das greves". "Os enfermeiros sentem que não são respeitados por este governo, estão por tudo. Há tomadas de posição que têm evoluído por falta de resposta do ministério em relação à carreira", afirma Sérgio Branco. Mas ainda esta quarta-feira o ministro da Saúde afirmou que o governo tem "uma vontade enorme" de chegar a um entendimento com os enfermeiros sobre o modelo de carreira e valorização profissional, considerando que essa reivindicação "é justa".

O ministro da Saúde afirmou que o Governo tem "uma vontade enorme" de chegar a um entendimento com os enfermeiros sobre o modelo de carreira

"O que é a vontade de os enfermeiros terem uma arquitetura de carreira diferente que os valorize e prestigie é reconhecido como justíssimo por parte do governo. Se há grupo profissional na saúde que precise recriar um modelo de desenvolvimento profissional são os enfermeiros", afirmou Adalberto Campos à margem de uma conferência do projeto 3 F - Financiamento, Fórmula para o Futuro.

O ministro indicou que "da parte do governo há uma vontade enorme de chegar a um entendimento sobre o modelo de carreira". Já as questões remuneratórias são "sempre mais difíceis", assumiu, porque dependem das reivindicações dos profissionais e "da capacidade que o Estado tem de resolver esses pedidos em sede orçamental".

Greves e manifestação na próxima semana

O primeiro dia de greve dos enfermeiros obrigou a adiar centenas de cirurgias um pouco por todo o país, segundo um balanço feito pelo Sindicato dos Enfermeiros Portugueses ao final da amanhã desta quarta-feira. Segundo o SEP, Abrantes, Chaves, Bragança, Tondela, Viseu, Lamego, Famalicão e Figueira da Foz são alguns dos hospitais onde a adesão à greve atingiu os 100%.

Os enfermeiros realizaram o primeiro de seis dias de greve para exigir ao governo que apresente uma nova proposta negocial da carreira de enfermagem que vá ao encontro das expectativas dos profissionais e dos compromissos assumidos pela tutela. O primeiro dia de paralisação realizou-se exclusivamente nos hospitais (blocos operatórios e cirurgia de ambulatório) e na quinta-feira afeta todas as instituições de saúde do setor público que tenham enfermeiros ao serviço, segundo o pré-aviso de greve. A paralisação nacional repete-se nos dias 16, 17, 18 e 19 de outubro, dia em que está marcada uma manifestação em frente ao Ministério da Saúde, em Lisboa, para exigir do governo o cumprimento dos compromissos que assumiu mo processo negocial de 2017. Apenas todas as cirurgias de urgência estão asseguradas pelos serviços mínimos.

Fonte: DN.pt

 

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