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A precariedade que financia a Uber

06-01-2017 - Esquerda.net

O não reconhecimento do vínculo laboral é um elemento central na economia da precariedade, seja em Londres ou em Portugal.

A 28 de outubro passado, um tribunal londrino concluiu que os condutores da Uber a operar em Londres não poderiam ser considerados trabalhadores independentes e, por isso, não só a Uber teria de os reconhecer como trabalhadores da empresa como seria obrigada a pagar acima do salário mínimo, incluindo descontos e subsídios de férias.

O não reconhecimento do vínculo laboral é um elemento central na economia da precariedade, seja em Londres ou em Portugal. O Observador publicou uma reportagem onde a jornalista Sara Coelho entrevistou vários motoristas da Uber, novos e velhos, mulheres e homens, que em comum têm uma coisa: trabalham a recibo-verde com longas horas de trabalho e salários abaixo do Salário Mínimo Nacional. Todos os motoristas recorreram a nomes fictícios "por medo que as declarações pudessem afetar a parceria com a Uber", esclarece a jornalista em nota de rodapé.

No seu primeiro mês de trabalho completo, "Cândida conseguiu apenas 440 euros. Foram seis dias de trabalho por semana, 12 horas por dia. Treze horas em vésperas de feriado". Ou seja, conclui a jornalista, "Fazendo a conta aos 26 dias que trabalhou, por cada uma das 312 horas recebeu 1,41 euros à hora. Brutos, porque grande parte dos motoristas são contratados em regime de recibos verdes e, daquele valor, ainda é preciso subtrair os impostos a pagar. Não há subsídio de férias, de Natal nem de almoço. Não há dias de férias pagos, nem proteção em caso de doença. Por cada viagem feita em Portugal, a Uber ganha 25%. Cândida ganha 35% do total das viagens, mais 5% se for assídua, ficando a empresa que a contratou com o restante."

Por cima disto, Cândida "é avaliada por tudo o que faz: quilómetros percorridos, acelerações, travagens. Tudo medido pela tecnologia".

De facto, a performance de um motorista da Uber é constantemente submetida a uma fórmula que determina um ranking interno de motoristas que não é do conhecimento dos próprios. Quem for melhor classificado ganha precedência na recolha de clientes.

O aumento da oferta e colapso das tarifas (logo, descida dos salários) é uma das consequências recorrentes da entrada da Uber em novos mercados. E uma consequência desejada. Seja em São Francisco, Nova Iorque ou Londres , a destruição de serviços de táxi estabelecidos através de tarifas baixas antecede sempre o "price gouging", nome que a Uber dá à subida exponencial de tarifas que, no entanto, nunca se traduzem numa melhoria das condições salariais. Pelo contrário, a multiplicação de empresas parceiras da Uber é incentivada pela empresa num sistema de comissões piramidal onde o motorista sai sempre a perder.

A jornalista cita o exemplo de um dono de três carros que afirma que "No geral as pessoas estão a queixar-se porque a oferta está a crescer demasiado, há muitos carros na rua". Bernardo não só é dono de um carro e patrão de três motoristas, como também conduz o carro aos fins de semana, escreve a jornalista, concluindo que "Como recebe a comissão dos três profissionais, a parceria com a Uber está a compensar-lhe. Aos motoristas, nem tanto."

De forma reveladora, Bernardo pede regulação e considera a tarifa do táxi "justa e que, acredita, ambos os concorrentes [táxis e Uber] se deviam reger pela mesma bitola, não só nas obrigações, mas também nas tarifas". Por seu lado, Vasco revela que "já tentei falar várias vezes com a Uber mas dizem-me que esta é a sua política [não estabelecer um número máximo de parceiros]. Que, neste momento, não têm ainda carros suficientes para a procura que têm". E declara-se iludido: "porque é muito fácil uma pessoa entrar neste negócio a achar que é rentável. As seguradoras, os rent-a-car e os leasing passam-nos a informação de que é muito lucrativo, todos os parceiros me diziam que era um mercado tão lucrativo que eu não fazia ideia do que ia faturar". E conclui, "não querem saber, não há nenhuma proteção ao operador".

Se os protestos mais comuns até hoje partiram de taxistas, cada vez mais motoristas e empresários da Uber criam plataformas de contestação exigindo "melhores condições salariais", acusando a Uber de promover uma "escravidão moderna", escreve a jornalista. Em Espanha, o sindicalista Sayah Baaroun resumiu: "70 horas de trabalho por semana [o limite legal em França é de 35 horas] por mil euros por mês [o salário mínimo é de 1.466 euros]".

Em Portugal, segundo o Observador, ainda não existe nenhuma entidade organizada de protesto, "embora um grupo de pessoas esteja a trabalhar na constituição da Associação Nacional de Parceiros das Plataformas Alternativas de Transportes".

 

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