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Ventura e Chega condenados por "segregação social"

17-09-2021 - Fernanda Câncio

Mesmo depois de condenado em primeira instância, Ventura jurou que nunca pediria desculpa aos sete membros da família Coxi a quem apelidou de "bandidos", tendo até reiterado a calúnia várias vezes. Agora o Tribunal da Relação deu razão aos Coxi: o líder do Chega e o partido vão ter mesmo de se retratar.

Os réus usaram a fotografia como arma de segregação social."

Esta é uma das conclusões do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que confirma a condenação de André Ventura e do partido Chega na  ação cível que lhes foi movida por sete membros de uma família residente no bairro da Jamaica, os Coxi, cuja foto com o presidente da República o líder partidário exibiu no debate televisivo das presidenciais com Marcelo, em janeiro, apelidando-os de "bandidos" e "bandidagem" e opondo-os aos "portugueses de bem" que dizia querer representar.

Confirmando  a sentença recorrida  (da juíza Francisca Preto, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa), o tribunal superior parece no entanto ir mais longe, ao reconhecer "a vertente discriminatória em função da cor da pele e da situação socioeconómica dos autores" (os Coxi) existente nas ofensas.

Isto porque a sentença de primeira instância, concluindo que "chamar aos Autores bandidos e referir-se a eles como bandidagem" é a "emissão de um juízo de valor que as diminui e marginaliza", não valorizava "o cariz discriminatório das declarações" de Ventura, considerando não se tratar do "aspeto mais relevante do processo".

Argumentava Francisca Preto: "Nem resulta dos autos [do processo] que tal discriminação seja necessariamente determinada pela cor da pele ou pela condição socioeconómica dos visados, embora esses elementos ressaltem de imediato aos olhos dos recetores da mensagem. O que é essencial é o caráter ilícito das declarações com referência à fotografia que foi exibida e a ofensa aos direitos de personalidade".

Esta decisão da juíza de primeira instância deixava por explicar a razão pelo qual Ventura e o Chega, (que também usou a foto dos Coxi na sua conta de Twitter a 22 de janeiro, antevéspera das eleições, como contraponto a uma fotografia de Ventura, este frente à Assembleia da República, com três homens brancos, um dos quais com uma tshirt do Movimento Zero, e a legenda "Eu prefiro os portugueses de bem"), tinham escolhido a imagem desta família, desconhecida da maioria dos portugueses - e que não foi nunca identificada, por nome ou qualquer outra forma qualquer, nem no debate televisivo nem na publicação do partido na rede social - para contrastar com a ideia dos "portugueses de bem".

Na  petição inicial em que instaurava a ação , a advogada dos Coxi, Leonor Caldeira, frisava o que considera ser o motivo: "[Os Coxi] foram instrumentalizados para efeitos de narrativa de campanha, em função da cor da sua pele e da sua posição socioeconómica, para efeitos da narrativa de uma campanha política, procurando animar sentimentos discriminatórios de uma parte do eleitorado. (...) As ofensas cometidas pelos Réus foram motivadas por uma intenção de humilhar e diminuir pessoas negras e residentes em bairros sociais degradados - isto é, por ódio racial e de posição socioeconómica - para ganhar popularidade eleitoral." E prosseguia: "Enquanto instrumento de campanha eleitoral, esta imagem não conhece antecedente na história da democracia portuguesa - nunca um político se serviu da imagem de cidadãos anónimos e particularmente desfavorecidos para ilustrar o grupo de pessoas que não merecem ser representadas por si, caso seja eleito."

Agora, a Relação, pela pena dos juízes desembargadores Luís Filipe Sousa, José Capacete e Carlos Oliveira, afirma: "A questão atinente ao alegado cariz discriminatório das ofensas imputadas aos réus, em função da cor da pele e da situação socioeconómica dos autores, foi expressamente analisada pelo tribunal a quo [o inferior] tendo o mesmo entendido que não era essencial/necessária a inclusão de tal questão/qualificativo no dispositivo. Aceita-se a opção assumida pelo tribunal a quo na medida em que as imputadas, e reconhecidas, ofensas à honra e ao direito de imagem dos autores, por um lado, absorvem a vertente discriminatória em função da cor da pele e da situação socioeconómica dos autores e, por outro, tal autonomização não é essencial para efeitos de subsunção jurídica (...)." Assim, os desembargadores consideram que as ofensas incluem uma "vertente discriminatória em função da cor da pele", mais conhecida como racismo, assim como discriminação pela situação socioeconómica.

Ao DN, Leonor Caldeira congratula-se com esta formulação "mais explícita" da Relação face à sentença de maio" e com conclusão de que a fotografia "foi usada como arma de segregação social".

"O Tribunal da Relação decidiu no sentido que esperávamos e em tempo útil, uma vez que o recurso era urgente", diz a advogada. "Vamos aguardar pelo trânsito em julgado para executar o cumprimento integral da decisão."

Ventura e o Chega têm agora, como decidido em maio na primeira instância, 30 dias após o trânsito em julgado para se retratarem das ofensas nos locais onde as concretizaram - SIC, SIC Notícias, TVI e conta do partido no Twitter -, devendo também reproduzir a sentença publicamente, a suas expensas, em todos os locais onde as ofensas foram proferidas. Por cada dia em que o não fizerem, pagarão 500 euros.

A sentença da juíza Francisca Preto, agora confirmada pela Relação, obriga também os réus a "abster-se de proferir ou divulgar, no futuro, declarações ou publicações, escritas ou orais, ofensivas ao bom nome" dos membros da família, sob pena de pagarem 5000 euros por cada nova ofensa. Mas Ventura não só  declarou repetidamente , mesmo após a condenação, que nunca se retrataria das ofensas como as reiterou várias vezes - incluindo na TV, ao reagir à sentença -, o que deverá obrigá-lo agora a pagar o valor referido por cada uma. Metade será para os ofendidos.

As declarações que valeram esta condenação a André Ventura e ao Chega estão também a ser analisadas pelo Ministério Público, que, como o DN noticiou em junho, abriu um inquérito criminal depois de a Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação lhe remeter várias queixas sobre as mesmas.

Fonte: DN.pt

 

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